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Luiz Gomes: 'Falta de inspiração... Acredite, a temporada de 2018 da F-1 já está rolando'

A Fórmula 1 era algo enraizado no cotidiano do brasileiro. Já nos dias de hoje... Faça um exercício, cite os nomes de cinco pilotos que estão disputando a categoria

22 abr 2018 - 08h06
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Se você tem mais de 50 anos com certeza irá se lembrar. De 15 em 15 dias, domingos de manhã, todos tínhamos um compromisso quase que obrigatório: assistir na TV as vitórias de Emerson Fittipaldi nas corridas de Formula 1 pelo mundo. Eu vivia em Juiz de Fora, no interior de Minas. Eram os primórdios da televisão colorida no Brasil, pouca gente tinha um aparelho em casa. Com meus pais e meu irmão, nos reuníamos num clube, que se chamava Dom Pedro II, num imenso salão de festas onde algumas centenas de associados se espremiam diante de uma única TV Philco a cores. Daquelas que ainda tinham seletor de canal rotativo - os sistemas digitais de hoje em dia eram quase que uma obra de ficção científica. Faltar luz na cidade ou o sinal cair no meio da transmissão eram coisas comuns.

Hamilton com sua Mercedes na temporada de 2018 da F1 (foto: AFP)
Hamilton com sua Mercedes na temporada de 2018 da F1 (foto: AFP)
Foto: Lance!

Se a tecnologia era precária, vibração tinha de sobra. Cada largada era como o apito inicial de um jogo decisivo, cada ultrapassagem daquela Lotus preta com frisos dourados dos cigarros John Player Special era comemorada como um gol de placa. Eu me lembro de ver gente - as senhoras especialmente - chorando de emoção no bicampeonato conquistado por Emerson nas pistas da Europa. Lágrimas como as que escorreram por milhares de faces anos antes quando Pelé, Tostão, Rivellino, Jairzinho, Gérson e o capita Carlos Alberto levantaram no México o caneco do Tri da Jules Rimet.

A Fórmula 1 era algo enraizado no cotidiano do brasileiro. Não, por razões óbvias, como um jogo de futebol. Não se saia por aí apostando corridas pelas ruas, avenidas e estradas Brasil afora. Até tinha alguns malucos que faziam isso, como ainda têm os que se metem irresponsavelmente a fazer pegas ou rachas, dependendo do estado em que você está, que não raramente terminam em tragédia. Mas, numa corrida do pátio do recreio até a sala de aula na escola, quem chegasse na frente se auto denominava Emeeeeeeerson Fittipaldi! E crianças faziam corridas de carrinho - seja de rolimã nas ladeiras, seja com as miniaturas Matcbox no tapete de casa -, assumindo o papel do nosso campeão e de rivais como Jackie Stewart, Clay Regazzoni, François Cevert, Peter Revson, Niki Lauda e outras feras de então.

Desde a geração Fittipaldi - o irmão Wilsinho e José Carlos Pace, que pouca gente se lembra, mas dá nome ao autódromo de Interlagos e era uma jovem promessa morta precocemente num acidente aéreo - passaram-se 20 anos até que veio a era de Nelson Piquet e Ayrton Senna. Novamente, acordar no domingo de manhã para assistir à F1 virou um hábito nacional. Um hábito que durou até aquele fatídico 1º de maio de 1994 quando a Willians azul e branco se chocou com a mureta da curva Tamburello.

O país parou. Como se cada brasileiro tivesse sido atingido por aquela peça da roda que varou o capacete de Senna. Foram dias entre a morte e o enterro do campeão que levou multidões às ruas para reverenciar o ídolo. A Formula 1 nunca mais voltou a ser a mesma por aqui. Rubinho e Felipe Massa, apesar do talento indiscutível e das carreiras de sucesso, jamais chegaram a empolgar além daqueles que, como se dizia antigamente, eram "amantes da velocidade". Foram anos em que, pouco a pouco, o esporte que chegou a ser a segunda paixão nacional, foi perdendo lugar no coração e na mente do torcedor.

Acredite, mas a temporada 2018 já está rolando. E, certamente, você não parou para assistir a nenhuma corrida. Não sabe sequer quem está vencendo. Faça um exercício, cite os nomes de cinco pilotos. Lembre de alguém além de Lewis Hamilton. E enumere as equipes além da Ferrari, da Willians e da Mercedes. Você não será uma exceção se não conseguir. Motivos não faltam. Esta é a primeira vez desde 1970 que não há um piloto brazuca nos grids de largada. E, além disso, à caça de um dinheiro novo, a F1 se deslocou par ao outro lado do mundo, chegando aqui em fusos horários indigestos até para o mais persistente dos fãs.

Muito se diz que brasileiro vive de resultados. E é verdade. Mas isso não explica tudo. O brasileiro precisa de campeões, mas se alimenta muito mais do carisma alheio. Do carisma de um Fittipaldi, de um Senna, de um Guga. Robert Scheidt foi bicampeão olímpico e 15 vezes campeão mundial de iatismo - e nem por isso a vela caiu no gosto do público. Mas a superação de Lars Grael quando perdeu a perna virou um símbolo de brasilidade. Não bastará um dia surgir um novo brasileiro campeão de fórmula 1. Só alguém que, além de vencer seja capaz de inspirar, poderá fazer outra vez o esporte fisgar o interesse do público tupiniquim.

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