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Amazônia pode abrir caminho para o fim do celibato de padres

5 out 2019 - 11h36
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Reunião no Vaticano ensaia possibilidade de abertura da Igreja Católica. A partir de domingo, bispos debaterão ordenação de homens casados em comunidades remotas, em meio à escassez de sacerdotes na região amazônica.No Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica, o papa Francisco enfrenta simultaneamente dois poderosos opositores: seus críticos dentro da própria Igreja e o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro. Bispos dos nove países que ocupam a Amazônia participam da reunião no Vaticano, sob o lema "Amazônia - Novos caminhos para a Igreja e uma ecologia integral", entre 6 e 27 de outubro.

Além do papa Francisco, participam do sínodo bispos dos nove países que compõem a Amazônia
Além do papa Francisco, participam do sínodo bispos dos nove países que compõem a Amazônia
Foto: DW / Deutsche Welle

"O governo brasileiro está incomodado porque já leu os documentos preparatórios e sabe que nós vamos encarar a destruição da Amazônia. E o governo brasileiro não admite que a Igreja Católica faça uma ingerência", disse Edilberto Sena, padre há 40 anos em Santarém e ex-diretor da associação de rádio católica Rede de Notícias da Amazônia (RNA).

O governo brasileiro não esconde seu descontentamento com o evento deste ano, tendo perguntado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se seria possível adiar ou cancelá-lo por completo. A "ecologia integral" mencionada no lema da reunião é vista em Brasília como uma declaração de guerra ao agronegócio.

Mas são os "novos caminhos" a serem debatidos no sínodo que prometem assombrar o pontífice, em meio a uma possibilidade de abertura da Igreja Católica.

Isso porque, embora as causas e consequências dos incêndios florestais sejam drasticamente perceptíveis, em primeiro plano no encontro sobre a Amazônia deverá estar o tema da escassez de sacerdotes católicos na região, que poderá ser combatida com o relaxamento do celibato.

Estatisticamente, há ali um padre por 17 mil católicos batizados. Em comunidades remotas, as mulheres - a esmagadora maioria das voluntárias - organizam serviços eclesiásticos e catequese. Elas também distribuem a comunhão, com hóstias consagradas por sacerdotes ou bispos que aparecem nas comunidades apenas uma ou duas vezes por ano.

Para o bispo amazônico Johannes Bahlmann, da diocese de Óbidos, no Pará, esse tipo de ação pastoral distante é insatisfatório. Sua diocese cobre uma área de 182 mil quilômetros quadrados: 23 sacerdotes e 20 freiras cuidam das cerca de 600 paróquias da região.

Em comparação, a Alemanha tem uma área de 357 mil quilômetros quadrados. Segundo a Conferência Episcopal Alemã, 13.285 sacerdotes cuidam dos fiéis nas cerca de 10 mil paróquias.

Com frequência, o bispo Bahlmann viaja pela selva durante dias a fio. "Temos dificuldade de nomear, por exemplo, um sacerdote para a comunidade dos povos indígenas Tiriyó: eles vivem dispersos num raio de 150 quilômetros, e precisamos de dois dias de viagem para chegar a essa congregação", diz.

"Em tal situação, precisamos considerar se não seria apropriado ordenar alguém da comunidade como sacerdote, ainda que casado, para que possa também garantir a Eucaristia", sugere o bispo. "Consigo imaginar que existam padres casados."

Bahlmann ainda não é visto como um rebelde católico. No entanto, o bispo de 58 anos - que vive no Brasil desde 1984 - traz à tona o tema principal do sínodo: o afrouxamento do dever de celibato dos sacerdotes católicos.

No Vaticano, cardeais e bispos conservadores, por outro lado, estão enfrentando uma tempestade. Recentemente, o cardeal alemão Gerhard Ludwig Müller, ex-prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, no Vaticano, alertou publicamente contra a utilização do Sínodo da Amazônia como uma "bola de demolição" das estruturas existentes.

Eles sabem que o papa tem aliados não só no Brasil para a sua "estratégia amazônica", como o relator-geral do sínodo, o cardeal brasileiro Cláudio Hummes: o bispo alemão Franz-Josef Overbeck, responsável pela Adveniat, a organização católica de assistência à América Latina, e Josef Sayer, ex-diretor-geral da organização de assistência Misereor, estão também envolvidos na preparação do evento.

Os receios do cardeal Müller sobre um colapso em Roma não podem, portanto, ser descartados. Já que, se os padres da Amazônia podem se casar, por que não os da Alemanha ou do mundo inteiro?

O padre Edilberto Sena, de Santarém, tem o mesmo pensamento: "A ênfase de que isso se aplicará somente aos padres em comunidades distantes mostra, para mim, apenas a atitude cautelosa do papa. Se o sínodo e o pontífice concordarem com o uso de sacerdotes casados em comunidades remotas, estará aberto o caminho [para outras partes do mundo]."

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