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Domingo, 13 de janeiro de 2002, 15h10
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Foto: Luiza Dantas/Carta Z Notícias
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Na barraca do Pepê, ponto tradicional de naturebas, surfistas e jogadores de futevôlei na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, Eri Johnson não tem sossego. Reconhecido pelos transeuntes dos mais variados tipos, o ator é bombardeado pelo próprio bordão que criou para Ligeiro, o mecânico extrovertido e bem-humorado de O Clone. "Bom te ver", o novo bordão, era a maneira com que a maioria dos fãs, que inúmeras vezes pediam para tirar uma foto ao lado de Eri, se dirigia ao solícito ator. Visivelmente satisfeito com a abordagem do público e extremamente paciente, Eri não esconde a felicidade por já perceber a resposta do público à sua perfomance na novela das oito da Globo. "O 'bom te ver' está na boca do povo. Para mim é a prova de que estou no caminho certo na pele do Ligeiro", comemora o ator de 41 anos. Eri também faz questão de dizer que não se importa nem um pouco com a alcunha de "amuleto da sorte" da novelista Glória Perez. O Clone é a quinta novela da autora que o ator participa, entre as nove que já atuou em 15 anos de profissão. A união dos dois começou em Barriga de Aluguel, em 1990, quando ele viveu o dançarino Lulu. Depois vieram De Corpo e Alma, em 1992, Explode Coração, em 1995, e Pecado Capital, de 1998. "Não tenho problema em trabalhar diversas vezes com a Glória, pois é uma honra. Problema para mim é ficar desempregado", ressalta Eri. O ator de voz rouca e surpreendentemente tímido volta e meia deixa entrever sua intimidade com o mundo do futebol. Eri foi ponta-esquerda do juniores do Vasco da Gama antes de se aventurar como ator de televisão. Por isso, tem momentos que seu discurso parece com as falas decoradas dos jogadores. "Novela é como um campeonato, você tem que entrar para ser artilheiro", compara o agora amante inveterado de futevôlei. "Acabei de ficar sabendo que só vou gravar às 16 h. Vai dar tempo de ir à praia dar uma jogadinha, parceiro", comemora, imitando o amigo Romário. Por que você sempre aparece com um novo bordão para seus personagens? Porque é uma maneira de atingir o público mais facilmente. O "bom te ver" escutei muito nas ruas e achei que se encaixava com o tipo do Ligeiro. É um bordão bem carioca e por isso pensei em trazer para a novela. Tenho outro bordão que é "tu ainda não viu nada". Mas acho que nem vou tentar incluí-lo, pois todo mundo já me pára na rua repetindo o "bom te ver". Acho que vai ficar para uma próxima novela da Glória. Mas o universo do Ligeiro não é estranho para mim e por isso não tive problemas de composição. Como assim? O Ligeiro é um malandro carioca do subúrbio. E como também vim de São Cristovão, exatamente o bairro em que a novela está se passando, pude utilizar a minha experiência de vida no personagem. Já aquele chapeuzinho, que parece de caçador, busquei em Recife. Estava fazendo teatro lá e quase todo mundo andava com o chapéu. Pensei logo no Ligeiro. Até para sair daquela coisa de sempre fazer os personagens de cabelo curtinho. E também porque o personagem pode ter uma virada na trama e posso mudar de visual mais facilmente. O Ligeiro deve se casar... Talvez com alguma das mulheres muçulmanas. Vai ser engraçado juntar o malandrão carioca com aquela tradição rigorosa dos árabes. Mas não sei, porque em um capítulo o Ligeiro já está armando para cima da Ivete, personagem da Vera Fischer. Por outro lado, a Nazira está solteira também, assim como o Ligeiro. Mas juro que não sei ainda ao certo o que vai acontecer. Porque a Glória fala para mim que escreveu um papel maravilhoso e acabou. Não pergunto o que vai acontecer, só se estou no caminho certo. No caso do bordão, expliquei para ela a minha idéia de cumprimentar as pessoas com o "bom te ver" e ela aprovou na hora. A Glória aceita sugestões, mas também diz não quando desgosta. Você consegue sempre introduzir algo da sua personalidade nos personagens. Como chegou a este ponto? O ator empresta o corpo e a voz para os personagens e fica difícil de algumas características não serem notadas. Estou no meu quarto malandro. Então, fico tentando fazer o "igual, mas diferente". Mas o público nota algumas semelhanças por mais que me esforce. Então, o que importa para mim é sempre emprestar a minha própria alegria para os personagens e passar uma energia para o espectador. Você não tem vontade de interpretar um papel totalmente diferente? Acontece que na profissão de ator não adianta ter muitas vontades. Aprendi isso durante meus 15 anos de carreira. Você tem várias vontades, mas elas vão passando. Não adianta ficar com tanta expectativa, pois você pode se frustrar. Então, repetir os mesmos tipos já chegou a incomodar? Não, porque tenho sorte. São personagens que transitam em um mesmo universo, mas que ainda assim consigo variar. Não gostaria é de fazer galã uma novela atrás da outra. Isso acho difícil até para os bons atores que fazem. Então, não tenho do que reclamar, só a agradecer. Novela para mim é como um campeonato de futebol. Quando começa você tem de se esforçar para se destacar, ser o artilheiro e estar aberto para qualquer alteração. Acredito em tudo em novela. As suas imitações de celebridades já eram famosas. A própria Glória pediu para você utilizá-las na novela? Ao contrário do bordão, realmente foi a Glória que sugeriu de fazer as imitações. Ela é minha amiga e já sabia que tenho facilidade com imitações. Assim que comecei a gravar, a Glória me avisou que queria as imitações de Caetano Veloso, Ney Latorraca, Carlos Vereza, Romário, Evandro Mesquita... também vou fazer o Roberto Carlos. O engraçado é que passei o Reveillon em São Carlos, interior de São Paulo, e um garotinho com o braço quebrado chegou e disse: "Aí, quer comprar o gesso? Era do Caetano". Já os imitados, acho que eles gostam, porque não debocho. Pelo contrário. Minha intenção é sempre prestar uma homenagem. Estar tão ligado a Glória Perez não dificulta trabalhar com outros autores? No Brasil, um sujeito quando está desempregado é muito criticado ou visto como coitado. Por isso, se tenho o privilégio de trabalhar com uma Glória Perez, não vou ficar preocupado com isso ou aquilo. Também nunca me preocupei em trabalhar com este ou aquele autor. Quero é fazer bem todo trabalho. Se forem as novelas da Glória, vai ser uma honra muito grande. Mas já trabalhei com outros autores. Inclusive um dos meus maiores sucessos foi Sonho Meu, de Lauro César Muniz, quando emplaquei o bordão "fui", na pele do mordomo Giácomo. Mas você já tinha um bordão parecido em Barriga de Aluguel, sua primeira novela da Glória. Realmente. O Lulu falava "já fui" e saía para algum lugar. Na novela do Lauro César só tirei o "já" e deixei o "fui". Lembro que o Lulu era meio afeminado e me perguntavam se não tinha medo de ficar estigmatizado. Meu problema é ficar estigmatizado como aquele ator que não faz. Isso sim. Quero é ter prazer de trabalhar. Você tem vontade de participar de um humorístico para explorar a verve de comediante? Não. Eu gosto bem mais de participar de cenas engraçadas em novelas. A esquete de humor, gosto mais de assistir. Fazer, talvez, eu nem saiba na verdade. Adoro estar dentro de uma trama com uma história engraçada. Prefiro assim do que um programa de humor específico, em que tenha de fazer graça ali de qualquer maneira. Vai complicar muito para mim, porque se torna uma obrigação fazer o espectador rir. Seria bem mais difícil conseguir ser natural. Na Record, deram a você um personagem parecido com o Tenório de Pecado Capital. A tendência é que as outras emissoras tentem que os atores repitam os papéis que fizeram sucesso na Globo? Acontece muito isso. Na época, falei para o pessoal da Record que tinha acabado de fazer um malandro. Mas eles insistiram para eu fazer o Pão Doce, um malandro também. Eles tentam repetir o sucesso da Globo até por uma dificuldade de conseguir um bom Ibope. Então preferem investir em algo que o público já esteja familiarizado. Senti que a repercussão dos personagens fora da Globo também é menor. Nem percebi tanto, porque, graças a Deus, já emplaquei alguns personagens que o público não esquece. Mas não dá para comparar com uma novela das oito da Globo. A resposta do público é imediata. O engraçado é que dificilmente me chamam de Eri ou pelo nome do personagem que interpreto. O público sempre lembra e me aborda com os bordões, além de repercutirem muito as cenas. Acho isso mais legal até que me chamarem pelo meu nome ou do personagem. É a prova de que o espectador realmente assistiu às minhas cenas e escutou o que falei. Miscelânea de tipos Eri Johnson já interpretou diversos tipos de personagens em nove novelas. O ator carioca começou fazendo uma ponta em Hipertensão, de Ivani Ribeiro, em 1986. Ele vivia um simples recepcionista de hotel, o agitado Juca. Mesmo sendo novato, Eri começou a colocar cacos no texto e seu personagem acabou a produção com um bom destaque. Mostrando versatilidade, o ator emplacou seu segundo trabalho na Globo como o gago Canguru, de Bambolê, novela escrita por Ana Maria Moretzsohn em 1987. O primeiro destaque, no entanto, veio com Barriga de Aluguel, em que aparecia na pele do afeminado Lulu. A produção marcou o início da parceria com a autora Glória Perez. "Percebi que a Glória gostava de meus cacos e incorporava ao texto. Por isso, a gente não se largou mais", garante Eri. Provando mais uma vez a sua facilidade em dar vida a tipos estranhos e humorados, Glória convocou o ator para viver o gótico Reginaldo em De Corpo e Alma, em 1992. Considerado por Eri como o seu trabalho mais dramático, o ator não esperava a favorável resposta do público. "Na época fiquei impressionado, pois todo tipo de pessoas vinha falar comigo. De criançinhas barulhentas a velhinhas de bengala", lembra um emocionado Eri. Reginaldo também trouxe uma dor de cabeça adicional para o ator. Na época, houve no Brasil o plebiscito pelo regime de governo – entre Presidencialismo, Parlamentarismo e Monarquia. Eri aderiu ao Parlamentarismo e apareceu na propaganda eleitoral vestido como o personagem gótico. A Globo não gostou e botou o ator na geladeira por quase um ano. Quando voltou, em Sonho Meu de 1993, escrita por Lauro César Muniz, foi com a corda toda. E emplacou o primeiro de uma série de bordões que fizeram sucesso. "O 'fui' do Giácomo virou minha marca até hoje. Foi onde percebi que o público adora bordões", explica Eri. Como o malandro Adilson Gaivota, de Explode Coração, sua terceira novela de Glória Perez, o ator não deixava de sempre terminar as frases com um "valeu, parceiro", numa clara alusão ao craque e amigo Romário. Dois anos depois, em 1998, como o jogador de futevôlei Clóvis Tenório, Eri tentou outros bordões, mas o que mais agradou ao público foi o "tudo é normal", que repetia sempre em seus diálogos. Já em Tiro & Queda, que a Record exibiu em 1999, ele testou um gíria paulistana na pele do atrevido Pão Doce. "Escutava todo mundo em São Paulo falando 'você é meu truta' e não tive dúvida em usar. Minha inspiração vem das ruas", confessa o ator. O retorno Mais do que marcar outra parceria com Glória Perez, trabalhar em O Clone foi a maneira que Eri Johnson encontrou para voltar a morar no Rio de Janeiro. O vascaíno de coração estava estabelecido em São Paulo há dois anos e meio e garante que já se sentia "local" na capital paulista. Mas, na verdade, a história que correu era diferente. Eri teria se mudado para São Paulo por sido obrigado a deixar o Rio, em 1999, após se desentender com o "patrono" Maninho, presidente da sua escola de samba, Salgueiro. Eri não confirma se mudou por isso, mas não nega que teve uma briga feia com o manda-chuva. "Tivemos uma discussão, mas jamais saí fugido. Hoje está tudo bem em entre nós e se ele estivesse aqui tiraria uma foto ao seu lado para provar", ressalta o ator, que deixou de sair na escola nos dois últimos carnavais – migrou para a folia baiana. "Se tiver folga nas gravações, devo sair no Salgueiro este ano", promete. Durante o período em São Paulo, Eri trabalhou na Record e deixou pela primeira vez a Globo. Logo depois de Tiro & Queda, se aventurou como apresentador do programa de auditório Fui, Ao Vivo, na Gazeta. O programa era produzido no Teatro Municipal de Osasco, com 500 pessoas na platéia. "Para mim era como uma peça, nem queria saber se estava gravando. Mas os dois produtores se desentenderam e o programa teve de acabar", lamenta o ator. Eri também arriscou-se como empresário da noite e abriu a boate Fui na capital paulista. "Cheguei à conclusão que não tenho nenhum jeito para empresário. Meu negócio é atuar", acredita o ator.
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Rodrigo Teixeira TV Press
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