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Projeto que flexibiliza Orçamento deve sair em abril

Proposta é colocar os gastos nas mãos dos políticos; atualmente, a maioria dos recursos tem destino pré-determinado

12 mar 2019 - 04h10
(atualizado às 09h26)
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BRASÍLIA - A proposta que pretende tirar as "amarras" do Orçamento da União, de Estados e municípios e ampliar os repasses de recursos para os governos regionais deve chegar ao Senado no início de abril, prevê o líder do governo na Casa, Fernando Bezerra (MDB-PE). Um dos alvos da medida, segundo apurou o Estadão/Broadcast, deve ser o porcentual mínimo de gastos em saúde e educação. A tramitação da proposta, que é um dos pontos centrais do plano do ministro Paulo Guedes, contará com o apoio de uma Frente Parlamentar Mista do Pacto Federativo, que será lançada na próxima quarta-feira, 13.

A intenção é dar maior liberdade na hora de gastar, pois hoje nem sempre é possível priorizar as urgências devido à obrigação de cumprir porcentuais mínimos de gastos em determinadas áreas. Na União, as despesas não obrigatórias representam apenas 9% do Orçamento total de R$ 1,4 trilhão, e o Congresso Nacional nem pode dispor de tudo porque gastos para manutenção da máquina são tidos como essenciais.

O senador Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado
O senador Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado
Foto: André Dusek / Estadão

Guedes revelou em entrevista ao Estado que pretende enviar logo a proposta para tramitar junto com a reforma da Previdência, só que começando pelo Senado. Com essa medida, nem toda despesa poderá ser decidida de forma discricionária, uma vez que alguns gastos continuarão sendo obrigatórios em qualquer contexto, como benefícios previdenciários e salários de servidores. Mas um integrante da equipe econômica explica que alguns gastos exigidos às vezes não se justificam. Há casos de deficiência enorme de recursos na saúde, mas não é possível diminuir dos gastos em educação sob o risco de descumprir o mínimo constitucional.

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Glademir Aroldi, diz que os prefeitos, via de regra, gastam mais que o mínimo tanto em saúde quanto em educação, mas há casos de municípios com dificuldades para atingir o piso no ensino. Como as prefeituras são responsáveis pelo ensino fundamental, elas sentem primeiro o choque demográfico causado pelo envelhecimento populacional, que resulta em menos alunos na rede básica. Ele disse que aguarda a proposta final para avaliar a medida, mas indicou que as prefeituras são favoráveis à maior repartição de recursos.

O líder do governo no Senado também disse que a iniciativa tem o apoio e simpatia de governadores e prefeitos. Segundo Bezerra, o ambiente para a apresentação da proposta ainda está sendo construído, e há a expectativa de que o ministro vá ao Senado ainda esta semana para debater a iniciativa. Depois, a intenção é realizar reuniões com governadores e prefeitos ao longo do mês de março.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), apoia a medida. "Os Estados e municípios acabam tendo pouca autoridade sobre o seu Orçamento, o que torna muito difícil para um governante revisar prioridades e reorganizar os investimentos", disse.

A proposta de desvinculação total, porém, deve despertar resistências. Um governador do Nordeste, por exemplo, afirma que a medida não ajuda os Estados no curto prazo e diz ser contra a desindexação do salário mínimo, embora seja favorável a dar alguma flexibilidade aos gastos.

Bezerra reconheceu que a medida é polêmica e não há consenso entre parlamentares sobre o tema. Técnicos do Congresso também alertam para a dificuldade de aprovar uma PEC que mexa nos mínimos constitucionais e ainda promova a "desindexação", que no limite significaria nenhuma obrigação de reajuste em benefícios e salários.

A avaliação, no entanto, é que a medida tem chance de aprovação, a exemplo do que ocorreu na tramitação do teto de gastos. Além disso, a PEC terá o apoio da frente mista, que tem a adesão de mais de 250 congressistas e será presidida pelo deputado Silvio Costa Filho (PRB-PE), que já conversou com Guedes e com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre a questão.

Previdência

Economistas temem que a PEC anunciada domingo por Paulo Guedes possa atrapalhar a tramitação da reforma da Previdência, no Congresso. A PEC, que deve chegar ao Senado no mês que vem, tem o objetivo de transferir para os políticos a responsabilidade do controle orçamentário.

Na avaliação do economista-chefe do Banco Safra e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, embora a proposta seja pertinente, os esforços do governo devem estar focados na tramitação da reforma da Previdência, neste momento. "Trabalhar nessa direção é bom, mas acho que é uma PEC complexa. De fato, o momento hoje é da previdência social."

Segundo ele, o País chegou a uma situação fiscal limite e, nesse contexto, novas regras para as aposentadorias são fundamentais, principalmente com o regime de teto de gastos vigorando. Aliás, com esse limite de despesas estabelecido, a revisão das obrigações de gastos que constam na Constituição também seria apropriada.

Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a PEC é um contrassenso diante do discurso de posse do ministro e pode diluir o esforço que o governo deveria fazer durante a tramitação da reforma da Previdência. "Não faz sentido gastar capital político com isso ao mesmo tempo em que se busca a aprovação da Previdência, ainda mais diante de toda dificuldade política que se vê com Bolsonaro." Para ele, só a aprovação das novas regras de aposentadorias demandará um esforço gigantesco, principalmente porque o que se vê até o momento é uma desorganização do próprio governo.

Na avaliação de Vale, a ordem dos fatores pode atrapalhar o resultado final necessário para o País, uma vez que nenhuma proposta de novo pacto federativo elimina o fato de que os gastos previdenciários representam 60% das despesas no contexto do teto de gastos. "Não há alternativa, esse pacto em nada muda o cenário catastrófico", disse, estimando que o processo de tramitação da reforma da Previdência seja muito mais lento.

O economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria Integrada, reconhece que o tema poderia ser colocado em outro momento, mas não acredita vá atrapalhar a evolução da reforma previdenciária. Conforme ele, o ideal seria o governo agora focar todas as atenções na reforma previdenciária, já que é um assunto extremamente importante para tentar solucionar o problema fiscal. "É um assunto complicado, complexo em termos de implementação e questionável."/COLABOROU MATEUS FAGUNDES

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