CBF dá palestras nos clubes para tentar diminuir casos de doping no futebol brasileiro
Profissionais do Departamento de Controle de Dopagem fizeram 109 palestras no ano passado
Nos últimos dez anos, o futebol brasileiro teve 151 Resultados Analíticos Adversos (RAA), os chamados casos de doping. Desse total, as substâncias mais encontradas foram diuréticos com 26 casos; estimulantes não específicos (cocaína) com 25 episódios e anabolizantes, consumidos por 23 atletas.
Fernando Solera, coordenador do Departamento de Controle de Dopagem da CBF, avalia que os números estão caindo nos últimos anos. "Anualmente, acompanho a relação total de RAA com o número de amostras coletadas e tenho percebido uma diminuição gradativa entre 2015 em 2018", observa o especialista. "Em 2015, nós tínhamos um índice de positividade de 0,31%. Em 2018, o índice foi de 0,23%. Diante de dados matemáticos, não existem argumentos. Sem dúvida nenhuma o futebol brasileiro é um dos mais monitorados por uma Organização antidoping no mundo", comenta Solera.
O aumento dos casos de cocaína entre 2018 e 2019 representa uma preocupação para a CBF. Até o mês de abril já foram quatro casos, entre eles, o do atacante Gonzalo Carneiro, do São Paulo. "Comparativamente ao ano de 2018, é claro que chama a atenção esta demanda", afirma o especialista.
As penas são pesadas para quem é pego. No caso de substâncias não especificadas, como anabolizantes, estimulantes (cocaína, maconha), que são considerados casos graves, a punição é de quatro anos. Para substâncias especificadas, como diuréticos e corticoides, a pena é de dois anos.
Além do monitoramento, a entidade aposta na conscientização dos atletas, especialmente os mais jovens, para buscar a redução contínua dos casos de doping. O Programa Educacional da CBF, dirigido para o futebol masculino e feminino, categorias de base e adulto, oferece palestras de 90 minutos sobre conceitos básicos relacionados ao doping e o antidoping, legislação desportiva com ênfase à dopagem e a prevenção ao doping involuntário. Os pais dos atletas também assistem às aulas.
Em 2018, foram 109 palestras em clubes, Congressos Médicos e de Direito Desportivo. Até o mês de maio, já foram cerca de 30 eventos de conscientização. Entre 2017 e 2018, Solera avalia que as aulas foram eficazes para a queda dos casos de doping com diuréticos (redução de 9 para 2) e também de corticoides (queda de 6 para 1 caso).
ENTREVISTA
Ricardo Munir Nahas, vice-presidente da Confederação Sul-Americana de Medicina do Esporte (COSUMED), coordenador da Pós-graduação CEFIT-UNIP em Medicina do Esporte em trauma esportivo, explica os efeitos da cocaína nos atletas de alto rendimento:
1. Quais são os efeitos da cocaína no organismo?
Ela traz a euforia, aquela famosa "viagem" no aspecto psicológico. Ela deixa o usuário "ligadão" em uma festa, por exemplo. A droga também pode liberar por um período curto a agressividade e diminuir a sensibilidade à dor. No dia seguinte, o usuário acorda muito mal, física e psicologicamente, mas surge a dependência de doses crescentes para gerar aquela mesma euforia. Por outro lado, a cocaína aumenta a frequência cardíaca e a temperatura corporal. O usuário corre o risco de ter um enfarte. Em geral, os jogadores acabam consumindo a droga em festas e eventos sociais, e o metabólito vai aparecer no exame de urina. Ele acaba sendo punido não por um problema atlético e sim por um problema social.
2. O fato de ficar 'ligadão' não é uma vantagem para o jogador?
Não. A cocaína não traz uma vantagem competitiva. Seus efeitos são muito rápidos e não são cumulativos. Eles não têm interferência em um jogo de futebol. O atleta não vai fazer isso (usar droga) no vestiário. Quando ocorre o doping, o atleta foi pego em função do que fizeram na semana.
3. Quais as razões do aumento dos casos de doping por cocaína?
Não é um problema só do esporte. Ele é de toda a sociedade. A principal saída é a educação. É preciso mostrar para eles que as punições são rígidas. Antigamente, era possível que as entidades até passassem a mão na cabeça do atleta. Hoje, isso não acontece. Isso prejudica muito a carreira de um atleta, que já é curta, além de deixar uma mancha em sua trajetória.