
Perfil
O
homem que mora numa árvore
Cristian
Avello Cancino
Divulgação |
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Krajcberg
e sua casa no sul da Bahia: obras com árvores queimadas
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Frans
Krajcberg mora numa “ilha cercada pela família”. A “ilha” é uma
casa construída no alto de uma árvore. A “família” é a floresta.
De gente o escultor polonês se cansou, que essa lhe legou muito
sofrimento.
Krajcberg
escolheu o Brasil para viver após a 2ª Guerra, depois de perder
seus pais em campos de concentração. Chegou ao Rio de Janeiro em
1948. A passagem foi paga pelo mestre da pintura Marc Chagall, porque
o escultor mesmo não tinha dinheiro.Hoje,
tem o “necessário”, vende poucas obras, apenas para museus ou colecionadores
de sua simpatia.
A pouco tempo de completar 80 anos de vida, Krajcberg recebe grandiosas
homenagens: a publicação de uma caixa com os livros Natura e
Revolta (Editora GB Arte, R$ 150) – que reúne cem imagens de
suas obras e uma biografia ilustrada com 50 fotos – e o projeto
do Museu Krajcberg, a ser construído em Nova Viçosa, sul da Bahia.
O
escultor adianta que o governo francês também estuda a possibilidade
de criar um museu para ele. “Eles aproveitariam o velho estúdio
que tenho em Paris para erguer o museu. Doei o estúdio para a prefeitura
da cidade”, diz o artista, que há um ano instalou uma escultura
nos jardins dos Champs Elysées, na capital francesa.
Divulgação |
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Krajcberg
faz esculturas com árvores queimadas em incêndios florestais, fotografa
as áreas devastadas e denuncia a destruição em fóruns internacionais.
Por não estar no Brasil por um acaso, mas por escolha, fala do País
e de seus artistas sem comedimento. “Nunca vi um lugar onde os artistas
fossem mais desunidos do que aqui. No Brasil não há movimento artístico.”
E no exterior? “Nos EUA me perguntam primeiro quanto vale a minha
obra. Só depois querem saber do que se trata.”
Krajcberg
é um homem que duvida e não arrefece. Diz-se revoltado e não gosta
das cidades. Por isso mora na árvore. “O mundo está cada vez mais
urbano. Se não nos conscientizarmos logo, teremos problemas. Ninguém
fala do que aconteceu em dezembro último, quando a terra girou fora
do eixo. Há alterações climáticas evidentes, pois a natureza é vingativa”,
diz o escultor, mais conhecido na França do que aqui.
Isso
pode mudar com a criação do museu. O projeto, do arquiteto Jaime
Cupertino, prevê um edifício de 1,5 mil m2, com muitas
janelas de vidro, em Nova Viçosa. Faria justiça à obra engajada
desse artista, que quando chegou ao Brasil dormiu em bancos de praça
e trabalhou como servente na Fundação Bienal, em São Paulo.
O
museu ainda não tem data para ficar pronto, mas Krajcberg abre um
sorriso ao falar dele, sem mencionar detalhes: “O projeto é muito
bonito”. Vê beleza em tudo? “Não gosto de como os homens vivem hoje,
da preocupação exacerbada com o dinheiro. É impressionante lutar
pela vida.” Todo poético, Krajcberg transforma as dificuldades do
passado em potência criadora, tendo como testemunha a árvore onde
mora e a legião daqueles que o admiram, impressionados com sua obra
e sua vida.
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