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O auxílio emergencial e o mercado de trabalho

Apesar de os dados deste mercado serem ainda incipientes, os sinais são positivos

5 dez 2020 - 04h10
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Após a queda de -27,1% em março e abril de 2020, a produção industrial no Brasil apresentou forte reação, com crescimento de 39% nos últimos seis meses. Com isso, atingiu níveis superiores aos vigentes em fevereiro de 2020. Além do setor industrial, os setores do comércio e da construção civil também já estão em níveis acima dos que vigoravam antes de o isolamento social ser implementado. O setor de serviços, que foi o mais fortemente afetado, ainda se encontra defasado, mas também começa a dar sinais de reação.

Essa forte retomada da atividade surpreendeu os analistas e está, ao menos em parte, relacionada à introdução do auxílio emergencial, programa de transferência de renda cujo objetivo foi evitar que trabalhadores que perderam sua ocupação e não podiam buscar outra por causa do isolamento social tivessem perda total de renda durante a pandemia. Mais de 60 milhões de pessoas foram beneficiadas pelo programa. Ao manter um nível mínimo de renda destes trabalhadores, o programa foi também fundamental no sentido de sustentar a demanda por bens e serviços, fazendo com que, à medida que o isolamento social fosse sendo reduzido, a retomada da economia se acelerasse.

Entretanto, o auxílio emergencial, por ser fiscalmente insustentável, deverá ser descontinuado no fim de 2020. A pergunta é: qual será o efeito desta descontinuidade sobre a demanda e sobre o crescimento da economia brasileira em 2021? A resposta a esta pergunta é fundamental para definir se a recuperação que estamos vendo desde junho irá persistir em 2021.

Uma robusta recuperação do mercado de trabalho é uma das principais precondições para que a retomada da economia, após a pandemia, continue, quando o auxílio emergencial e outros programas fiscais de apoio à atividade forem descontinuados. Será a capacidade do mercado de trabalho de gerar trabalho e renda suficientes para compensar a redução de demanda gerada pelo fim destes programas que vai determinar o comportamento da economia em 2021.

Apesar de os dados do mercado de trabalho serem ainda incipientes, os sinais são positivos. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), pesquisa cujos dados são originários das empresas, o número de empregos com carteira de trabalho assinada gerado no mês de outubro atingiu 395 mil, o maior da série histórica que teve início em 1992. Além disso, o setor de serviços gerou 156 mil empregos, um claro sinal de retomada do setor. E a geração de empregos formais está acelerando. Foram 131 mil em julho, 249 mil em agosto, 314 mil em setembro e 395 mil em outubro.

Entretanto, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, uma pesquisa mais abrangente que cobre todos os tipos de vínculos empregatícios, formais, informais e por conta própria, cuja metodologia se baseia numa amostra de domicílios, têm apresentado números bem menos robustos que o Caged. Segundo essa pesquisa, o aumento da ocupação tem sido lento e a geração de empregos formais continua em território negativo.

Mas estes dados são médias trimestrais e a última divulgação corresponde ao terceiro trimestre de 2020, cobrindo os meses de julho a setembro. Esta pode ser uma defasagem importante num momento de forte retomada. Porém, dada a importância do comportamento do mercado de trabalho neste momento, essa dicotomia entre as duas pesquisas é preocupante.

A divulgação da Pnad-Covid do mês de outubro, uma pesquisa com metodologia similar à da Pnad Contínua, mas que apresenta dados com periodicidade mensal, começa a mostrar um comportamento mais próximo do Caged. Segundo essa pesquisa, a população ocupada cresceu 1,2 milhão de pessoas no mês de outubro, sendo 401 mil trabalhadores com carteira assinada, 367 mil sem carteira assinada e 366 mil trabalhadores por conta própria.

São sinais promissores, mas ainda longe de garantir a manutenção do crescimento em 2021. Afinal, tem uma pandemia no caminho.

*PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA-CHEFE DA GENIAL INVESTIMENTOS

Estadão
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