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Livro usa falsificação para discutir futebol como traço do caráter brasileiro 

'Saída Bangu' associa literatura ao futebol para mostrar que o esporte não tem nada de alienante

20 ago 2019 - 12h05
(atualizado às 14h11)
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Chico Buarque, Lima Barreto, Machado de Assis, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Manoel de Barros, Carlos Drummond de Andrade, Campos de Carvalho, Guimarães Rosa, Nelson Rodrigues e Euclides da Cunha. O escrete escalado por Guilherme Trucco após o capítulo final de "Saída Bangu" resume a intenção do autor em seu segundo livro: associar literatura ao futebol para mostrar que o esporte não tem nada de alienante e possui poesia muitas vezes ignorada pelo pragmatismo da busca pelos resultados. E, para isso, se inspira em grandes nomes da literatura.

"O futebol tem muito da cultura brasileira, assim como o carnaval, e é pano de fundo para debater muita coisa. O que já foi discutido por Roberto da Matta, José Miguel Wisnik e Gilberto Freyre não pode ser algo de alienado", afirmou Trucco, em entrevista ao Estado.

Saída Bangu usa falsificação para discutir futebol como traço do caráter brasileiro 
Saída Bangu usa falsificação para discutir futebol como traço do caráter brasileiro
Foto: Divulgação/Sala Off Flip / Estadão

No enredo de "Saída Bangu", o escritor parte de uma ideia surrealista: uma falsificadora, de nome Geni, é contratada para copiar o futebol apresentado pela seleção brasileira de 1982. O marco é óbvio: vista como um dos maiores expoentes do futebol, aquele time, ao ser derrotado, provocou, ainda que involuntariamente, transformações no jeito de praticar o esporte no País, com o surgimento de cópias mal feitas que valorizavam o pragmatismo, ao contrário daquele time de Telê Santana, na visão do autor.

"A tese é que 82 foi um ano central para mudar a forma como o futebol passou a ser visto, como se o futebol brasileiro hoje fosse uma falsificação do que já se praticou aqui", explica Trucco, que, na sua mistura entre futebol, política e literatura, também usou a eleição presidencial de 2018 como motivação para o livro. "A falsificação veio muito do debate sobre as fake news, algo marcante nas eleições", relembra.

A partir disso, em 20 capítulos que se entrelaçam, mas também podem ser lidos em separado, como em crônicas, pois são fragmentários, a trama se desenvolve. E o autor se divide entre cenas de ficção e momentos inusitados, mas de que fato aconteceram, envolvendo personagens do futebol brasileiro, como o erro com o nome de Garrincha quando da sua chegada ao Botafogo, confundido que foi com o cavalo Gualixo, ou para a alteração proposital das repostas de Sócrates por um tradutor em uma entrevista na Itália, no período em que defendia a Fiorentina. "São cenas surreais, embora reais", brinca.

Dessas passagens, relatadas com humor, Trucco busca construir o caráter brasileiro a partir do futebol, passando até pelo nome do livro, o improviso de dar sequência a um jogo com a saída sendo dada pelo goleiro e não do meio-campo, ou mesmo pela invenção do drible.

Para ele e seu livro, o futebol, por essa importância cultural, deveria ser encarado pelo lado lúdico, sem cópias ou falsificações que atinjam sua inventividade. "Tem uma citação que acho ótima: 'O sujeito esvazia o futebol como se fosse um pneu'. As pessoas são muito pragmáticas quanto ao futebol, não percebem o quanto pode ser profundo", conclui.

Estadão
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