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O autor anglo-indiano Salman Rushdie, que esteve em agosto no Brasil para participar da FLIP, em Paraty (RJ) |
★★★★ ROMANCE
SALMAN RUSHDIE será sempre lembrado como o autor jurado de morte por fanáticos muçulmanos, que o acusaram de blasfemar contra o Islã no romance Os Versos Satânicos. Duas décadas se passaram e, se a ameaça ainda existe, o anglo-indiano nunca se deixou abater e, muito menos, de escrever. Foi em homenagem ao filho pré-adolescente, Milan, que Rushdie criou Luka e o Fogo da Vida (Cia. das Letras, 208 págs., R$ 33), uma obra infanto-juvenil em que dialoga com seu público pela linguagem mestra da garotada atual: o videogame.
Antenado nas manias dessa geração, ele usa o esperto artifício para se lançar em uma narrativa metafórica, com aspirações bem mais abrangentes que uma simples aventura.
O garoto Luka, de 12 anos, é irmão do protagonista de Haroun e o Mar de Histórias, de 1990. Haroun, desta vez, fica de coadjuvante. É o caçula quem vai se embrenhar pelo Mundo da Magia, com a missão de roubar o tal Fogo da Vida e salvar o pai, o famoso contador de histórias Rashid, que caiu em um estranho e profundo sono. A tênue linha entre a vida e a morte ganha forma de um universo fantástico, em que criaturas mágicas e lugares sagrados resgatam a arte de Sherazade e As Mil e Uma Noites. E Rushdie se mostra um discípulo inspirado. Como em um legítimo videogame, com estágios e barras de energia, Luka avança pelo desconhecido, onde as fronteiras entre a infância e a juventude se iluminam em imagens e diálogos regados de lirismo. É uma leitura enternecedora que deve sensibilizar não só a meninada, mas os adultos que ainda acreditam em mágica.