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A cerimônia que celebrou a amizade com aplausos patrióticos

É sabido que Putin raramente põe os pés em um estádio de futebol, mas certamente ele deve ter gostado do que viu

15 jun 2018 - 04h04
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As cerimônias de abertura de grandes eventos esportivos, como Copa do Mundo e Olimpíada, são criadas e organizadas como um grande cartão-postal do país organizador, que apresenta com orgulho detalhes significativos de sua cultura e sociedade. Mas, se os Jogos Olímpicos estabeleceram uma competição entre nações sobre quem surpreende mais, com arroubos tecnológicos e festas por vezes intermináveis, os Mundiais da bola exigem cerimônias mais enxutas, portanto, com um foco mais evidente.

Diferente da festa brasileira em 2014, marcada por uma série de erros de conceito e concepção, e da África do Sul quatro anos antes, cujos destaques foram apenas a colombiana Shakira e a ensurdecedora vuvuzela, a cerimônia de abertura da Copa da Rússia foi um exemplo bem-acabado de propaganda política e cultural. É sabido que Vladimir Putin raramente põe os pés em um estádio de futebol, mas certamente ele deve ter gostado do que viu nesta quinta-feira.

Por ser um evento concebido para agradar especialmente ao público que acompanha pela televisão, a festa russa começou com o uso de recursos tecnológicos para unir passado e presente. O vídeo começou com imagens de temas marcantes da cultura, tudo ao som do Concerto nº 1 Para Piano e Orquestra, do compositor clássico romântico Tchaikovski. A melodia, além de conhecida e bela, ajuda a entender dois aspectos importantes da poética melódica do autor russo: apesar da admiração confessa pela cultura ocidental (especialmente pela música italiana), Tchaikovski se revelava um compositor profundamente nacional na escolha de seus temas e na forma rítmica de sua obra.

Uma das últimas imagens do vídeo apresenta uma das joias da coroa ufanista russa: Sputnik, o primeiro satélite artificial da Terra, lançado pela então União Soviética em 1957, fato que, junto do voo de Yuri Gagarin no Vostok (1961), mexeu com os brios dos americanos e detonou a corrida espacial.

Um exemplo de ousadia também representado pelo balé O Pássaro de Fogo, que foi dançado já no gramado do estádio Luzhniki. Criada por Igor Stravinski no início do século 20 e apresentada pela primeira vez em Paris, a música surpreendeu (chocou, na verdade) pelo tom fantástico, mas também pela ressaltada influência nacionalista.

A partir desse momento, tornou-se claro que a cerimônia da abertura da Copa russa se prestaria essencialmente para uma missão: ressaltar os laços com a cultura ocidental, desde que dessa simbiose se destacasse, ainda que discretamente, o valor do talento russo. Assim, o único corpo estranho no gramado era o do cantor britânico Robbie Williams, cuja apresentação não conseguiu ir além do previsível - mais vibrante foi o encontro de gerações de talentos da música clássica russa, entre os jovens Daniil Trifonov (um dos mais talentosos pianistas da atualidade) e Aida Garifullina (a soprano do momento, que já dividiu o palco com artistas renomados como Plácido Domingo e Andrea Bocelli) e o veterano violonista e maestro Yuri Bashmet, um dos mais celebrados e controvertidos artistas russos de sua geração: exímio virtuose, já recebeu críticas por posicionamentos políticos, como a assinatura de uma carta em favor da intervenção militar russa na Ucrânia. Até Putin abandonou sua fisionomia marmórea para sorrir.

*EDITOR DO 'CADERNO 2'

Estadão
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