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Seguro, precisa explicar

Planos de saúde privados tiveram, no primeiro semestre, um resultado melhor do que o esperado depois que a pandemia se instalou no País

28 set 2020 - 04h10
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Na maioria das vezes, as coisas e os fatos têm explicação lógica, dentro do campo normal. Acontecem por uma série de fatores que não precisam da ajuda de milagres, trabalhos, forças ocultas ou escrita nos astros. Simplesmente acontecem porque acontecem, e se, às vezes, parece que uma mão mágica se colocou debaixo e evitou o pior, é porque não era para o pior acontecer e a explicação, até quando não parece clara, não foge ao mundo dos vivos e das causas naturais, mais ou menos complexas, mais ou menos raras, mas inseridas no campo dos fenômenos possíveis dentro da realidade da vida.

Da mesma forma que a regra vale para as relações pessoais, vale para as relações empresariais, políticas e sociais. Milagre é mais complexo e mais raro do que imagem de santo chorar ou time de futebol não ser rebaixado.

E o setor de seguros não é exceção à regra. Na maioria das vezes, acontecem ações concretas, levadas a cabo em cima da realidade, que podem ou não ter resultados positivos.

É assim que vários planos de saúde privados tiveram, no primeiro semestre, um resultado muito melhor do que o esperado depois que a pandemia se instalou no País. Com a pandemia correndo solta, o número de casos aumentando, as mortes se tornando rotina e chegando na casa de mil por dia, uma análise menos cuidadosa do cenário poderia dar a impressão de que os planos de saúde privados não escapariam à sorte da maioria dos negócios que derreteram, afetados pelo coronavírus.

A explicação não é difícil de ser encontrada e é absolutamente lógica. Em primeiro lugar, se no início a doença atingiu pessoas de classes sociais mais elevadas, com o tempo a covid-19 deixou os bairros de classe média para invadir as periferias, ou seja, contaminou usuários do SUS.

Além disso, a pandemia teve como consequência o represamento do uso dos planos, pelo medo de contrair a doença. Assim, os procedimentos eletivos foram adiados ou cancelados, reduzindo a sinistralidade dos planos privados ao longo do semestre. Finalmente, a redução do número de segurados por causa do desemprego não foi imediata e simultânea, o que evitou a queda brusca do faturamento. Mas este quadro deve piorar no segundo semestre.

Com relação aos seguros de pessoas, a pandemia até agora matou perto de 130 mil brasileiros. Mas as mortes não aconteceram simultaneamente, foram se dando ao longo dos meses e aumentado à medida que o semestre chegava ao fim.

Além disso, é pouco provável que 10% dos mortos por covid-19 tivessem seguro de vida. E, para compensar, com o isolamento social houve a redução do número de mortos em acidentes de todos os gêneros.

A contratação de seguros novos de todos os ramos sentiu o baque e apresentou forte queda. Especialmente em abril, o número de seguros de veículos zero quilômetro caiu para patamares ridículos. E os outros seguros não tiveram desempenho muito diferente. Em comparação com 2019, foi um período dramático, mas em maio o setor já apresentou uma pequena recuperação em relação ao mês anterior. Se bem que, na comparação anualizada, os números continuassem negativos, a pequena variação para mais mostrou que o Brasil tem enorme capacidade de recuperação e indicou que a recessão de 2020 pode ser menor do que a inicialmente prevista.

Ninguém espera que o ano termine com o setor de seguros nadando de braçada para pegar a onda da retomada acelerada do crescimento. Isso não existe e a principal razão é que o País está longe de sair do buraco ou de, simplesmente, controlar a pandemia e trazer seus números para baixo.

A população jogou o coronavírus na conta e resolveu tocar em frente, sem se preocupar com o vírus continuar solto e matando perto de mil pessoas todos os dias. Como ouvi de um chileno que veio para cá, a sensação dele, comparando as realidades sanitárias dos dois países, é que o Brasil não tem coronavírus. E isso vai nos custar caro.

O ano será muito difícil para milhões de pessoas que perderão seus empregos e para empresas que quebrarão ao longo do caminho. Dentro deste quadro lamentável, o setor de seguros será dos menos afetados.

*Antonio Penteado Mendonça é sócio da Penteado Mendonça e Char Advocacia e secretário geral da Academia Paulista de Letras.

Estadão
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