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Relator diz que vai manter taxação de dividendos, mas apoia 'enxugar' medidas de controle da Receita

Para Celso Sabino, parte principal da proposta de reforma do Imposto de Renda é a 'redistribuição fiscal'; ele também diz conversar, diariamente, com a equipe econômica e agentes do mercado sobre o projeto

7 jul 2021 - 13h03
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BRASÍLIA - O relator da reforma do Imposto de Renda, Celso Sabino (PSDB-PA), disse que vai manter no parecer a taxação de lucros e dividendos, mas deve retirar medidas incluídas pela Receita Federal para o combate à elisão fiscal, termo técnico para designar o planejamento tributário com o intuito de reduzir o peso da carga de impostos no orçamento.

"A parte principal da proposta é a redistribuição fiscal. Cobrar um pouco de quem pode pagar mais e fazer quem recebe menos pagar menos", disse ao Estadão/Broadcast. Abaixo, trechos da entrevista:

Os setores produtivo e financeiro ficaram muito revoltados com o projeto. O sr. pretende ampliar o debate para preparar o relatório?

Vamos esgotar o debate. Estamos conversando com vários atores do segmento econômico e também com as pessoas que estão na outra ponta, que estão recebendo o benefício da atualização da tabela do Imposto de Renda com a redução da alíquota da pessoa física. Essa ponta não tem nenhuma crítica ao projeto. Agora, quem está na outra ponta com a tributação dos lucros e dividendos tem várias ponderações. Estamos buscando realmente construir um consenso. Isso demanda um esforço muito grande de ouvir, dialogar, buscar convergências. Eu acabei de chegar aqui da nossa 22ª reunião com representantes de fundos de investimentos imobiliários, do banco Itaú, do BTG, do Credit Suisse. Estou coletando todas as críticas, todas as sugestões e também ouvindo diariamente a equipe econômica, fazendo cálculos.

Quais os ajustes que serão feitos?

A proposta que chegou necessariamente passará por um aperfeiçoamento. Estamos tentando deixá-la mais benéfica para aquelas pessoas que já estão sendo beneficiadas e menos impactante para aquelas pessoas que estão sofrendo algum impacto.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, disse que quer votar os dois projetos de reforma até o dia 15 de julho. Já o sr. falou em tempo de maturação. Tem um desencontro?

Eu e o presidente Arthur [Lira] dialogamos diariamente. Não há qualquer desafinamento no nosso pensamento. Nós temos vários temas importantes tramitando na Câmara, além da reforma tributária. Ele elegeu esses temas como prioridade e a sociedade brasileira aguarda há muitos anos reformas tributária, administrativa e eleitoral e tende pautar suas matérias na primeira hora possível. E essa primeira hora possível será quando essas matérias estiverem efetivamente maduras.

Será antes do recesso?

Vai ter recesso? O presidente tuitou que não vai ter recesso enquanto não votar a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias).

Que ajuste pode ser feito na taxação do lucro e dividendos?

A quase totalidade dos países no mundo tributa a distribuição de lucros e dividendos. São raríssimos os países que não fazem essa modalidade de tributação. A alíquota média é de 20% a 40% A proposta do governo já prevê uma alíquota de 20%, pegando pelo patamar mais baixo da média global. Eu acredito que dificilmente vamos nesse momento escapar de tributar os lucros e dividendos. Porém, toda a arrecadação prevista com a tributação futura dos lucros e dividendos servirá igualmente para compensar o benefício que está sendo dado com a redução da alíquota de Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas de forma linear de 25% para 20% e compensar a atualização da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física.

Os empresários alegam que haverá aumento da carga tributária com a tributação de lucros e dividendos?

Não há ânimo algum na Câmara para aumento de arrecadação e nós já conseguimos o primeiro consenso. Tanto o presidente Arthur Lira como o ministro Paulo Guedes têm esse entendimento de produzir zero de aumento de carga tributária. Na verdade, o que está se falando é uma redistribuição da tributação para tornar mais justa essa lei. Três mil pessoas no Brasil receberam R$150 bilhões na sua declaração sem serem tributados.

Já há consenso para a queda da alíquota?

Nós estamos trabalhando para ampliar a redução da alíquota do IRPJ. A proposta prevê 5 pontos porcentuais. Nós estamos fazendo os cálculos aqui para que esse número seja maior.

Para 10 pontos?

Há essa possibilidade. Estamos fazendo o cálculo. A cada dois e meio pontos de redução de alíquota, o impacto é de aproximadamente R$ 19 bilhões.

A faixa de isenção de R$ 20 mil por mês para a tributação sobre dividendos pagos por pequenos negócios empresas pode subir?

Essa previsão de faixa sem isenção é apenas para o universo de micro e pequenas empresas. É um universo bem reduzido. Qualquer alteração aqui para mais ou para menos, não impacta tanto no orçamento. Mas, por outro lado, pode gerar um movimento ali mais favorável à privatização. É um universo pequeno numericamente comparado com os demais. O movimento agora é de fazer contas. Eu não finalizei. Há contas que estou tendo a necessidade de refazê-las. A Receita faz às vezes uma conta muito conservadora e a gente vai para a prática e o cálculo não bate. Estou tendo a necessidade de conferir e reconferir o cálculo.

O sr. não vai desistir da taxação de dividendo?

Se a gente tirar, como será a tributação de todos os outros países do mundo tributam, não temos como dar o benefício para pessoa jurídica e as pessoas físicas.

O sr. vai mudar a restrição do uso da declaração simplificada para quem ganha até R$ 40 mil por ano?

Estamos analisando.

O sr. pode tirar do projeto o fim da dedutibilidade de Juros sobre Capital Próprio?

Nós estamos estudando cada item da proposta. O fim da dedução do JCP, que foi instituído em 1995, na prática, perde a sua essência teleológica. Ele surgiu para atualizar o capital que estava ser investido e para fomentar o investimento em capitais, em produção. Como a inflação hoje está estável, ele perde a sua função de atualização de seu capital e também há muitos anos ele já tinha deixado de servir para fomentar investimentos. Nós estamos debruçados sobre os números para promover segurança jurídica, simplificar o procedimento tributário, da obrigação principal, mas especialmente as obrigações acessórias.

O que o sr. poderá mudar ainda?

O projeto que foi encaminhado tem os aspectos principais que envolvem questões orçamentárias e financeiras para mais e para menos. E há alguns aspectos que são mais de controle, de fiscalização, de combate à elisão. Existe uma lupa forte em cima desses pontos que não são os principais para promover um enxugamento.

O sr. está falando de enxugamento de que medidas do projeto, no aperto do planejamento tributário, do ágio, da reorganização societária?

Tudo isso é acessório. O principal do projeto é reorganização tributária no sentido de uma redistribuição. Vamos zerar. A parte principal da proposta é a redistribuição fiscal. Cobrar um pouco de quem pode pagar mais e fazer com que quem recebe menos pague menos.

Vai dar uma tranquilizada nas resistências?

Tem muita gente falando 'ah o Celso é auditor, é muito ligado ao José Tostes (secretário da Receita) para proteger a Receita. Isso mostra o nosso cartão de visita na hora que fizermos isso. Todo mundo já está aceitando essa questão da tributação do lucro e dividendos. Os questionamentos são outros. Há uma possibilidade de grande convergência. Talvez essa seja a reforma mais importante para o Brasil nos últimos anos.

Estadão
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