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Petrobrás perde participação no setor de óleo e gás para concorrentes estrangeiras

Juntas, Shell, Repsol Sinopec, Petrogal e TotalEnergies já respondem por 20% da produção nacional de petróleo e gás; movimento acontece desde 2014, quando a estatal diminuiu os investimentos e passou a vender mais ativos

22 jun 2021 - 13h01
(atualizado às 17h01)
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RIO - Com a Petrobrás pisando no freio dos investimentos e vendendo mais ativos, empresas petrolíferas estrangeiras estão ganhando espaço no Brasil. Juntas, Shell, Repsol Sinopec, Petrogal e TotalEnergies já respondem por 20% da produção nacional de petróleo e gás. Essas são as quatro maiores produtoras, atrás da estatal. Em conjunto, a iniciativa privada responde, hoje, por 27% do total, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

O novo retrato da indústria revela ainda a transferência dos investimentos para o pré-sal e a queda do número de descobertas de reservatórios. Mudou também a distribuição dos royalties entre municípios.

Representante das grandes petrolíferas, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) acredita que a participação das estrangeiras deve crescer ainda mais à medida que o pré-sal avançar. A maior parte dos projetos na região é desenvolvida em parcerias. Grande parte é operada pela Petrobrás em sociedade com as multinacionais.

Os investimentos da Petrobrás estão caindo, na verdade, desde 2014, quando a empresa passou a ser alvo de denúncias de corrupção na Operação Lava Jato, a cotação do petróleo despencou e seu endividamento ultrapassou a marca dos US$ 100 bilhões. Em resposta, seus gestores optaram por reduzir os investimentos, que passaram de US$ 236,7 bilhões (para o período de 2014 a 2018) para os atuais US$ 55 bilhões (de 2021 a 2025) - uma retração de US$ 181,7 bilhões.

Para isso, a estatal decidiu abandonar o plano de ser uma empresa integrada em cadeia e vendeu campos terrestres e em águas rasas. A intenção era concentrar os esforços no pré-sal. Da mesma forma, passou a colocar menos dinheiro na exploração de novas reservas, que responderiam por descobertas futuras. Poucas aquisições aconteceram nos últimos anos, exceto em áreas gigantes do pré-sal da Bacia de Santos, como em Búzios, tido como seu melhor ativo.

O reflexo direto dessas decisões aparece nas estatísticas da ANP. A participação da Petrobrás na produção nacional passou de 84% em abril de 2016 para 73% em igual mês deste ano, uma queda de 11 pontos porcentuais em cinco anos. Em contrapartida, cresceu a presença estrangeira no setor.

A mais evidente foi a da Shell, que, há cinco anos, respondia por 7% da produção interna de óleo e gás, e atualmente está com 12%. Parte desse avanço se deve à compra da BG, no início de 2016. Em seguida, aparecem a Petrogal (cuja participação passou de 1,4% para 3,4%) e TotalEnergies, que saiu do zero para quase 2%. A Repsol Sinopec ocupa a quarta colocação, mas o volume extraído por ela caiu 0,2% no período.

Há ainda uma série de companhias estrangeiras de grande porte - como Chevron, Equinor e Exxon, que apostam em campos em águas profundas, inclusive no pós-sal - e brasileiras, como Enauta, PetroRio e Dommo, que vêm crescendo, principalmente, com a compra de áreas da Petrobrás.

Para a estatal, avanço de estrangeiras é 'natural'

A Petrobrás afirmou ser "natural" o crescimento de concorrentes estrangeiras no mercado de petróleo no Brasil, "assim como a entrada de novas empresas em ativos vendidos" por ela. A estatal, em contrapartida, trabalha para manter sua liderança na produção de petróleo e gás em águas profundas e ultraprofundas, incluindo o pré-sal, como informou por meio de sua assessoria de imprensa.

A estatal confirmou a estratégia de atuar em sociedade e diz ser essa uma solução para reduzir a exposição ao risco e agregar o conhecimento e capital dos parceiros. Segundo a companhia, esse modelo de negócio ajuda a empresa a "estar presente em um maior número de oportunidades e agregar competência".

A Petrobrás argumenta que sua produção de petróleo cresceu nos últimos anos, com exceção de 2018, e que deve manter a liderança no segmento de refino, mesmo após se desfazer de metade da sua capacidade de produção de derivados. "A Petrobrás continuará sendo a maior companhia integrada no Brasil, utilizando seu parque para maximizar o retorno e otimizar suas operações", afirmou.

A empresa diz ainda que o campo de Búzios, no qual deve investir US$ 4,2 bilhões por ano até 2025, tem reservas significativas, com baixo custo de extração e, por isso, é resistente a um cenário de baixos preços de petróleo. O campo seria, portanto, a melhor resposta da empresa à retração anual das suas reservas. A empresa ainda não informou ao mercado, no entanto, o volume de petróleo que o campo deve acrescentar ao seu reservatório.

Produção estrangeira

A Shell, por meio de sua assessoria, afirmou ter ativos no Brasil, em todas as fases de execução, da exploração à desmobilização de plataformas. Dois deles estão na fase de produção: Parque das Conchas e Bijupirá-Salema, na Bacia de Campos. "Também planejamos para este ano um poço exploratório no bloco CM-791, na bacia de Campos, arrematado na 15ª rodada de concessão (em 2018), o que demonstra que o nosso interesse vai além do pré-sal", destacou.

Já a TotalEnergies afirmou ter um "compromisso de longo prazo com o Brasil" e que o País "oferece grandes oportunidades, especialmente no pré-sal". A empresa prevê investir aproximadamente US$ 500 milhões por ano em exploração e produção até 2024 e elevar o volume extraído para 150 mil barris por dia no futuro.

A norueguesa Equinor, sétima maior produtora nacional, disse que o Brasil é estratégico para ela. "Desde 2001, a Equinor vem construindo uma organização local forte", afirmou a empresa, em resposta ao Estadão/Broadcast. "A empresa já investiu mais de US$ 11 bilhões no Brasil até agora e espera investir mais US$ 15 bilhões até 2030", acrescentou.

Para William Nozaki, coordenador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), a retração da Petrobrás tem impactos negativos importantes na produção. "O primeiro efeito é a redução da taxa média de investimento total, já que as estrangeiras têm investido menos e não compensam a retração da estatal. Além disso, caiu a produção fora da Bacia de Santos (onde está o pré-sal). Na Bacia de Campos, por exemplo, Shell, Equinor, Dommo reduziram o volume extraído, e Chevron deixou de ser operadora no ano passado (a empresa mantém participação em um campo)", afirmou o especialista, acrescentando que não houve nenhuma descoberta relevante desde que a Petrobras acelerou o programa de desinvestimentos.

"A ausência de novas descobertas se aufere a partir da queda das reservas provadas. No último ano as reservas provadas caíram 6,7%, a ANP declarou 11,89 bilhões de barris", acrescentou Nozaki.

O IBP, no entanto, vê nas mudanças uma oportunidade de geração de emprego e renda. "Esse aumento de participação representa uma maior diversificação do mercado, com ampliação da capacidade de investimentos e redução do risco sistêmico", afirmou.

O especialista em Petróleo e Gás e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Luciano Losekann acredita que o crescimento das multinacionais é importante para cobrir a lacuna deixada pela Petrobrás, desde que decidiu reduzir seus investimentos. Ele destaca a importância da continuidade do investimento para a manutenção das receitas de royalties dos governos.

O Rio de Janeiro continua a ser o Estado mais favorecido. Internamente, no entanto, a arrecadação de compensações financeiras está migrando da região norte fluminense para a região metropolitana. No topo da lista das mais beneficiadas estão, agora, as cidades de Maricá e Niterói.

Estadão
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