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Greve derruba crescimento do Brasil e levanta mais dúvidas sobre política fiscal, dizem economistas

30 mai 2018 - 16h34
(atualizado às 16h46)
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A paralisação dos caminhoneiros e a consequente crise de desabastecimento prejudicaram a retomada da economia e têm o potencial de contaminar a confiança do setor produtivo nos próximos meses de um ano já conturbado pelas incertezas com as eleições presidenciais, segundo analistas ouvidos pela Reuters.

Paralisação nacional de caminhoneiros
23/05/2018
REUTERS/Ueslei Marcelino
Paralisação nacional de caminhoneiros 23/05/2018 REUTERS/Ueslei Marcelino
Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

De modo geral, as contas sobre o comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano estão sendo reduzidas para em torno de 2 por cento, sobre cerca de 3 por cento esperados até pouco tempo atrás, e há quem fique ainda mais abaixo.

"Os alimentos que estragaram, ovos, pintinhos, legumes, hortaliças, o que se estragou nos caminhões, tudo isso é perda de PIB", disse o economista e sócio da 4E Consultoria, Juan Jensen, acrescentando que também um importante conjunto de serviços não será recuperado.

Segundo ele, as perdas durante a greve somam pelo menos 30,5 bilhões de reais em dez dias, ou o equivalente a 0,45 por cento do PIB, o que explica a redução de sua previsão de crescimento da economia neste ano a 1,45 por cento, ante 1,9 por cento.

"O impacto é muito maior que os 30,5 bilhões (de reais). Esse é o valor monetário das perdas não recuperáveis", acrescentou.

A recente decisão de subsidiar o preço do diesel praticado pela Petrobras e de cortar impostos, sem haver espaço no Orçamento, para acabar com a greve dos caminhoneiros criou riscos para o cumprimento das obrigações fiscais do governo neste ano, seara que promete dor de cabeça ao sucessor de Michel Temer a partir de 2019 e traz ainda mais insegurança para os agentes econômicos.

As benesses aos caminhoneiros também enfraquecem a perspectiva fiscal do Brasil na visão da Moody's.

"Aquilo que o governo precisava fazer para ser mais austero não faz. Por que não? Porque está exposto e enfraquecido", avaliou o economista-chefe da Austin Ratings, Alex Agostini.

"(A greve) claro que coloca mais lenha na fogueira do ambiente fiscal, fica ainda mais evidente que o governo precisa ter queda de braço com as regalias que todo mundo vem dizendo, que é o custeio... mas não tem mudado, tem mantido as benesses."

As medidas adotas pelo governo para baratear o diesel têm custo fiscal total de 13,5 bilhões de reais, e reduziram muito a folga para o cumprir da meta de déficit primário de 159 bilhões de reais este ano. Mais: aumentaram em muito o custo político.

"O sinal que conta é de um governo absurdamente frágil, o desgaste não é tanto em relação à meta, mas em relação ao custo político de tentar fazer o que foi combinado, que dói em todo mundo", afirmou o economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves, referindo-se a eventuais aumentos de tributos para custear a desoneração da Cide e do PIS/Cofins.

Já há avaliação dentro do governo de que o impacto da greve dos caminhoneiros na atividade será grande e não se descarta a possibilidade de contração no segundo trimestre, diante do efeito disseminado dos protestos na produção, agropecuária, comércio e serviços.

"Impacto no PIB do segundo trimestre vai haver e não será pequeno. Estou até com medo do resultado que vem por aí", afirmou uma fonte do governo, que pediu anonimato. "Um PIB perto de zero ou até mesmo negativo não pode ser descartado."

O protesto dos caminhoneiros ocorreu ao mesmo tempo em que o governo reduzia para 2,5 por cento, ante 3 por cento, a projeção oficial de crescimento da economia, diante de sinais de que a retomada não vinha sendo tão forte como se imaginava. O número serve de referência tanto para estimativas de arrecadação de impostos quanto despesas públicas.

Pesquisa Focus do Banco Central, que ouve uma centena de economistas todas as semanas, é um sinal do impacto da greve na atividade econômica, com as projeções de crescimento deste ano caindo a 2,37 por cento na semana passada, sobre 2,50 por cento.

A economia brasileira acelerou ligeiramente no primeiro trimestre, avançando 0,4 por cento sobre os três meses anteriores, em linha com estimativas do mercado.

Em linha oposta, o diretor de Macroeconomia do IPEA, José Ronaldo de Castro, acredita que o baque econômico causado pelas interdições de rodovias pode ser recuperado nos meses seguintes, em especial quando se concretizarem os efeitos do mais longo período de corte de juros da história, encerrado há duas semanas com a Selic na mínima recorde de 6,5 por cento.

EFEITO NULO NOS PREÇOS

Os picos de preços nos dias de protestos devem ser compensados ao longo das semanas seguintes, fenômeno semelhante ao que deve ocorrer com o diesel, sem afetar a inflação fechada do ano, que precisa ficar entre 3 e 6 por cento para que o BC cumpra sua meta. Em 12 meses até meados de maio, a inflação oficial caiu a 2,70 por cento, ante 2,80 por cento até meados de abril.

Este cenário de inflação comportada e a perspectiva mais difícil para a aceleração da retomada econômica leva economistas a cogitar que o Banco Central pode não apenas adiar eventuais altas de juros neste ano, como também discutir possíveis novos cortes na Selic.

"O BC deve voltar a discutir (corte da Selic), não reduzir efetivamente, mas discutir o próximo passo da política monetária, vamos ter dois terços do trimestre com atividade econômica fraca, PIB menor ainda no ano", disse Agostini, da Austin Ratings.

"Se o terceiro trimestre também patinar, a expectativa de alta dos juros vai ser adiada", acrescentou.

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