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Olimpíada 2016

"Sou argentino, mas em quadra viro brasileiro", diz Magnano

Campeão olímpico com a Argentina há 12 anos, Rubén Magnano tentará repetir o feito pela Seleção Brasileira de basquete, no país que o acolheu em 2010 e virou sua segunda casa

15 jul 2016 - 08h13
(atualizado às 11h11)
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Rubén Magnano posa para as lentes do LANCE!
Rubén Magnano posa para as lentes do LANCE!
Foto: Eduardo Viana / Lance!

Brasileiros e argentinos possuem uma rivalidade histórica, especialmente no esporte. Porém, um hermano fez das terras tupiniquins a sua casa, e da Seleção Brasileira masculina de basquete o seu ganha-pão. Rubén Magnano, campeão olímpico em Atenas (GRE), em 2004, terá a chance de repetir o feito no Rio de Janeiro, em agosto, o que já faz parte de seus sonhos.

Desde 2010, o técnico comanda a equipe brasileira e, apesar de não "terem tirado seu passaporte argentino", como ele mesmo fez questão de ressaltar, se sente mais que em casa no Brasil.

Nesses seis anos, algumas coisas mudaram. O português é mais fluente, o bigode já não existe mais e o basquete brasileiro evoluiu. Já outras seguem iguais, como a fala mansa, a seriedade e a falta de algo que, quando solicitado pelo fotógrafo do LANCE!, foi difícil de acontecer:

- Me pedir para sorrir é um pouco mais difícil - brincou Magnano.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista com o treinador que tenta levar o basquete do país ao pódio nos Jogos Olímpicos do Rio:

Magnano atendeu o L! no hotel da Seleção (Foto: Eduardo Viana)

L! - Qual o balanço dos treinos com a Seleção Brasileira nesse ano?

Rubén Magnano - Acho que temos de fazer uma relação entre a quantidade de treinos em que estamos juntos, porque eles se apresentaram em períodos diferentes. Só no último dia 30 tivemos todos os jogadores juntos. Por esse tempo de trabalho, acho que estamos bem. Mas, é claro, sempre há coisas para melhorar. A intenção é chegar no dia 7 de agosto da melhor maneira possível. Sei que 100% será atingido apenas dentro da competição.

L! - Qual o peso de disputar uma Olimpíada em casa?

RM -

Se você pedir para eu escolher, sempre irei querer jogar em casa, por mais que haja uma pressão, que é algo que não gosto de falar. Prefiro receber o calor e apoio da torcida do que não o ter. Isso está entre nós, dentro da preparação. Precisamos começar a passar para eles que não fiquem em um "efeito bumerangue", sobretudo em momentos de adversidade, porque é um torneio curto e, seguramente, teremos muitas oscilações dentro do mesmo jogo. Então, não podemos perder o foco do que queremos e sermos competitivos. Precisamos, para isso, apagar tudo o que acontece externamente para produzirmos mais durante o jogo. Temos de trabalhar isso: transformar o desafio e privilégio de jogar em casa em um fator positivo.

L! - E isso é um desafio até para você, já que é a primeira competição grande que você joga em casa...

RM -

Por isso falo em privilégio. Poucos treinadores, atletas e torcedores no mundo têm a possibilidade de ver sua Seleção jogar uma Olimpíada em casa. Esse é o melhor momento possível.

L! - E, depois de tanto tempo, dá para chamar o Brasil de sua casa?

RM -

Eu tenho um passaporte argentino, ninguém me tirou ele, mas quando entro em quadra, viro brasileiro.

L! - Como você vê o nível do basquete nacional atualmente?

RM -

Nossa liga nacional está em crescimento. Então, quando falamos de nível de competição, isso também está em uma crescente. Não tenho dúvidas de que o NBB irá crescer. Infelizmente, ela não está afastada da realidade socioeconômica do país, e bate nisso. Mas não há dúvidas de que ela fará com que os brasileiros sigam crescendo. Analisando as melhores equipes e seleções do mundo, elas possuem ligas muito fortes, com muito investimento e competição interna. Então, dá para crer que, no futuro, a liga dará muitas coisas à Seleção.

L! - Em que patamar no mundo a Seleção Brasileira está?

RM -

Tenho de falar objetivamente e em um fator numérico. Hoje, estamos entre as oito melhores seleções do mundo. Ficamos em quinto nos Jogos de Londres (ING), em 2012, e sexto na Copa do Mundo de 2014. Ninguém nos tira o direito de falar isso. Estamos em nono no ranking da federação (Fiba) e entre as potências do basquete mundial. Não é pouca coisa. Acredito muito na posição que estamos, mas tenho a necessidade de acreditar que podemos dar um pulo a mais. Nossos objetivos são reais e sabemos que temos um torneio muito duro pela frente, mas dá para acreditar.

L! - Como você vê o grupo olímpico? Com quem o Brasil briga?

RM -

Chutar uma posição é muito difícil. Falamos do campeão (Espanha) e vice (Lituânia) europeus. Um nível muito grande. Mas, por falar em posições, é claro que queria ficar em primeiro, o que não é impossível. Podemos fugir de um cruzamento com os Estados Unidos que, apesar dos desfalques, inspiram cuidados e estão um pouco mais à frente que os outros. Ficar em primeiro, segundo ou terceiro será difícil, mas queremos repetir o que fizemos na Copa do Mundo, terminando em primeiro no grupo e com um bom basquete.

L! - Dá para sonhar com um pódio olímpico?

RM -

Com certeza. Não podemos deixar isso. O fato é: como alimentar esse sonho? Sonhar é permitido a todos. Falo desde o começo que temos de ganhar o primeiro jogo (Lituânia). Mas podemos competir. A nossa atitude vai dizer se nosso sonho está em um bom caminho.

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L! - Essa é a melhor geração do basquete brasileiro?

RM -

Precisamos ser cautelosos, porque há gerações que ganharam muito. Coisas pesadas. Medalhas olímpicas. Temos de respeitar e não esquecer a história, porque são pessoas que conquistaram coisas a seu país. Espero que estejamos a caminho disso.

Nota da redação: Em 1948, 1960 e 1964, o Brasil ficou com a medalha de bronze olímpica.

L! - E se o time levar uma medalha olímpica com essa geração?

RM -

Aí sim, com certeza. Até pela visualização e o que esses caras já viveram, atuando na NBA, na Europa... Seriam merecedores disso.

L! - Como você vê o futuro da Seleção depois da Olimpíada?

RM - Temos jogadores jovens com um potencial muito grande. Mas a verdade é que desde meu começo na Seleção quis trabalhar com esses jovens, convidando-os para treinos. Mas a análise final é que se o atleta não tem vontade de modificar sua conduta para ser um jogador de Seleção, não adiantam convites, já que eles ficam 11 meses em outra sintonia. À parte disso, hoje não temos em nossa convocação jogadores jovens, mas por conta de pedidos de dispensa, e não falta de vontade nossa. São escolhas deles, que viraram as costas para a Seleção. Contra isso não posso lutar.

L! - Essas dispensas dos jogadores da NBA te magoaram, não é?

RM -

Sim, muito. Até porque eles tiveram muito da Seleção. Atletas que, no momento em que precisamos, nos viraram as costas. Fico triste com isso. Mas não posso ficar pensando neles, porque os que realmente valem, estão aqui com a gente. Os que não estão (bate nas mãos), já foram.

NR: Cristiano Felício, do Chicago Bulls, e Lucas Bebê e Bruno Caboclo, do Toronto Raptors, pediram dispensa da Seleção para a Rio-2016.

L! - Antes, dizíamos que os técnicos brasileiros não tinham nível para assumir a Seleção. E hoje?

RM -

Não é uma curiosidade que três das quatro equipes que jogaram as finais da Liga das Américas eram brasileiras, e comandadas por pessoas novas. Esse é o papel da liga nacional, de dar crescimento não só a jogadores, mas treinadores e árbitros. À medida que a competição melhora, eles seguem isso. Tudo está equilibrado. Quem melhor se prepara e se foca no trabalho, terá mais sucesso. Aqui existem técnicos muito preocupados com o desenvolvimento do basquete.

NR: O Bauru, de Demétrius (42 anos), foi vice na Liga das Américas desse ano, com o Mogi das Cruzes, de Danilo Padovani (37 anos) em terceiro, e o Flamengo, de José Neto (45 anos), em quarto.

L! - Faltou algo em seu trabalho na Seleção Brasileira?

RM -

Vou resumir com uma palavra muito curta: sim, faltou.

L! - E você precisa de mais tempo para fazer o que faltou?

RM -

A resposta está no que disse anteriormente. O que faltou foi por conta de decisões pessoais dos atletas, comprometimento. Mas isso se educa.

L! - O que você quer fazer na Seleção?

RM -

Precisamos urgentemente montar duas Seleções permanentes, no mínimo. Vejo muita vontade da liga de dar espaço ao desenvolvimento e aproveitar essa onda. Nosso basquete precisa disso. Ter 30 atletas de idade não tão avançada, e dar tudo que eles precisam para que, em quatro ou cinco anos, tenhamos jogadores com potencial de Seleção adulta ou de nível importante na liga nacional ou fora.

L! - Como você analisa os brasileiros na NBA atualmente?

RM -

O Leandrinho está em casa, porque está no Phoenix Suns e é bem acolhido lá. E parabéns por um contrato de dois anos, isso não é pouca coisa. O Nenê terá um desafio muito grande como jogador de basquete, de mostrar tudo o que ele vale nessa temporada no Houston Rockets. E ele, pelo que vejo nos treinos da Seleção, terá uma liga muito boa. O Marcelinho Huertas conseguiu renovar com o Los Angeles Lakers, que é o lugar que ele gosta. Espero que jogue. Quanto aos outros garotos que estão lá, espero que atuem da melhor maneira, porque, indiretamente, isso faz bem à visibilidade do basquete brasileiro. O Anderson Varejão ainda não sabemos para onde vai, espero que ele possa encontrar um clube prontamente.

NR: Na noite de ontem, Anderson Varejão renovou o contrato com o Golden State Warriors.

L! - A falta de um Dream Team dos Estados Unidos na Olimpíada diminuem as chances de ouro?

RM -

Não posso dizer que eles são 100% imbatíveis, porque vivi outra história. Mas se eles viessem para cá com todos os nomes que queriam, seriam praticamente invencíveis. Hoje por hoje, tampouco são fracos, mas a porcentagem do ouro diminui. Acho que eles são os primeiros e maiores candidatos ao ouro.

NR: Na Olimpíada de Atenas, a Argentina de Magnano eliminou os EUA na semifinal.

L! - Qual foi a sua maior alegria na Seleção Brasileira?

RM -

Acho que o que eu vivi no Pré-Olímpico de Mar del Plata (ARG) foi um dos momentos mais alegres de toda a minha vida e carreira.

NR: O Brasil foi vice no torneio e se classificou à Olimpíada pela primeira vez desde 1996.

L! - E qual a sua maior decepção à frente da Seleção?

RM -

O "não" de alguns jogadores na Copa América que classificava para a Copa do Mundo. Foi uma decepção muito grande. Sobretudo aos que estavam lá tentando ajudar o Brasil.

NR: Em 2013, os jogadores da NBA pediram dispensa da Seleção, que não venceu nenhum jogo e precisou de um convite para ir à Copa.

L! - Entre os jogadores que você treinou, você conseguiria montar um quinteto ideal?

RM -

Não. Seria muito egoísta. Não gosto muito disso. Mas, se você me perguntar quem foi o melhor que treinei, te falo: foi o Manu Ginóbili.

L! - Na última vez que nos falamos, você disse que o Brasil alcançaria algo extraordinário na Olimpíada. É isso mesmo?

RM -

Essa coisa extraordinária tem a ver com o que falamos: alinhar o sonho com nossa atitude e trabalho. Não sou um cara que vende mentiras. Tudo que falei é baseado em coisas reais. Mas temos de sonhar, ainda que um pouco. Não vou vender que levaremos o ouro, porque estaria mentindo. O que digo é que nossa perspectiva é boa e nossa preparação coerente. Vender nosso trabalho, sim. Nosso jeito de jogar, sim. Espero que dê certo.

L! - Você sonha com os jogos?

RM -

Todas as noites. Há seis meses eu sonho com todos que vamos enfrentar daqui a pouco (risos).

L! - E com a final olímpica?

RM -

Ainda não. Mas sonho com as imagens de pódio, que me fazem sentir muito bem. Até porque já vivi essa situação, e quero repetir aqui, porque sei que nosso basquete precisa desse impacto. Sei o quanto isso vai representar ao futuro: para os jovens, as crianças, treinadores, dirigentes, clubes... Para terem força.

O RETROSPECTO DE MAGNANO

NO BRASIL

Copa América

A primeira grande conquista de Magnano na Seleção foi a prata na Copa América de 2011, na Argentina. O time perdeu para os donos da casa na final, mas se classificou à Olimpíada pela primeira vez desde 1996.

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Copa do Mundo

Pela Seleção, o argentino disputou os torneios em 2010 (na Turquia) e 2014 (Espanha), caindo nas oitavas no primeiro e nas quartas no segundo.

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Olimpíada

Em Londres (ING), em 2012, o time caiu nas quartas de final diante da Argentina.

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Decepções

Nas Copas Américas de 2013 (classificatória à Copa) e 2015, o Brasil caiu na primeira fase, vencendo um de oito jogos.

NA ARGENTINA

Geração de ouro

Rubén Magnano comandou a melhor geração do basquete argentino, que tinha, entre outros nomes, Manu Ginóbili, Andrés Nocioni, Luis Scola, Fabricio Oberto e Carlos Delfino na Seleção.

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Na Olimpíada

Em Atenas (GRE), em 2004, Magnano levou o time ao ouro, ao derrotar os Estados Unidos na semifinal (89 a 81) e a Itália na decisão (84 a 69).

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Na Copa do Mundo

Na Copa do Mundo de Indianápolis (EUA), em 2002, o time ficou com o vice-campeonato, caindo para a Iugoslávia na decisão (84 a 77).

Na Copa América de 2011, o Brasil ficou com a prata
Na Copa América de 2011, o Brasil ficou com a prata
Foto: FIBA AMERICAS) / Lance!
Magnano está à frente da Seleção desde 2010
Magnano está à frente da Seleção desde 2010
Foto: FIBA Americas / Lance!
Nas duas últimas Copa América, o Brasil venceu só um jogo
Nas duas últimas Copa América, o Brasil venceu só um jogo
Foto: FIBA Americas / Lance!
Magnano comanda a Seleção desde 2010
Magnano comanda a Seleção desde 2010
Foto: Divulgação/Thiago Barros / Lance!
O argentino caiu nas quartas na Olimpíada e na Copa
O argentino caiu nas quartas na Olimpíada e na Copa
Foto: FIBA Americas / Lance!
O técnico foi campeão Pan-Americano em 2015
O técnico foi campeão Pan-Americano em 2015
Foto: Divulgação/Imago7 / Lance!
Lance!
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