Home Page





Pergunte aos Pros



Logo TidBits

Caso Folha de Bananeira – Piada ou Apologia?

por Emerson Rezende - colaborou: Heinar Maracy

Imagine um site de comércio muito bem feito, conteúdo bem elaborado para seu público-alvo (os jovens) e que conta até com música tema matadora. Não seria nenhuma surpresa que o marketing boca-a-boca fizesse o resto e causasse uma certa comoção junto à comunidade online. O resultado é que esse site se tornou um sucesso estrondoso, até obrigando o serviço de hospedagem a retirá-lo do ar, aparentemente, por causa do excesso de visitas, problema que é também conhecido como “excesso de banda”.

O exemplo acima só omite um “pequeno” detalhe: esse site era o Folha de Bananeira (www.folhadebananeira.com.br), um serviço de entrega à domicílio de drogas ilícitas ou como o próprio site preferia chamar, “de substâncias controladas”.

Ao abrir o site, uma versão da música “Folha de Bananeira”, composta por Armandinho, invadia o ambiente. A letra começava assim: “Fuma, fuma, fuma folha de bananeira; fuma na boa só de brincadeira; seu guarda cê não pode me prender; é só um fino que eu acabo de cumê; se chegou tarde, o que posso fazer; sou de menor e cê num pode me prender”. Poderiam ter escolhido tema melhor?

Na homepage do “Folha” estavam listados links dos produtos e de algumas promoções, como por exemplo um “Kit Rave” no qual constavam uma porção de “fumo carioca”, uma pastilha de ecstasy, um pouco de haxixe e um frasco de lança-perfume. Já na sessão de “fumos”, haviam 3 categorias: “fumo carioca A e B”, “fumo baiano A e B” e skank. E na “Sessão de Psicodélicos”, era possível – pasmem – adquirir papelotes de cocaína a um precinho bem camarada.

Mas depois de entrarmos em contato com o “serviço de entregas” do “Folha”, o que percebemos é que esses caras estavam levando o negócio bastante à sério. Além do site prá lá de bem produzido, emails de "usuários", eram
respondidos por um suposto "gerente comercial". Segundo ele, "nosso
serviço é simples , rápido, e eficaz, após a escolha do produto desejado, a entrega é efetuada algumas horas depois. Você recebe uma ligação dizendo que seu produto foi entregue; o entregador descreve o local exato onde foi deixado seu produto; o entregador só vai embora após ter confirmado a entrega. Não há contato pessoal. Pagamento via deposito bancario".

Nossa tentativa de entrevistar os responsáveis pelo “Folha” , assegurando que suas identidades seriam preservadas, se fosse o caso, não deu em nada. Eis o que o “gerente comercial” respondeu:

“Caro Emerson, agradecemos os elogios mas embora um tanto bem humorado, nosso sistema funciona como uma outra empresa qualquer, ou seja tem escalas de trabalho, serviços de entrega, pagamento a fornecedores, almoço e jantares com distribuidores, a única diferença está naquilo que comercializamos. Embora a sociedade critique tais substâncias, entretanto o que seria de nossa sociedade sem estas? Infelizmente não podemos atendê-lo, por questões de segurança e ordens superiores (sic)”.

Cheira como um hoax, anda como um hoax, late como um hoax. Daqueles feitos por profissionais. Depois dessa mensagem, o tal “gerente” não mais respondeu às minhas, nem às do nosso “agente” infiltrado. Pouco tempo depois, o site saiu do ar por ter estourado a banda do provedor.

Uma desculpa plausível, posto que ele foi o grande sucesso da internet brasileira da semana passada. Não é de hoje que algum(ns) engraçadinho(s) se prestam a gastar tempo, e até dinheiro, para pregar peças em “internautas inocentes” criando sites falsos ou espalhando boatos pela rede, prática que é chamada de hoax no meio nerd/geek/interneteiro. Quem não se lembra do anúncio de produtos como “gatos bonsais” ou “água desidratada”? Até foi criado um museu virtual dedicado ao assunto.

Quem pensa que a prática de hoax não dá rolo, mesmo sendo feita às claras, está redondamente enganado. Um exemplo disso foi o do site carioca Bangu 1, idealizado pelo designer Diego Zambrano e pelo publicitário Lúcio Leonardo.

A dupla criou essa página de humor como forma de expressar seu descontentamento em relação ao “estado caótico da violência no Rio”. O conteúdo do site estaria a cargo dos personagem Elias Eunuco e Ranca Toco, dois presidiários que, com seus notebooks, postam seus comentários carregados de gírias e mais do que politicamente incorretos, diretamente da penitenciária que dá título ao site. Lá estão publicadas algumas pérolas como “Sanduíche de McConha leva à prisão preventiva de Ronald”. Ou ainda um glossário de “Bangunês” e sessões úteis para a vida de quem vê o sol nascer quadrado como a “Oração do Detento” e dicas de como fazer a sua própria rebelião, por exemplo.

Só que a brincadeira caiu mal para o governo Rosinha (Garotinho) Matheus. Há alguns meses Zambrano e Leonardo foram processados pelo governo do estado do Rio, o qual exigia o fechamento do site porque estaria fazendo apologia ao crime. Os dois recorreram da sentença e conseguiram o improvável: ganharam a causa e reconquistaram o direito de manter o “Bangu 1”. O juiz se baseou no artigo 5º do 9º capítulo da Constituição Federal, que diz o seguinte: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença". É por isso que está no ar até hoje, apesar de não estar sendo atualizado desde junho desse ano. “Realmente a proposta do Folha de Bananeira é muito mais agressiva que a nossa, que é a de fazer uma crítica social bem humorada”, comentou Zambrano sobre o concorrente barra-pesada do Bangu 1.

Durante nossas acaloradas discussões junto a colegas e leitores, algumas questões bastante interessantes foram levantadas depois da passagem do furacão “Folha” pela internet. Alguns se disseram satisfeitos pelo fechamento do site, por acharem que ele fazia apologia ao consumo de drogas proibidas, o que é crime. E os que se sentiam tristes se dividiam em dois grupos: os que caíram ou não na conversa. Enquanto uns estouravam rojões porque – finalmente – tinham encontrado um “canal amigável e acessível” para a obtenção de tais substâncias, os mais ponderados só achavam divertido ver o quanto os idealizadores do “Folha” são caras-de-pau.

Em última ánalise, o “Folha de Bananeira” acabou oferecendo aos internautas a possibilidade de refletir sobre se o que é publicado na internet é verdade ou não, já que infelizmente não há estatísticas, nem qualquer estimativa sobre qual é a portecentagem de conteúdo realmente verossímil que se encontra online. A “prova dos nove”, no final das contas, está no bom senso do leitor, que tem a obrigação de desenvolver uma postura crítica em relação ao que está sendo noticiado não só na internet, mas na mídia como um todo.

E é isso que o “Folha” acabou fazendo. O que era uma brincadeira de programadores desocupados ou com bastante tempo livre, acabou contribuindo para que os leitores percam mais um pouco de inocência e se tornem cidadãos mais críticos e ativos na sociedade.