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Iranduba cativa público e é peça-chave para Arena da Amazônia

Clube amazonense contraria crença de que "futebol feminino não atrai público" e é a principal força para manter viva a Arena da Amazônia, construída para a Copa de 2014

25 out 2018 - 06h03
(atualizado às 07h04)
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É provável que, em algum momento da sua vida, você já tenha ouvido a seguinte frase: "futebol feminino não atrai público". Mas será que a afirmação é completamente verídica? E se houvesse um clube, com foco nas mulheres, que carrega milhares de torcedores consigo e é a principal força para manter vivo um estádio de Copa do Mundo? Pois ele existe - e está aqui no Brasil.

Trata-se do Iranduba, também conhecido como Hulk da Amazônia, uma das principais equipes no cenário do futebol feminino tupiniquim. Criado em 2011, o clube acumula recordes de público na Arena da Amazônia e faz frente à médias de grandes clubes da Série A do Brasileirão. O LANCE! buscou entender o fenômeno e suas origens. Confira abaixo!

Iranduba é criado em período instável no futebol do Amazonas

Em 2011, o Iranduba foi fundado na cidade homônima, localizada no estado do Amazonas. À época, o município era o único local do estado que possuía uma arena ativa - estádio Tenente Álvaro Maranhão - possibilitando a criação de uma equipe de futebol; a Arena da Amazônia estava sendo construída para a Copa do Mundo.

O projeto original do Hulk da Amazônia incluía times de homens e mulheres. Entretanto, com o sucesso do plantel feminino, a cúpula do Iranduba optou por interromper o projeto masculino - este retornou em 2018, junto com o infantil e o juvenil, e inclusive foi campeão da Série B Amazonense.

Com a inauguração da Arena da Amazônia, toda a estrutura operacional do Iranduba passou à capital do estado. O clube manda todos os seus jogos em Manaus, onde as atletas vivem e estudam. A sede física do Hulk segue no município de Iranduba, a cerca de 39 km de distância da capital.

Clube é de Iranduba, mas cotidiano da equipe é todo em Manaus (Foto: Ismael Monteiro)

Arena da Amazônia foi construída para Copa do Mundo de 2014

As obras de construção da Arena da Amazônia começaram em outubro de 2010 e se estenderam até março de 2014. O estádio, que custou cerca de R$623 milhões, possui capacidade para 44 mil pessoas e foi inaugurado no dia 9 de março de 2014. Na ocasião, Nacional e Remo empataram por 2 a 2 na Copa Verde diante de 20 mil torcedores.

Futebol feminino domina público na Arena da Amazônia

Durante a preparação para a Copa do Mundo de 2014, uma das principais questões era a construção de estádios em praças sem tanta visibilidade no futebol - é o caso da Arena da Amazônia.

O Amazonas é um dos estados brasileiros que não apresenta um quadro forte no futebol masculino. Ao analisar o borderô financeiro da final do Amazonense 2018, por exemplo, é possível ver o registro de público presente com 780 pessoas (distribuídas em um estádio com 44 mil assentos).

E se os homens não fazem sucesso dentre o público local, as mulheres dominam. O Iranduba tornou-se um fenômeno de público por uma série de fatores: investimento, jogadoras campeãs nacionais e até mesmo uma carência de ídolos no masculino. Ao L!, Lauro Tentardini, diretor executivo do clube amazonense, analisou o cenário por trás do sucesso do Hulk.

- Sempre digo que brasileiro não gosta de esporte, ele gosta do que ganha, do que vence. O Senna na Fórmula 1, por exemplo, batia audiências de novela das 20h. O Guga também: nós, brasileiros, nunca acompanhamos tênis. E na década de 1990 e nos anos 2000, parávamos para ver o Guga. Acho que esse é o diferencial do Iranduba. Manaus está com o masculino de uma forma fraca, não consegue sair da Série D. Quando chegamos com um projeto ousado das meninas, trouxe 15 que haviam sido campeãs da Copa do Brasil comigo no Kindermann, em 2015, começamos a vencer. O público, carente de ídolos, começou a comparecer - afirmou.

E começou a comparecer em peso! O primeiro recorde de público do Iranduba na Arena da Amazônia foi de 17 mil pessoas, na final da Liga Nacional feminina sub-20 contra o Adeco (SP), ainda em 2016. Anteriormente, o Hulk já tinha registrado público de 8 mil em partida do grupo adulto contra o Corinthians. Os recordes no profissional começaram no Brasileiro Feminino A1 de 2017. nas quartas de final, o empate por 1 a 1 com o Flamengo - que garantiu o avanço do Iranduba no torneio - levou 15 mil pessoas à Arena da Amazônia. Já nas semifinais, diante do Santos, uma nova marca histórica: 25 mil pessoas. A participação amazonense terminou nesta fase; as Sereias da Vila, posteriormente, garantiram o título nacional.

A terceira partida com maior público na Arena da Amazônia em 2017 também foi impulsionado por mulheres. Na ocasião, um amistoso da Seleção Brasileira Feminina levou 16.198 pessoas à praça esportiva, que viu a Canarinho triunfar sobre as adversárias sul-americanas por 6 a 0.

25 mil pessoas foram à Arena da Amazônia assistir a Iranduba x Santos em 2017 (Foto: Reprodução/Facebook)

Até os dias de hoje, o recorde de público da Arena da Amazônia pertence a um clássico carioca: Vasco x Flamengo em 2016, partida que esgotou todos os 44.419 ingressos da praça esportiva. O triênio 2014-2016 concentra o maior número de torcedores no estádio, que recebeu confrontos da Copa do Mundo, Olimpíadas, Copa do Brasil e amistosos da Seleção Brasileira Olímpica.

O fenômeno Iranduba fez frente, até mesmo, a clubes da Série A do Brasileiro. A torcida no duelo contra o Santos é superior, por exemplo, a 17 médias de público do torneio nacional em 2017 - apenas Corinthians (35.819), Palmeiras (33.832) e Flamengo (25.664) terminaram a disputa com números gerais maiores que 25.371 pessoas.

- É uma sensação incrível (casa cheia), especialmente pra mim, que acompanho o futebol feminino e trabalho na área desde 2011. Melhor que isso, só ter nossos nomes gritados pela torcida. Acho que é raro a torcida gritar o nome de um dirigente como gritaram o meu na final do campeonato estadual na última sexta-feira (o Iranduba foi campeão Amazonense ao vencer o 3B por 2 a 0). É incrível - confirmou Lauro Tentardini.

Elefante branco?

A alcunha de 'elefante branco' não cabe na Arena da Amazônia, ao menos na opinião de Tentardini. O executivo cita alguns motivos para que o estádio seja viável, mas essas razões não passam necessariamente pelo futebol. Ele vê o Iranduba como principal força no esporte, mas acredita que a sustentabilidade financeira também se deve a eventos culturais.

- Eu acho que a Arena da Amazônia não pode ser chamada de elefante branco, porque ela é viável. Tem bazar que acontece lá, tem shows, tem eventos esportivos. É claro que o Iranduba ajuda, disso eu não tenho dúvida. Jogos da Série A, quando a CBF proibiu (a venda de mando de campo) no ano passado, acabaram atrapalhando um pouco. Esse ano liberaram, mas não conseguiram trazer jogos para Manaus. Em 2016, tínhamos muitos jogos do Brasileirão, o que ajudava bastante economicamente. O amazonense gosta muito de futebol - opinou o dirigente.

Entretanto, em 2017, mesmo ano em que os recordes do Iranduba foram registrados, a presença em jogos masculinos é baixíssima. Somados, os públicos de todos os 14 jogos com equipes de homens totalizam 11.158 pessoas presentes - menos que a metade da marca histórica do Hulk da Amazônia diante do Santos.

Futebol feminino também traz recordes ao Santos

E não é só na Arena da Amazônia que o público mostra seu interesse pelo futebol feminino. Em 2017, as Sereias da Vila foram campeãs do Brasileiro A1 sobre o Corinthians e viram a torcida fazer história nas arquibancadas: maior público da Vila Belmiro no ano, com cerca de 15 mil presentes. Antes da final feminina, a melhor marca do estádio era de 13.132 torcedores, em partida do time masculino santista diante do The Strongest, na fase de grupos da Libertadores.

O panorama favorável às mulheres na Vila se mantém em 2018 - ao menos, até o momento. Na final do Paulista feminino, 13.867 pessoas foram à praça assistir ao duelo diante das rivais do Corinthians. O maior público masculino foi de 13.488 no clássico contra o São Paulo, na 25ª rodada do Brasileiro.

As entradas aos jogos femininos do Santos são gratuitas, mas já mostram um enorme interesse da torcida do Peixe em acompanhar a modalidade.

Nas Olimpíadas Rio-2016, foi registrado o maior público da história do futebol feminino no Brasil. 70.454 pessoas foram ao Maracanã para assistir ao duelo entre a Seleção Brasileira e Suécia na semifinal - na ocasião, o empate por 0 a 0 levou a decisão aos pênaltis. Melhor para as europeias, que venceram por 4 a 3 nas cobranças - a heroína foi a goleira Hedvig Lindah, que pegou as cobranças de Cristiane e Andressinha.

Brasil foi eliminado pela Suécia em partida recordista de público do futebol feminino (Foto: Paulo Sergio/Lancepress!)

Manaus se estabelece como polo do futebol feminino

Iranduba é uma das maiores forças no cenário do futebol feminino no Brasil (Foto: Divulgação/Ismael Monteiro)
Iranduba é uma das maiores forças no cenário do futebol feminino no Brasil (Foto: Divulgação/Ismael Monteiro)
Foto: Lance!

Tamanha influência do Iranduba e da capital amazonense no futebol feminino trouxeram a Libertadores de 2018 da modalidade para Manaus. A disputa continental ocorrerá entre os dias 4 e 18 de novembro. Além da Arena da Amazônia, o Estádio da Colina e o Estádio Carlos Zamith serão as sedes do torneio.

12 equipes competirão pela honra sul-americana, com um representante por país. O Brasil, por ser sede da Libertadores, é o único com mais de um clube no campeonato: as três equipes tupiniquins serão Iranduba, Audax e Santos.

- Isso mostra não só uma influência do Iranduba no futebol feminino da região, como digo até no cenário brasileiro. Vejo uma importância muito grande de Manaus como capital do futebol feminino do Brasil. Os públicos da Seleção Brasileira aqui sempre foram muito bons, especialmente alavancados pelo Iranduba. Manaus, hoje, é fundamental - finalizou Tentardini.

Dificuldades no patrocínio

Independente do status da equipe - se é pequena ou grande, famosa ou não -, um panorama se mostra recorrente no futebol feminino: a dificuldade de angariar recursos, especialmente patrocínios. Lauro ainda reivindicou por um melhor posicionamento de emissoras de televisão no que diz respeito à transmissão de torneios da modalidade.

- Todo time feminino apresenta dificuldade para conseguir patrocínios. Esse ano, não tivemos transmissão do Campeonato Brasileiro (A1), o que atrapalhou bastante. As emissoras de televisão às vezes falam que não é dado apoio ao futebol feminino, mas elas também poderiam colocá-lo em suas grades (de programação), como foi feito nos anos 90 - disse o executivo do Hulk.

E o Iranduba? Mesmo a potência amazonense passa por percalços. Contudo, há uma força extra no fluxo de caixa do clube - as receitas de jogos.

- Temos dificuldade, mas conseguimos nos sustentar com rendas de jogos, apoios que temos, também temos bolsas de faculdade para as atletas. O Iranduba consegue ser um time viável financeiramente porque tem uma gestão responsável. (O que motiva a dificuldade) é o fato de ainda haver pouca exposição do futebol feminino na mídia brasileira. Mas nós do Iranduba somos o único time com patrocínio master, que é a Transire, que nos patrocina desde outubro de 2017, e isso é muito importante para nós - finalizou.

* Sob a supervisão de Yuri Hernandes

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