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Bolsonaro cede a políticos e recria dois ministérios

Para garantir aprovação de MP que alterou estrutura do Executivo, Planalto dá aval para reativar Cidades e Integração Nacional; parlamentares vão indicar ministros

7 mai 2019 - 12h59
(atualizado às 22h53)
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BRASÍLIA - Com dificuldades no Congresso, o presidente Jair Bolsonaro recuou de sua decisão de não entregar o comando de pastas a partidos e decidiu dividir o Ministério do Desenvolvimento Regional em dois, recriando Cidades e Integração Nacional. Para se aproximar do Legislativo e não sofrer novas derrotas no momento em que a medida provisória da reforma administrativa corre riscos e deputados resistem a mudanças mais drásticas na aposentadoria, Bolsonaro cedeu e concordou que os aliados na Câmara indiquem o titular de Cidades e os no Senado, o ministro da Integração.

Das duas pastas, a mais cobiçada pelos políticos é Cidades, que historicamente teve vultoso orçamento e relação direta com os municípios - importante em um ano que antecede eleições municipais. O novo desenho da Esplanada foi embutido na Medida Provisória 870, que trata justamente da diminuição do número de ministérios de 29 para 22 e reorganiza as atribuições do Executivo. O texto deverá ser votado nesta quarta-feira, 8, em uma comissão especial do Congresso.

Fernando Bezerra (à esq.)com o deputado João Roma (PRB-BA), presidente da comissão, em sessão nesta terça-feira
Fernando Bezerra (à esq.)com o deputado João Roma (PRB-BA), presidente da comissão, em sessão nesta terça-feira
Foto: WALDEMIR BARRETO/AGÊNCIA SENADO / Estadão

Apesar das mudanças, a Esplanada continuará com 22 pastas, se a MP for aprovada. Motivo: o Banco Central perderá status de ministério assim que a MP for convertida em lei.

Depois de dizer que o governo Bolsonaro era "um deserto de ideias" e protagonizar várias polêmicas com o Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deverá apadrinhar o novo ministro das Cidades. O nome mais cotado para o cargo é o do ex-deputado Alexandre Baldy (PP), atual secretário de Transportes Metropolitanos de São Paulo. Baldy foi ministro das Cidades no governo Temer. Já o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), chancelará a indicação de um político para ocupar a cadeira de Integração Nacional. Ao Estado, Baldy disse que não foi procurado para tratar do assunto. Maia não ligou de volta.

Os presidentes da Câmara e do Senado atuaram, na prática, como porta-vozes de partidos que compõem o Centrão. Na Câmara, o grupo reúne aproximadamente 250 dos 513 deputados e tem influência sobre votações importantes, como a reforma da Previdência. Com lugar de destaque nesse bloco, o PP já comandou tanto Cidades como Integração em governos do PT e do MDB.

Bolsonaro disse que os chefes do Legislativo manifestaram a ele, ontem, a intenção dos congressistas de recriar a pasta de Cidades. "Vieram de forma bastante objetiva tratar desse assunto comigo. Eu não criei óbice no tocante a isso. Apenas que o futuro ministro, caso seja criado, venha da indicação da Frente Parlamentar dos Municípios, das cidades." Questionado, o Ministério da Economia não respondeu qual a estimativa de impacto financeiro com as mudanças.

Antes responsável pelo programa Minha Casa, Minha Vida, Cidades foi, ao longo dos anos, foco de denúncias de corrupção, muitas investigadas pela Lava Jato. Sob comando do Desenvolvimento Regional, o projeto de moradia popular perdeu recursos, mas agora deve migrar para Cidades. O Estado apurou que o atual ministro do Desenvolvimento, Gustavo Canuto, poderá sair da equipe ou ser transferido para outra função.

Mesmo com a proposta de recriar Cidades e Integração, partidos do Centrão ainda não estão satisfeitos e há quem queira obstruir a votação de hoje da MP. Um dos defensores da estratégia é o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL). A cúpula do PP não se acha responsável pela indicação de Baldy, mas o presidente do partido, Ciro Nogueira (PI), admite que ele é "o nome mais forte".

Além disso, integrantes do Centrão ainda tentam devolver o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para a equipe econômica, na tentativa de tirar poderes do ministro da Justiça, Sérgio Moro. O relator da MP, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), afirmou que a votação sobre o destino do Coaf será difícil. O Estado revelou ontem que dos 26 membros da comissão especial, 13 são contra a mudança.

Relator inclui em relatório restrição à ação da Receita

Além da recriação de dois ministérios, o relator da medida provisória que reestruturou a Esplanada, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), incluiu em seu texto restrição às investigações conduzidas pela Receita Federal e a previsão de uma espécie de "filtro" para o compartilhamento de informações bancárias e fiscais com órgãos como o Ministério Público.

Técnicos da Receita veem na iniciativa uma tentativa de frear ações criminais que hoje contam com a colaboração de dados do Fisco, inclusive a Operação Lava Jato. A paternidade da emenda foi atribuída pelo relator ao líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), alvo de uma denúncia na Lava Jato pela utilização de informações falsas em prestação de contas de campanha. O senador também é alvo de inquéritos ainda em curso. Procurado, porém, Braga negou ter sugerido a inclusão da emenda.

O relatório de Bezerra prevê que a competência dos auditores da Receita se limitará, na esfera criminal, à investigação de crimes tributários ou relacionados ao controle aduaneiro. Essa orientação já vinha sendo difundida pelo próprio comando do órgão, como antecipou o Estado, com o objetivo de impedir que auditores "avancem a linha" e usem as fiscalizações para investigações policiais.

O parecer, porém, foi além e previu que, fora crimes tributários ou aduaneiros, o auditor precisará de uma ordem judicial para compartilhar qualquer informação de indício de crime com órgãos ou autoridades.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast, há o temor na Receita de que, da forma como foi redigido, o dispositivo possa resultar em efeitos retroativos e acabe derrubando ações já em curso. O relator, porém, negou que isso possa ocorrer. "A gente precisa dar limites para não haver a exacerbação do exercício de determinados poderes", afirmou. Procurada, a Receita não quis comentar o assunto.

O que propõe o relator

1. Ministérios

Desmembra o Ministério do Desenvolvimento Regional, recriando as pastas das Cidades e da Integração Nacional.

2. Funai na Justiça

Transfere a Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, de Sérgio Moro. A demarcação de terras indígenas e quilombolas, porém, continua no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), vinculado ao Ministério da Agricultura.

3. Consea

Recria o Conselho de Segurança Alimentar (Consea), para ser inserido no Ministério da Cidadania.

4. ONGs

Retira da Secretaria de Governo a atribuição de monitoramento de organizações não governamentais.

5. Registro Sindical

A Coordenação-Geral de Registro Sindical passa do Ministério da Justiça e Segurança Pública para a pasta da Economia.

6. Receita

Proíbe auditores fiscais da Receita Federal de investigar crimes não tributários.

Estadão
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