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Em Olimpíadas de Inverno, neve e opiniões nunca são iguais

28 fev 2010 - 16h17
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Christopher Clarey

Para fãs esperando o ônibus ou o espectador assistindo à distância, a neve nas Olimpíadas de Vancouver foi sempre a mesma.

Esqui Alpino Slalom Gigante (M) - Final:

Mas para aqueles que participavam dos Jogos, a neve variava tanto quanto ondas variam para o marinheiro ou pregos para o carpinteiro. E a neve poucas vezes variou tanto quanto na instável Vancouver e sua montanha vizinha Whistler, onde condições flutuantes provocaram fortes reações de esquiadores e treinadores, nem todas publicáveis.

"Vejamos", disse Todd Cuthbert, técnico de esqui alpino da empresa Head. "Desde que chegamos aqui, a neve ficou grossa, fina, suja, limpa, molhada, dura, embolada."

Cuthbert recuperou o fôlego e continuou: "Congelada, afiada. Ela ficou como neve nova, como neve velha. Em uma competição, temos neve de inverno total no topo, que fica realmente brilhante e limpa, e então embaixo temos aquela neve velha, suja, empedrada. Então temos tudo em uma só corrida."

O que está claro é que a diferença entre vencer e perder nestes jogos de ventos oceânicos da costa oeste muitas vezes está na substância anteriormente conhecida como neve: quando ela cai, quando ela muda e até quando ela vira chuva.

As condições climáticas superaram os atletas em Whistler. No domingo, na corrida do biatlo masculino de 10 km, os primeiros competidores enfrentaram condições relativamente estáveis. Mas logo depois da principal figura do esporte, Ole Einer Bjorndalen, da Noruega, ter saído da porta de largada na 21ª posição, veio uma torrente de chuva, chuva e neve, neve pesada e garoa, e depois o céu ficou azul. Tudo isso em meia hora, deixando Bjorndalen e o restante num lamaçal de neve nova, molhada e densa que tornava impossível manter o tempo dos primeiros atletas.

"Tive muita sorte, muita mesmo", disse Emil Hegle Svendsen, que ficou com a prata.

No registro de resultados oficiais do downhill masculino, que aconteceu segunda-feira, a condição da neve estava listada como granular. Mas não diga isso aos técnicos de esqui, que ajustam a base dos esquis com texturas especiais e cera.

"O downhill masculino foi uma loucura", disse Ales Kalamar, esloveno que prepara os esquis do americano Ted Ligety. "Eram três corridas em uma por causa das condições da neve."

Jean-François Jond, gerente da Rossignol para a equipe masculina na Copa do Mundo, disse: "Era neve de inverno lá em cima, bastante gelada. Mas embaixo a estrutura da neve ficava diferente. Era neve de primavera embaixo, e, quando o sol apareceu no meio da corrida, começou a derreter a neve. Depois da 24ª ou 25ª posição, estava tudo áspero na parte inferior. Não havia como desenvolver a mesma velocidade."

Pelo menos o tempo nunca mudou nos abrigos de cera de Whistler Creekside, a área de competições de esqui alpino. Os técnicos trabalhavam em cabanas temporárias de madeira em um estacionamento próximo à rampa, e cada grande equipe nacional e fabricante tinha seu próprio espaço a portas fechadas.

Nas áreas do cross-country e do biatlo, técnicos trabalhavam até tarde e usavam respiradores para reduzir a inalação da poeira enquanto aplicavam caras ceras de fluorcarbono, na esperança de reduzir a diferença entre um quarto lugar e o pódio.

A análise da neve faz parte do trabalho deles. Eles analisam com mãos e palpites; eles analisam com kits de química que mostram a estrutura da neve; eles analisam com programas de computador que dizem qual cera funciona melhor e quando.

"Aqui, as companhias de cera fazem todas as medições para sabermos qual a umidade da neve", disse Kalamar.

O próximo truque é descobrir a palavra certa para descrever a neve (ou neves) do momento. Bode Miller dedicou um capítulo inteiro às variedades de neve em sua autobiografia "Go Fast, Be Good, Have Fun".

No livro, Miller identifica as óbvias como powder (neve nova), crust (camada dura sobre neve macia), slush (derretida) e crud (compactada pela passagem de esquiadores). Depois, ele trata da neve arenosa, neve espessa, neve molhada e neve granulada.

"Duvido que os inuítes tenham o mesmo conhecimento linguístico da neve que nós", escreveu Miller. "Por outro lado, se eles fizerem distinção entre neves que precisem de uma ou duas batidas para serem removidas das botas, ou se um montinho ou um montão de neve nova tiverem nomes completamente diferentes, aí eles nos superaram."

A condição de neve favorita de Miller é aquela sulcada por escavadeiras de gelo, mas ele acha que a "neve mais legal" é a neve vermelha, que cai nos Alpes e é tingida de vermelho por causa do deserto Kalahari, no sul da África.

Mas Miller não cita dois nomes na lista olímpica de Cuthbert em Whistler: neve embolada e neve empedrada.

"Neve embolada é a neve velha fica com uma forma arredondada. Quando você a pega, parece pequenas bolas¿, disse Cuthbert. "A neve empedrada é quando essas bolas se juntam e formam grandes massas."

Franceses como Jond têm seu próprio vernáculo de neve: béton, que significa concreto e se refere a percursos duros e congelados; gros sel, que se refere a cristais de neve do tamanho do sal grosso; e savonneuse, que significa ensaboado e é usado quando a neve brilha como se tivesse sido lavada.

Em qualquer língua, existe a neve agressiva, que é tão gelada que os esquis não conseguem deslizar suavemente sobre ela. Pelo menos dois outros tipos de neve foram identificados por competidores aqui: neve salgada, que é a neve úmida que recebeu sal ou produtos químicos para ficar mais firme, e a neve adocicada, que é uma neve de primavera com grandes cristais.

"Como a neve de hoje", disse Kalamar, em direção ao pico onde Viktoria Rebensburg venceu o slalom gigante feminino na quinta-feira.

A surpresa é que as muitas formas de neve em Whistler pareciam mais adequadas para os visitantes do que para o time de casa. Os canadenses ainda precisam ganhar uma medalha no alpino e a veterana canadense Emily Brydon tentou explicar seu trabalho.

"Vou muito bem em neve aderente, pois recebo muita resposta dos meus esquis", disse ela.

A neve aderente, um produto de lugares mais frios do que Whistler neste mês, é também conhecida como a neve do herói, aparentemente a superfície olímpica ideal. Talvez em Sochi, Rússia, nos Jogos de 2014.

The New York Times
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