PUBLICIDADE

Bottas vive velho normal, oscila e fica restrito a papel de ótimo segundo piloto na Mercedes

Com o fabuloso W11 que tem às mãos, Valtteri Bottas tem a obrigação de lutar pelo título. Só que o finlandês repete em 2020 o que tem sido sua trajetória pela Mercedes: faz corridas impecáveis aqui e ali, mas tem exibições de um piloto mediano em outras provas. Assim, pouco dá para esperar do dono do carro #77 além de um tranquilo vice-campeonato

30 jul 2020 - 05h17
Compartilhar
Exibir comentários
Foto: Grande Prêmio

O filme visto no começo da temporada passada ainda está na retina. Depois de se preparar intensamente na gelada terra natal, Valtteri Bottas chocou a Fórmula 1 com um desempenho irrepreensível no GP da Austrália: passou o pole-position Lewis Hamilton na largada, liderou 56 das 58 voltas da prova, venceu com enorme autoridade e, de quebra, faturou o ponto extra pela volta mais rápida da corrida em Melbourne. Muitos pensaram que o finlandês tinha tudo para ser um concorrente real ao título contra o britânico. Entretanto, o dono do carro #77, depois de ter triunfado no GP do Azerbaijão, só voltou ao topo do pódio quase seis meses depois, no Japão, na época em que Hamilton estava muito perto de selar a conquista do seu sexto título mundial.

O curioso caso de Valtteri Bottas tem nova edição em 2020, mas parece mais um filme repetido de qualidade duvidosa. No começo de um ano que parecia normal, o nórdico esmerou-se numa preparação que teve direito até mesmo a rali na neve da sua Finlândia, além de treinos de mountain-bike em Mônaco, onde mora.

Nickolas Gouveia
Nickolas Gouveia
Foto: Grande Prêmio

O discurso afiado também estava lá. Como um coach motivacional, Bottas disse. "Tivemos uma preparação muito boa para o ano, e estou ansioso para começar. É tudo sobre estar no seu absoluto melhor e ir ainda mais ao limite. O que exige disso é a mentalidade certa, o espírito e a atitude, estar mentalmente livre no carro e confiante. Então, é sobre encontrar consistência neste nível durante a temporada. Essa é a chave".

A fala acima é da entrevista coletiva que Valtteri concedeu na quinta-feira do que seria o GP da Austrália. Veio a pandemia do novo coronavírus, que mexeu e mexe com o mundo, e obrigou o Liberty Media a cancelar a prova em Melbourne. Daí em diante, foram meses de grande indefinição a respeito de quando começaria a temporada.

Na opinião do piloto, ao menos em termos físicos, a pausa inesperada acabou sendo positiva. Enquanto a Fórmula 1, equipes e dirigentes da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) e do Liberty Media buscavam alternativas para abrir de fato a temporada, Valtteri lapidava seu condicionamento para voltar a correr.

"Óbvio que vai ser uma temporada bem especial", comentou o piloto em junho, quando já sabia que a abertura do campeonato estava marcada o primeiro domingo do mês seguinte e num dos seus circuitos preferidos: o Red Bull Ring.

"A temporada vai ser uma questão de consistência. Sinto que, tendo trabalhado com meus engenheiros a respeito do meu estilo de pilotagem, tenho algumas coisas novas que posso usar. Senti evolução em alguns tipos de curvas. Eu me sinto mais completo como piloto e no meu auge físico. Espero que isso se converta em resultados. Estou confiante, mentalmente bem e vou com tudo, sem dúvida", comentou.

Quando desembarcou na Áustria para a primeira corrida do ano, Bottas reafirmou o discurso de piloto vencedor para dizer o óbvio para quem corre pela principal equipe do grid. "A meta este ano é ser campeão mundial. Qualquer outro resultado é inferior a isso. Tudo que fiz nos últimos meses foi me preparar para isso".

Fotógrafo: Felipe Max
Fotógrafo: Felipe Max
Foto: Grande Prêmio

Os dias seguintes foram perfeitos para Valtteri. No treino classificatório do GP da Áustria, com uma grande volta, o piloto superou Hamilton por meros 0s012 para garantir a primeira pole-position da temporada. No domingo, vitória de ponta a ponta, com tranquilidade, e que só não se converteu em grand-chelem porque Lando Norris, no fim da disputa, fez a volta mais rápida da corrida com sua McLaren.

Mas era Bottas quem estava lá, no topo do pódio a ouvir o belo hino da Finlândia. Em meio a um cenário completamente atípico em 2020, Valtteri tentava mostrar ao mundo seu novo normal.

Só que a nova normalidade envelheceu cedo demais, e o piloto voltou a exibir a velha faceta da inconstância menos de uma semana depois e foi da alegria à decepção sete dias após ter conquistado a pole-position do GP da Áustria. No mesmo Red Bull Ring, mas valendo pelo GP da Estíria, Bottas sofreu na chuva mesmo tendo o carro mais equilibrado do grid e não passou do quarto lugar no encharcado treino classificatório, ficando atrás de Hamilton, Max Verstappen e até da McLaren de Carlos Sainz.

No domingo, com a corrida sendo disputada no seco, prevaleceu a lógica: Hamilton vencendo sem problemas depois de largar na frente e Valtteri em segundo, completando a dobradinha da Mercedes após lutar para passar um valente Verstappen na fase final da prova. O nórdico ainda era o líder do campeonato, mas o próprio sabia que seria muito difícil manter tal condição já na semana seguinte, na Hungria.

Se Lewis costuma ser forte em praticamente todos os circuitos do calendário, em Hungaroring o britânico é simplesmente imbatível. Se quisesse ao menos representar uma ameaça ao companheiro de equipe, Bottas precisaria ser perfeito. Mas o finlandês ficou bem longe disso ao longo do fim de semana magiar. Na largada, onde estava lado a lado com o pole, Hamilton, Valtteri patinou no asfalto úmido e despencou de segundo para sexto.

Foto: Grande Prêmio

Enquanto o hexacampeão partiu para um domingo soberano e triunfou pela oitava vez na carreira em Hungaroring, Bottas não passou de um terceiro lugar depois de muito suar, mas não conseguir ultrapassar Verstappen, mesmo contando com pneus mais novos no fim. O holandês foi novamente aguerrido na defesa da sua posição e encerrou o dia com um segundo lugar que lhe valeu como vitória. Para Bottas, o contrário: o champanhe do terceiro posto teve um sabor amargo.

Depois de três corridas já disputadas, Hamilton já lidera o Mundial de Pilotos e soma 63 tentos, contra 58 de Bottas. E diante de duas corridas consecutivas em Silverstone, neste fim de semana e no próximo, onde o laureado piloto já venceu seis vezes, nada indica que a situação no campeonato vá mudar.

Foto: Grande Prêmio

Valtteri é um ótimo segundo piloto e entrega o que a Mercedes espera dele: muitos pontos e vitórias aqui e ali, além, principalmente, de não tumultuar o ambiente interno. Não à toa, está em vias de ter seu contrato renovado.

No entanto, para traçar um paralelo com o último piloto que bateu Hamilton, Nico Rosberg, em 2016, o alemão precisou ser impecável para ser campeão e venceu nove corridas naquele ano, sendo constante do início ao fim. Bottas, se quiser algo além na carreira e aproveitar a chance de ouro por ter às mãos o melhor carro do grid (e talvez o melhor da história da Fórmula 1), vai precisar corrigir o maior defeito. A inconstância é o seu velho normal.

Grande Prêmio
Compartilhar
Publicidade
Publicidade