
Justiça
Mariz
X Bastos Duelo de Titãs
O julgamento de Pimenta Neves pela morte de Sandra Gomide expõe
as semelhanças dos advogados Márcio Thomaz Bastos e Antônio Cláudio
Mariz de Oliveira
Cesar
Guerrero
Piti
Reali |
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“Meu
cliente não representa
um perigo para a sociedade’’
Mariz de Oliveira |
Márcio
Thomaz Bastos está mudando de endereço no próximo mês de outubro.
O duplex de 1,2 mil metros quadrados, localizado no Jardim Paulista,
ficou espaçoso depois que a filha Marcela casou-se em 1997. Sua
nova morada será no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo.
Nesse apartamento que ocupa um andar, com área de 600 metros, acontecerá
uma festa de inauguração para 200 pessoas. Na lista de convidados,
consta o nome do amigo Antônio Cláudio Mariz de Oliveira.
Até
o fim deste ano, eles terão um novo encontro. Desta vez, estarão
num tribunal. Dois dos criminalistas mais badalados do Brasil definirão
o destino do jornalista Antônio Marcos Pimenta Neves, réu confesso
na morte da também jornalista Sandra Gomide, ocorrida em 20 de agosto,
em Ibiúna, onde foi alvejada com dois tiros.
Mariz,
55 anos, é o advogado de defesa do ex-diretor do jornal O Estado
de S. Paulo. Thomaz Bastos, 65, atuará como assistente de acusação.
Por enquanto, os adversários se elogiam. “Ele é um excelente profissional
e um orador eloqüente, mas defende uma causa perdida”, provoca Bastos.
“Vai ser uma batalha dura, mas meu cliente não representa um perigo
para a sociedade”, rebate Mariz. Os dois profissionais já se enfrentaram
duas vezes num tribunal do júri. Bastos venceu ambas, mas nenhum
dos dois casos tinha o apelo do crime cometido pelo diretor de um
dos maiores diários do País.
Silvana
Garzaro |
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“Ele
é um excelente profissional, mas a causa já está perdida’
Márcio Thomaz Bastos |
O último
confronto desse gênero aconteceu há 21 anos e reuniu no tribunal
de Cabo Frio, litoral do Estado do Rio, Evandro Lins e Silva e Evaristo
de Moraes Filho. Ao final de 22 horas de debate, Evandro conseguiu
provar que Raul Fernandes, o Doca Street, não matou a pantera mineira
Ângela Diniz a sangue frio. Isso fez com que a condenação despencasse
de 30 anos para um ano e meio de prisão.
O
resultado foi contestado e depois de dois anos, um novo julgamento
foi marcado. A acusação, representada por Heleno Fragoso, derrubou
os argumentos de Humberto Teles, advogado de defesa, e condenou
o réu a 15 anos de cadeia.
Apesar
de antagonistas nesse caso, Bastos e Mariz têm muito mais em comum
do que as nove mil horas que passaram em julgamentos de crime contra
a vida. Eles continuam instalados no centro da cidade, e vão a pé
até o Tribunal de Justiça. Ambos recusam-se a representar acusados
de crimes violentos contra crianças. Até os honorários são equivalentes.
Um processo de homicídio, do inquérito ao júri, fica em torno de
R$ 100 mil.
Ideologicamente,
ambos transitam pela esquerda. Bastos vota no Partido dos Trabalhadores
(PT) e é amigo de Luiz Inácio Lula da Silva. Mariz é filiado ao
Partido Socialista Brasileiro (PSB). Essa característica não os
impediu de cultivar uma eclética lista de clientes. Bastos já defendeu
Wagner Canhedo, proprietário da Vasp, o ex-rei da soja Olacyr de
Moraes e o banqueiro Ângelo Calmon de Sá. Mariz foi contratado por
Celso Pitta e Paulo César Farias. “É preciso apartar a convicção
pessoal do dever profissional”, justifica-se.
A amizade
entre os dois criminalistas surgiu na Ordem dos Advogados do Brasil,
na década de 80. Bastos foi presidente nacional, enquanto Mariz
dirigiu a seção paulista. Quando tentou e conseguiu a reeleição
em São Paulo, em 1988, o colega o auxiliou durante a campanha e
até distribuiu santinhos no dia da votação. Foi nessa época que
as duas famílias estreitaram a amizade. E o convívio parou aí. Eles
não têm relacionamento profissional, ou seja: um nunca pediu ajuda
ou conselho ao outro. É justamente neste ponto que começam as divergências.
“Os
dois são brilhantes”, garante o jurista Goffredo da Silva Telles
Jr. Mas é no júri que essas diferenças se acentuam. Mariz carrega
a voz de emoção, gesticula, soca a mesa com força. Caminha tanto
de um lado para o outro que chega a perder peso ao final da sessão.
Bastos é mais tranqüilo. Com um discurso moderado, ele olha fixamente
para cada um dos jurados e explica todas as provas com a sabedoria
de um professor.
Essas
duas condutas de trabalho estarão se confrontando. Bastos quer enquadrar
o réu em homicídio duplamente qualificado. Pleiteia uma pena de
15 anos em regime fechado. Mariz se dará por satisfeito se provar
que Pimenta agiu sob forte emoção. Nesse caso, a sentença poderá
cair para quatro anos. O mundo jurídico aguarda o desfecho. “Um
julgamento como esse vale mais do que um mês de curso”, diz Henrique
Salgado, 21, coordenador do Centro Acadêmico da Faculdade de Direito
da USP.
Cercado pela notícia |
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De
boné, Pimenta chega à delegacia,
na madrugada do dia 4 |
Pimenta
Neves, 63 anos, foi transferido na madrugada de segunda-feira
4, da clínica Parque Julieta, na zonal sul de São Paulo, para
o 77º Distrito Policial, em Santa Cecília, no centro da cidade.
O jornalista agora divide uma cela de cinco metros quadrados
com os protagonistas de duas outras manchetes: Mateus da Costa
Meira, o estudante de medicina que metralhou a esmo os espectadores
de um cinema, matando três deles, e o ex-vereador Vicente
Viscome, símbolo da máfia que tomou conta da Câmara Municipal.
Os três dormem em colchões colocados diretamente no chão.
O distrito não tem pátio para banho de sol e as visitas são
restritas às quintas-feiras. Meira e Viscome estão lá desde
13 de janeiro. Nesses nove meses, os órgãos de imprensa tentaram
entrevistá-los, sem sucesso. Agora, terão a companhia de um
jornalista em tempo integral.
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