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O Beco
Por Hugo Alves Salvater

Aquele dia havia sido muito tumultuado. Acordei atrasado para a escola, estava com muito sono e com mau-humor. Fui para casa na hora do almoço e retornei novamente para a escola à tarde. Eu sairia somente às nove horas porque tinha algumas provas.

Minha casa não fica muito longe da escola. Andando deve dar no máximo dez minutos mas a rua pela qual eu ia era muito comprida, dando a impressão de ser mais longe.

Eu sempre tive mania de perseguição, mas naquele dia foi diferente. Ao sair da escola vi que a rua estava bem escura e confesso que fiquei um pouco amedrontado mas já havia me acostumado a andar sozinho à noite.

Andei um pouco e comecei a escutar passos atrás de mim. Virei-me e não vi nada, o que deixou-me muito apreensivo. Resolvi andar um pouco mais rápido e continuava ouvindo passos. Olhei para trás novamente e nada. Então comecei a andar olhando para trás. Quando menos esperava bati em um poste de cara e deixei tudo cair no chão, inclusive eu. Estava meio tonto e a vista embaraçada por causa da batida.

Percebi que tinha alguém lá na frente mas só enxergava um borrão que lentamente se aproximava de mim. Fiquei com muito medo. Peguei meus materiais de qualquer jeito (acho que deixei algumas coisas no chão) e comecei a voltar para a escola, que aquela altura já devia ter fechado mas era meu único refúgio. Não sabia o que era aquilo... uma pessoa, um animal, um fantasma ou mesmo só a minha imaginação. Mesmo assim preferi não arriscar-me.

Caminhei uns dez metros e percebi algo se aproximando. Desta vez tinha convicção de que era uma pessoa mas não conseguia ver seus pés. Isso me deu calafrios e minha pressão começou a baixar. Avistei um beco à minha frente mas teria de correr para chegar lá pois aquela coisa estava aproximando-se à minha frente. Com muita dificuldade corri o máximo que pude para chegar antes. A sensação de estar correndo em direção àquilo para chegar ao beco desesperou-me ainda mais.

E quanto mais eu corria mais ele aproximava-se. Instintivamente olhei para trás e a mesma figura vinha em minha direção só que um pouco mais rápido. Neste pude observar que realmente não tinha pés e que seu rosto era totalmente branco. Parecia cera. Comecei a chorar.

Enfim alcancei o beco que para meu azar era sem saída. O problema era que ele era muito longo e só fui perceber que não tinha saída quando cheguei ao final. Hesitei em olhar para trás. Foi um momento muito difícil. Estava com medo de virar e constatar que estava vivendo aquilo de verdade. Fechei meu olhos.

Eu não precisei olhar. Comecei a escutar o barulho que emitiam. Pareciam gemidos só que com uma entonação grossa. O barulho foi aumentando e tampei os ouvidos mas de nada adiantou. Tinha invadido minha cabeça.

Quando abri os olhos vi que ao meu lado havia uma pequena porta (ainda não tinha olhado para eles mas sabia que estavam próximos). Abri e havia vassouras dentro. Com muito esforço entrei e fechei a porta. Essa foi a pior parte. Eu tenho calafrios sempre que lembro disso. Em alguns segundos a porta começou a ser forçada. Não sei onde arranjei forças para segurá-la mas eu consegui. Eu gritava muito pedindo ajuda mas ninguém ia me escutar. A porta estava enferrujada e cortei toda a minha mão. Doía muito mas não desisti. Eles lá fora gritavam mais do que eu...Essa foi minha última lembrança daquela noite.

Acordei assustado numa cama em um lugar estranho. Fiquei um minuto pensando e descobri que estava num hospital. Só não sabia como tinha ido parar ali. Meus braços estavam muito machucados e sentia uma forte dor na cabeça.

Eu chamei a enfermeira e ela veio me atender. Perguntei o que eu estava fazendo ali e ela foi chamar um homem. Ele veio conversar comigo. Disse que minha família estava lá fora. Perguntei o que tinha acontecido comigo. Eu logo lembrei do que tinha acontecido mas fiquei calado esperando ele responder.

Ele disse que eu tinha sido encontrado desmaiado perto da minha casa com os braços machucados. Disse também que provavelmente eu tinha desmaiado por causa de uma queda de pressão (isso era um problema comum para mim) e que tinha batido a cabeça na queda. Só não sabia explicar os machucados no braço.

Até hoje eu não entendo o que aconteceu comigo. Teria acontecido de verdade ou foi um sonho que eu tive enquanto estava desmaiado. Talvez eu tivesse desmaiado quando bati a cabeça no poste mas eu não fui encontrado perto dele. As coisas que aconteceram foram diferentes do suposto sonho mas tinham ligações. Eu não fui encontrado no armário de vassouras daquele beco e meus braços é que estavam machucados, não minhas mãos. Além disso, nenhum dos meus materiais foram encontrados.

Não contei aquilo para ninguém porque eu concordo plenamente que ninguém iria acreditar. Nem eu sei se acredito, mas foi muito estranho.

No dia seguinte ao que saí do hospital (era um domingo de manhã), resolvi enfrentar meu medo e ir até o tal beco. Comecei a refazer os mesmos passos daquela experiência desesperadora. O estranho é que nunca havia ido lá antes e parecia que eu já conhecia o lugar. Uma lágrima saiu dos meus olhos enquanto constatava que tudo era igual ao que havia visto no suposto sonho. Fui até o fim. Olhei para o lado e lá estava a porta. A pressão baixou novamente. Respirei profundamente e toquei na pequena maçaneta. Lentamente abri a porta enferrujada (!). Não havia nenhuma vassoura e sim uma escada que descia para um porão escuro. Aquilo deixou-me mais assustado ainda. Não pensei duas vezes e fechei a porta rapidamente. Saí correndo daquele beco e até hoje não voltei mais lá.

Ainda tenho as misteriosas cicatrizes no meu braço e desisti de tentar descobrir o que realmente aconteceu naquela noite. Talvez um dia eu volte naquele beco novamente e descubra.

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