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Final da 'Copa' será neste sábado... em Londres e não vinculada à Fifa

Mundial da Conifa, a Copa do Mundo alternativa, conta com 16 equipes dividas entre micronações e países independentes. Torneio acontece entre 31 de maio e 9 de junho

8 jun 2018 - 07h06
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Moscou, julho de 2018. Quando o árbitro apitar pela última vez na Copa do Mundo da Fifa, uma das 32 seleções participantes levantará o troféu e dirá que é campeã mundial. Mas antes disso, a mais de 2.800 km de distância, em Londres, outro país poderá bater no peito e dizer que também conquistou o mundo. Chipre do Norte e Transcarpátia se enfrentam neste sábado, na decisão do Mundial da Conifa, a versão alternativa do maior torneio de seleções do mundo.

Não há cobertura dos principais veículos de mídia, prêmios milionários ou grandes patrocinadores, mas a Copa da Mundo da Conifa (Confederação de Futebol de Associações Independentes) terá sua terceira edição decidida neste 9 de junho - o início aconteceu em 31 de maio. O torneio conta com 16 representantes, divididos entre micronações, países autônomos, e povos independentes que foram rejeitados pela Fifa.

- Nossa Copa do Mundo de futebol só fica maior e maior. Depois do torneio inaugural ser realizado na Suécia em 2014, alcançamos um novo patamar em Abecásia, no ano passado, com o evento recebendo cobertura da mídia de todo continente habitável. Estamos confiantes que 2018 seja nosso melhor torneio, e Londres será a sede perfeita para isso - disse Per-Anders Blind, presidente da Conifa, em entrevista ao site Goal.

Criada em 2013, a entidade conta com 48 membros e representa mais de 300 milhões de pessoas ao redor do mundo. Diferentemente dos bilionários estádios reformados para o Mundial da Rússia, a competição acontece em locais acanhados de Londres. O maior palco é o Queen Elizabeth II, com capacidade para 5.000 torcedores, cedido pelo Enfield Town, da oitava divisão inglesa. Os ingressos custam £ 11 (R$ 57), mas não chegam perto de esgotar.

O lema da Conifa diz que a finalidade do evento é "tornar visíveis minorias isoladas, pessoas sem admissões, refugiados, comunidades deslocadas ou apátridas que querem manter viva uma identidade coletiva". A renda para organização vem de um casa de apostas irlandesa, que abriu as portas para investir no torneio. Neste sábado, o mundo terá um novo campeão mundial, longe dos holofotes, mas com o sentimento de independência.

Abecásia é o atual campeão do torneio (Foto: Divulgação/Conifa)

Veto da Fifa, luta por igualdade e problema com empresas: a história da Conifa

Para entender a Conifa, é preciso conhecer o sistema de filiação da Fifa. Existe uma série de protocolos e pré-requisitos exigidos pela entidade para que uma nação tente a admissão. Após o envio dos documentos, um Comitê vota pela aprovação, ou não. Caso o direito seja concedido, aquele país poderá disputar as eliminatórias da Copa do Mundo, ter sua liga nacional reconhecida e receber apoio financeiro da instituição que comanda o futebol.

O grande problema para as micronações e povos autônomos é que as questões diplomáticas e governamentais que envolvem os processos de independência tornam a aprovação pelo Comitê da Fifa extremamente difícil. Com tantas pequenas nações ignoradas pela entidade, criou-se a Conifa, com a intenção de dar espaço para esses povos também disputem seus torneios.

- Existem muitas pessoas cujas identidades não são representadas pela estrutura atual da Fifa. Se você é catalão, joga pela Espanha, por exemplo; se é do Tibete, joga pela China, mesmo estando em outra nação. O sistema simplesmente não funciona para muitas pessoas, e é este o porquê da existência da Conifa ser necessária - conta Paul Watson, diretor da Conifa, ao site britânico These Football Times.

É importante deixar claro: já existiam torneios entre países autônomos antes da Conifa. A entidade foi fundada para regulamentar e organizar uma Copa do Mundo entre micronações. Criada em 2013 e com sede na Suécia, suas regras são menos rigorosas que a Fifa - o que permite a filiação dos "ignorados". Apesar do seu viés, a postura da entidade é de imparcialidade política, apesar de seus participantes estarem em constantes problemas diplomáticos.

- Estamos aqui para celebrar esportes e pessoas, a política é para os outros. As empresas têm medo de financiar e patrocinar um evento como este pois têm medo de ofender países como a China, por exemplo - afirma Paul Watson, lembrando do caso envolvendo o pedido de exclusão do Tibete pelos chineses:

- Obviamente recusamos e decidimos não obedecer. Se não tivéssemos os nossos princípios, que seriamos? - afirmou o diretor ao Independent.

O Mundial da Conifa está em sua terceira edição. A primeira foi realizada em 2014, na Lapônia, e teve o Condado de Nice como campeão. Em 2016, a sede mudou para a Abecásia, e os donos da casa saíram com o título. Em 2018, Chipre do Norte e Transcarpátia se enfrentam em Londres para saber quem será o novo campeão.

Ídolo da MLS, marcador de Kaká e adversário do Real: as estrelas esquecidas

Quem decidir assistir aos jogos da Conifa, não verá nomes como Lionel Messi, Cristiano Ronaldo ou Neymar em campo, mas encontrará algumas "estrelas esquecidas" que passaram - sem muito brilho - por ligas profissionais. É o caso do norte-americano James Riley, que atuou por 11 temporadas na Major League Soccer (MLS) e deixou a aposentadoria de lado para jogar pela Conifa.

Aos 35 anos, o zagueiro é ídolo do Seattle Sounders, equipe onde conquistou três Copas dos Estados Unidos. Três anos após se retirar dos gramados, foi convidado por um amigo para defender a equipe Cascadia - união de províncias independentes canadenses e norte-americanas - no torneio. Aceitou o desafio e foi escolhido para ser o capitão.

- Um amigo envolvido com o torneio me falou sobre a oportunidade e pensou que eu ficaria intrigado, e eu certamente estava. Tive conversas com o Cascadia e o timing pareceu certo. Eu acho que a missão da Conifa é fantástica, unindo culturas e países através do jogo. A chance de representar Cascadia é algo realmente especial - disse Riley à Sky Sports.

O antagonismo entre Fifa e Conifa está presente entre as nações, mas nem tanto entre os jogadores. Poucos podem dizer que disputaram a Copa do Mundo de ambas as entidades, caso do japonês naturalizado norte-coreano Ahn Young-hak, que defende a equipe dos Coreanos Unidos do Japão - grupo de coreanos que resistiu em permanecer no Japão após o exílio diplomático causado pela Segunda Guerra Mundial.

Em 2010, ele tinha 31 anos e defendeu a Coreia do Norte na Copa do Mundo da África do Sul. Volante de origem, chamou atenção em sua atuação contra o Brasil, onde ficou responsável pela marcação de Kaká e foi um dos principais responsáveis pela atuação ruim do brasileiro naquela partida. O país acabou eliminado na primeira fase do torneio.

Outra "estrela esquecida" é Anri Khagush, que foi campeão da Conifa pela Abecásia em 2016. Quando tinha 31 anos, ele atuou na Liga dos Campeões de 2008 pelo BATE Borisov e teve pela frente o Real Madrid. Ainda não era a equipe de Cristiano Ronaldo, mas o zagueiro não conseguiu parar o ataque liderado por Robben, e acabou derrotado por 2 a 0 no Santiago Bernabeu.

Conheça as 16 micronações que disputam o Mundial Conifa em 2018:

Barawa: é uma cidade portuária localizada na costa sudeste da Somália, banhada pelo Oceano Índico. Está situada entre as cidades de Mogadíscio e Kismayo. O zagueiro Ode Alfa e o atacante Kingsley Eshun, do Queens Park Rangers, além do volante Jesse Debrah de Milwall FC, são os jogadores mais importantes no elenco.

Ellan Vannin: região localizada no Mar da Irlanda. A micronação liderou sua independência contra o Reino Unido e a União Européia. No entanto, sua representação e defesa internacional ainda são de responsabilidades do governo britânico. O zagueiro Seamus Sharkey, de 28 anos, é o mais famoso por atuar na primeira divisão da Irlanda.

Tamil Eelam: representa a comunidade nativa do nordeste do Sri Lanka. É formada por 900 mil exilados da Guerra Civil de 1983, que reprimiu boa parte da cultura do país. A maioria dos jogadores atua na Suíça, Inglaterra ou Canadá, onde vivem exilados com suas famílias.

Cascadia: representa a região formada pela união da província canadense da Colúmbia Britânica e dos estados americanos de Washington e Oregon. A criação foi oficializada após a separação dos seus governos federais. Clubes como Portland Timbers, Vancouver Whitecaps e Seattle Sounders, da MLS, têm sedes em seus limites.

Abecásia: é um estado independente localizado na costa leste do Mar Negro que autoproclamou soberania em 1990, após o fim da guerra civil contra a Geórgia. Somente Rússia, Nicarágua, Venezuela, Nauru, e Síria consideram a micronação como um país.

Chipre do Norte: ocupa o terço norte da ilha de Chipre. A divisão aconteceu quando a junta militar grega depôs o governo do Chipre em 1974. Com a invasão turca no território, nasceu o movimento de independência. A maior parte dos atletas competem na liga nacional cipriana.

Transcarpátia: representa a minoria húngara residente na Ucrânia. Ao contrário de outras áreas que estão em conflito na região, a comunidade que faz divisa entre Hungria e Ucrânia coexiste em paz. O principal jogador é o goleiro Szergej Petranics, de 46 anos, o mais velho a atuar no torneio.

Tibete: região conhecida como o 'teto do mundo', com 4.900 metros de altitude. Está localizado ao norte da Cordilheira do Himalaia, próximo ao Monte Everest. Não existem campos de futebol na região, com isso os jogadores treinam no Nepal. A China considera o Tibete como parte de seu país, e não como uma nação independente.

Padania: é a seleção mais forte do torneio. Foi tricampeã da Copa do Mundo de seleções independentes antes da criação da Conifa. Seu principal jogador é Marius Stankevicius, que teve passagens por Sevilla, Valencia e Lazio. Está localizada ao norte da Itália e é formado pela união de províncias da região.

País Székely: é uma área da Romênia, mas habitada principalmente por húngaros. O movimento de independência surgiu após a Primeira Guerra Mundial, quando os habitantes votaram por conceber uma nação independente contra o governo romeno. Maioria dos atletas atua em torneios de segunda e terceira divisão do campeonato húngaro.

Tuvalu: o único país reconhecido do torneio. É uma nação filiada às Nações Unidas, com região de 26 quilômetros quadrados e onze mil habitantes. Conhecida por ser a menor população do mundo. Está ancorada no arquipélago da Polinésia e é filiada a Confederação de Futebol da Oceania.

Matabeleland: está na região pertencente ao Zimbabwe, na África. O país vive uma guerra sangrenta por sua independência, onde enfrenta o ditador Robert Mugabe. Estima-se que mais de vinte mil pessoas já morreram nos confrontos e por esse motiva a Conifa não divulga a lista de convocados da micronação.

Panjabe: região presente no norte da Índia e ao leste do Paquistão. Tem população estimada de 125 milhões de pessoas e foi vice-campeã da última edição da Conifa - perdeu para a Abecásia nos pênaltis. Seus jogadores atuam nas ligas amadoras da Índia.

Coreanos Unidos do Japão: a história está ligada a Segunda Guerra Mundial, quando o Japão foi derrotado e os mais de dois milhões de coreanos que viviam no país foram exilados. No entanto, boa parte deles permaneceu no Japão e montaram uma pequena Coreia do Sul, onde se fala a língua nativa.

Armênia Ocidental: é considerada a região que pertence a Armênia dentro da Turquia. São os representantes do exílio armênio. Estima-se que a população do país tenha caído para cinquenta mil habitantes, quando já foi de mais de duas milhões de pessoas.

Cabília: região localizada ao norte da Argélia. Eles têm sua própria linguagem, cultura e estruturas, mas são reprimidos pelo governo argelino que quer tomar o controle da região. Micronação vive em constante guerra civil.

*Sob supervisão de Aigor Ojêda

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