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Políticas LGBTQIA+ podem ajudar na recuperação econômica, apontam economistas

Segundo pesquisadoras americanas, medidas contra a discriminação podem melhorar o desempenho educacional e profissional da população LGBTQIA+, além de atrair mais investimentos e fomentar o turismo, com benefícios para toda a economia

7 jul 2021 - 11h10
(atualizado às 11h45)
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Investir em políticas inclusivas para pessoas LGBTQIA+ pode ajudar na recuperação econômica após perdas com a pandemia, acreditam as economistas americanas Yana van der Meulen Rodgers e Lee Badgett. As duas são autoras, com Kees Waaldijk, de um estudo de 2019 que analisa a relação entre a inclusão LGBT e o desenvolvimento econômico. Em entrevista ao Estadão, as pesquisadoras apontam que, para ajudar na retomada, os países devem promover mais inclusão, de forma legal e social.

Com o avanço da vacinação ao redor do mundo e a reabertura econômica, elas avaliam que as autoridades devem voltar seus olhos para o nicho LGBTQIA+ e pôr em prática uma "estratégia de modernização", como forma de atrair acordos comerciais, investimentos internacionais e turistas.

Para Lee, professora da Universidade de Massachusetts Amherst, as medidas precisam dar mais poder econômico às pessoas LGBTQIA+. Não basta somente legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, proibir a discriminação por orientação sexual no emprego e adotar outras ações antidiscriminatórias. "Não discriminar é importante, mas isso, sozinho, não é capaz de eliminar desigualdades", diz.

As pesquisadoras acreditam que um primeiro esforço deve ser no sentido de levantar dados sobre a população LGBTQIA+. "Só com pesquisas e análises é possível fazer melhores políticas de inclusão", afirma Yana, professora da Universidade Rutgers, nos EUA, e doutora em Economia pela Universidade Harvard.

Em seu estudo, Lee e Yana analisaram dados jurídicos e econômicos de 132 países, entre 1966 e 2011, e constataram que países com políticas mais inclusivas para pessoas LGBTQIA+ desfrutam de um Produto Interno Bruto (PIB) per capita mais alto.

Com base no Índice Global de Reconhecimento Legal de Orientação Homossexual (GILRHO), as pesquisadores dizem que a adição de apenas 1 ponto ao indicador pode gerar um aumento de mais de US$ 2.000 ao PIB per capita. O GILRHO é uma escala que vai de zero a oito criado por Kees Waaldijk, autor do livro Discriminação por orientação sexual na União Europeia: Leis nacionais e a Diretiva de Igualdade no Trabalho.

As economistas entendem que, em países nos quais pessoas LGBTQIA+ não acessam em totalidade seus direitos humanos, há prejuízos econômicos, como perda de tempo de trabalho, perda de produtividade, subinvestimento em capital humano e alocação ineficiente de recursos humanos.

Para Lee, o prejuízo começa já nas escolas, nas quais alunos LGBTQIA+ podem receber uma qualidade de ensino menor por sofrer preconceito. "Comparado a heterossexuais, eles têm menor probabilidade de se formar e continuar os estudos na universidade", diz Lee. Na visão da pesquisadora, as dificuldades no acesso à educação prejudicam a entrada no mercado de trabalho e, quando isso é possível, as pessoasLGBTQIA+ podem chegar com "menos habilidades e conhecimentos" em razão da educação falha.

Lee avalia que a falta de inclusão, em suma, dificulta a plena aplicação do capital humano. Yana completa que o ambiente excludente leva, principalmente, à redução da produtividade de trabalhadores LGBTQIA+. "Pesquisas além da nossa de diversas áreas demonstram que a diversidade influencia positivamente a produtividade no nível empresarial, mas também no nível macroeconômico", afirma.

Segundo as economistas, as ações para incluir a população LGBTQIA+ não devem partir somente do setor público. As próprias empresas também podem contribuir.

Rodolfo Fiorderize, chefe de Gestão de Pessoas da startup Doctoralia - plataforma que conecta profissionais de saúde e pacientes -, concorda: "É um esforço coletivo." A empresa é uma das que têm adotado políticas de inclusão.

Ele acredita que, por sua vivência enquanto homossexual, conseguiu ajudar a empresa a receber, pelo segundo ano consecutivo, a certificação de excelente lugar para se trabalhar da Great Place to Work (GPTW) 2020-2021. "Faço da minha vida, da minha história e da minha trajetória exemplo do que a Doctoralia pensa", diz o administrador.

Logo no primeiro dia de trabalho, quem recebe o novo funcionário na empresa é ele: "Explico que sou casado com um homem, que a gente está na fila de adoção". Para Fiorderize, isso faz com que todos os colaboradores sintam que a empresa tem um ambiente confortável e acolhedor.

O brasileiro Rodrigo Teixeira chefia a área de diversidade e inclusão do aplicativo Uber na Europa, no Oriente Médio e na África e acredita que as perdas provocadas pela falta de diversidade podem ser maiores em empresas de tecnologia.

Se os funcionários LGBTQIA+ não se sentirem confortáveis para expor o ponto de vista deles, a companhia perde a oportunidade de saber mais sobre um nicho consumidor potencial."O setor tecnológico vive de inovação e de criar produtos que atendem diversos tipos de consumidores", diz ele.

Eduardo Doró, homem gay de 23 anos, sentiu na pele a diferença entre ser respeitado no local de trabalho ou não. Quando trabalhava em uma empresa de tecnologia, o profissional de Relações Públicas se incomodou com piadas e comentários homofóbicos de colegas e fez uma reclamação à chefia.

Nenhuma atitude, no entanto, foi tomada pelos gestores. Pelo contrário, Doró foi avisado de que, caso não deixasse de "levantar tantas bandeiras", seria desligado. "Fiquei uma semana muito mal em casa. Não tinha mais ânimo de trabalhar", afirma. Quando uma nova oportunidade de emprego surgiu, não pensou duas vezes antes de pedir desligamento.

Ele mudou de emprego, mas ainda tem medo de passar por uma situação semelhante.

"Essa antecipação de situações, na qual LGBTs imaginam possíveis casos de discriminação, é muito tóxica para o corpo e mente dessas pessoas", diz a economista Lee Badget.

No Brasil, situações como a vivida por Eduardo Doró são comuns. Quatro em cada dez trabalhadores LGBT+ afirmam ter vivenciado homofobia no local de trabalho, segundo relatório da Open For Business de 2018, organizado pelos pesquisadores Jon Miller e Lucy Parker.

Entretanto, a conscientização sobre o problema e o maior empenho das empresas para ter um ambiente de trabalho mais diverso podem ajudar a mudar o cenário. "Sou otimista no sentido de que, quando a pandemia melhorar de vez, vai haver mais promoção de inclusão. Este não é um momento em que os países podem ser excludentes", diz Yana.

Lee concorda, mas sabe que esse pode ser um processo lento. "Não importa quão bom seja o argumento, sempre demora um pouco para mudanças acontecerem", afirma.

Estadão
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