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Defesa de dirigente deposto da CBDA diz que a decisão é 'irregular e ilegal'

Assembleia em que ex-aliados de Miguel Cagnoni o destituíram a favor de vice é contestada por opositores e defesa do ex-presidente, e contraria sugestão do Conselho de Ética do COB

17 set 2019 - 08h02
(atualizado às 13h29)
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O anúncio do ex-vice Luiz Fernando Coelho como novo presidente da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), na última segunda-feira, piorou a crise política e institucional na entidade, abalada ainda por graves problemas financeiros. Novos capítulos prometem movimentar os bastidores até que os rumos da gestão de natação, polo aquático, saltos ornamentais, nado artístico e maratona aquática no país sejam definidos.

A defesa de Miguel Cagnoni, presidente destituído em Assembleia Geral Extraordinária no Rio de Janeiro e acusado de não prestar contas de mais de R$ 1 milhão ao Comitê Olímpico do Brasil (COB), contesta a derrubada do mandatário e a efetivação de Coelho ao posto. A Federação Internacional de Natação (Fina) terá agora de aprovar ou não as deliberações. Diferentes teses jurídicas tentam justificar as posições de cada lado no jogo pelo poder.

O advogado Paulo Schmitt se apega ao Artigo 25 "f" do estatuto em vigor, de 2017. O texto diz que a AGE só pode destituir um membro "após processo regular". Para isso, é exigido quórum mínimo de 2/3 das filiadas "não podendo deliberar em primeira convocação, sem a maioria absoluta dos filiados ou com menos de 1/3 nas convocações seguintes".

Como estiveram presentes dez federações, unânimes na deposição de Miguel e em segunda chamada, ao menos a exigência de 1/3 foi atendida. O Brasil tem 27 entidades. Mas Schmitt alega que "questões mais graves e relevantes" como esta exigiriam quórum qualificado, ou seja, maioria.

- O que fizeram, lamentavelmente, foi algo totalmente irregular e ilegal. Onde foi o processo regular? Em qual instância ou tribunal? Para a destituição do presidente havia necessidade de um formalismo e precedência de processo, que não ocorreu. E deliberaram sobre o vice-presidente assumir a presidência interpretando o Artigo 30 do estatuto, quando isso não constava de item da pauta - afirmou Schmitt, que foi destituído do cargo de diretor jurídico assim que Coelho, de Pernambuco, assumiu a presidência.

O advogado acredita que o reconhecimento do resultado da AGE abre precedentes perigosos.

- Seria muito simples em uma federação com seis filiados, e temos muitas com essa realidade no Brasil, dois clubes, por qualquer motivo, convocarem uma reunião, chamarem de assembleia, a federação não reconhecer e, mesmo assim, os dois clubes destituírem o presidente - completou Schmitt.

Tanto Miguel quanto parte de seus antigos opositores contestam a decisão da AGE. A chegada de Coelho à presidência também contraria uma recomendação do Conselho de Ética do COB, órgão de apoio, mas sem poder de decisão, para que fossem realizadas novas eleições.

O ex-presidente já havia, inclusive, se licenciado, deixado o diretor geral Ricardo Prado no comando e marcado o pleito para o dia 28 de novembro. Só que a medida desrespeitou o estatuto em vigor. Segundo o documento, é função da Assembleia Geral referendar a antecipação das eleições.

Cagnoni, sem apoio político nem mesmo dos que o levaram ao poder, fez a jogada ao saber que as Federações Aquáticas do Rio de Janeiro e São Paulo, ex-aliadas, colocariam sua deposição em votação, o que de fato ocorreu.

- Não nos parece, em princípio, que uma assembleia de dez federações em um colégio eleitoral de 27 federações, 14 atletas e cinco clubes tenha condição de destituir um presidente, ainda mais sem o devido processo legal. Isso sem falar em item de pauta não previsto em convocação. Para falar apenas em aspectos jurídicos e estatutários. Uma nova eleição sempre foi o melhor caminho, para cumprir o que está ainda recomendado pelo Conselho de Ética do COB. Qualquer outro caminho é temerário - afirmou Schmitt.

O outro lado

Já de acordo com a defesa de Coelho, comandada pelo advogado Marcelo Jucá, que até pouco tempo atuava ao lado de Schmitt na gestão de Miguel e manteve-se próximo à cúpula insatisfeita com o dirigente, a AGE é válida. Ele diz que, por não se tratar de uma eleição, e sim da destituição do presidente, o estatuto não exige o colégio eleitoral. A Assembleia tem poder para isto, com apenas 1/5 dos membros.

- O processo de desligamento do Presidente Miguel Cagnoni respeitou estritamente os comandos estatutários. O momento agora merece reflexão de todos os envolvidos para que os Desportos Aquáticos voltem a respirar. Aguardamos também o posicionamento da Fina, que certamente será favorável ao que foi deliberado ontem em AGE - disse Jucá.

O advogado defendeu ainda que "não deliberou-se por nada fora da pauta, apenas deu-se uma interpretação ao Artigo 30". Disse também que o estatuto dá esse poder à AGE. Outra alegação é de que há contradição no argumento de Cagnoni de que não houve "processo regular", pois o ex-presidente abriu mão do cargo em carta pública.

Comitê Gestor de Crise pode ser ponte para o diálogo

Assembleia que destituiu Cagnoni teve dez federações e Tammy Galera, da comissão de atletas (Foto: Divulgação)
Assembleia que destituiu Cagnoni teve dez federações e Tammy Galera, da comissão de atletas (Foto: Divulgação)
Foto: Lance!

Um sinal de conciliação foi dado pelo novo presidente: a manutenção de um Comitê Gestor de Crise, presidido pelo deputado estadual paraibano Ricardo Barbosa, cotado para concorrer ao novo pleito, caso ele seja feito, e elogiado pela oposição.

- A CBDA vive em uma situação muito complicada. Não vai faltar empenho. Temos essa missão de resgatar a instituição e precisamos das federações para recuperar a credibilidade da entidade. Nós precisamos pagar nossas dívidas, funcionários e credores e arbitragem. Nosso primeiro impacto a ser desvendado e ser restabelecido na confederação - disse Coelho, que anunciou o retorno de Renato Cordani ao posto de diretor geral. Ele havia deixado a CBDA por discordar de medidas de Miguel.

A Assembleia contou com dez presidentes de federações estaduais (MT, BA, SP, PA, PE, RJ, RO, RS, AC e TO), e a presidente da Comissão Nacional de Atletas da CBDA, Tammy Galera, dos saltos ornamentais. O observador internacional da Fina (Federação Internacional), o paraguaio Juan Carlos Orihuela, também compareceu. Ele reportará à entidade máxima suas impressões.

Cientes de que o objetivo era destituir Cagnoni para colocar Coelho em seu lugar, diversas federações contrárias à medida, bem como o próprio ex-mandatário, não foram ao encontro.

Oposição a Cagnoni se vê do mesmo "lado" do paulista

No mapa dos esportes aquáticos do Brasil, o grupo que, no passado, apoiou o ex-presidente Coaracy Nunes, afastado pela Justiça por suspeita de corrupção em março de 2017, e era oposição de Cagnoni naquele ano, hoje tem um interesse em comum com o paulista: a realização de nova eleição.

Para alguns, defender o mesmo que o presidente destituído não significa, necessariamente, estar do seu lado na definição dos rumos dos esportes aquáticos do Brasil. Carlos Camargo, presidente da Federação Aquática de Santa Catarina (FASC), afirma que sempre foi opositor de Miguel e continuará a exercer o papel, embora faça coro ao ex-presidente sobre o pleito. Ele diz que a AGE foi direcionada, de acordo com a vontade dos aliados de Coelho.

- Não pode haver mais derramamento de sangue em uma disputa pelo poder. Não há nada mais importante, na véspera de uma Olimpíada, do que todos conversarem. Não foi essa a opção que a Assembleia Geral entendeu. Acredito que, em uma situação de impasse e divisão séria dos grupos que ficaram na CBDA, o COB pode vir a tomar uma atitude de conciliação. E a única possibilidade de conciliação hoje é uma eleição - defendeu Camargo.

A CBDA deve ao COB cerca de R$ 8 milhões e está impedida de receber novos recursos da Lei Agnelo Piva. Segundo o "Globo Esporte", no primeiro semestre deste ano o prejuízo foi de R$ 2,1 milhões. A dívida total chega a R$ 10,5 milhões.

* Atualizado às 13h10

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