Quarta-feira, 16 de junho de 2004
Mistérios que causam arrepios
No final dos anos 60 eu estudava letras na Usp. Ía haver um seminário sobre Sóror Mariana Alcoforado na segunda aula de literatura portuguesa. Eu morava no quilômetro 18, bairro de Osasco. Tomei o ônibus e fui lendo as cartas da freira que vivera - não me lembro bem - mas acho que no século XVI e que sentira uma grande paixão por um oficial do exército que se abrigara no convento em que ela vivia. As cartas são dirigidas a ele e o conteúdo delas é de uma sensualidade muito grande, o que é raro na literatura feminina da época, ainda mais tratando-se dos textos de uma freira... Bem, eu ía no ônibus, deveria ser 19h, 19h30, quando o ônibus parou em um ponto, em Vila Yara, bairro que é divisa com São Paula e uma freira gorda, idosa, muito, muito branca, vestida com um hábito roxo, subiu no ônibus e sentou-se ao meu lado. Lembro-me de que a freira exalava um perfume de colônia e eu continuei a ler as cartas. Até hoje não consigo, por mais que tente, me lembrar onde ela desceu, nem se desceu antes de mim. Isso pra mim é um mistério tão grande, que até hoje me causa arrepios. Mas naquela hora, durante o trajeto não tinha me causado espanto. Só depois, no dia seguinte é que comecei a relembrar e achar estranho: uma freira à noite, sozinha, e vestida de roxo... Sempre que alguém me diz ser de Portugal pergunto se há alguma ordem religiosa que use hábito roxo, mas até agora ninguém satisfez minha curiosidade.
Marina Gold
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