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Governo superestimou despesas para evitar 'sanha' em 2022

A suspeita é da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, que em relatório divulgado nesta segunda-feira, 19

19 abr 2021 - 15h15
(atualizado às 15h31)
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O governo pode ter superestimado os gastos obrigatórios com o pagamento dos benefícios previdenciários em 2022 na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para evitar uma "sanha" por aumento de despesas em ano eleitoral, principalmente gastos com reajustes salariais dos servidores públicos.

O ministrio da Economia, Paulo Guedes. 
O ministrio da Economia, Paulo Guedes.
Foto: Marc Camargo/Agência Brasil / Estadão Conteúdo

A suspeita é da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, que em relatório divulgado nesta segunda-feira, 19, afirma que a previsão de gastos da Previdência está superestimada em, no mínimo, R$ 15,6 bilhões. A diferença entre os gastos projetados pelo Ministério da Economia e os cálculos do órgão do Senado pode ser ainda maior e chegar a R$ 21,1 bilhões.

A maior preocupação hoje é com o salário dos servidores, que estão congelados desde o ano passado e poderão ser reajustados a partir do ano que vem.

As despesas obrigatórias no projeto de LDO de 2022, enviado na semana passada ao Congresso, são R$ 35,2 bilhões maiores do que as projetadas pela IFI no seu relatório fiscal - desse total a maior parte da diferença está em gastos da Previdência.

"É uma estratégia para conter a sanha por aumento de gastos, que certamente aparecerá, como aconteceu com o Orçamento de 2021", disse ao Estadão o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto. Com despesas projetadas para cima pelo governo, ressaltou Salto, a folga no teto de gastos projetada é igual a zero. O teto é regra prevista na Constituição que limita o crescimento das despesas à variação da inflação.

Para Salto, a superestimativa da Previdência ajudou a "mostrar" uma inexistência de folga no teto, quando, na verdade, haverá espaço. "Esse espaço poderá ensejar aumentos de salários, por exemplo, em ano eleitoral", avaliou.

Para o diretor-executivo da IFI, esse risco poderia ter sido evitado se a PEC emergencial tivesse sido bem calibrada para que os gatilhos (medidas de corte de gastos) fossem acionados já em 2022. Na sua avaliação, o governo vai tentar, como está fazendo no projeto da LDO 2022, mostrar que não haveria folga. "É uma tentativa inglória, porque o projeto ainda tramitará e, em agosto, vem o projeto de lei orçamentária", acrescentou.

Segundo a IFI, o governo fez um cenário mais pessimista para a Previdência Social. Nos cálculos do Ministério da Economia, a taxa de crescimento vegetativo dos benefícios do INSS é de 2,7% e a inflação considerada para reajustar os benefícios (até um salário mínimo e acima do mínimo) é de 4,3% (INPC de 2021). Nos cálculos da IFI, a taxa vegetativa nas projeções para 2022 é bem menor, de 1,8%.

Para a IFI, a evolução recente dos pagamentos de benefícios do INSS indica que a reforma da Previdência de 2019 já pode ter começado a surtir efeitos, de modo que essa dinâmica tem de ser contemplada nas projeções. A IFI lembra que o governo estimou gastos previdenciários mais altos para 2020, que não se confirmaram.

Os gastos com a Previdência estão também no centro do impasse no Orçamento de 2021, aprovado com corte de despesas obrigatórias, principalmente previdenciárias, para aumentar as emendas parlamentares. Para justificar o corte e a sanção do Orçamento pelo presidente Jair Bolsonaro, as lideranças do Centrão afirmam que as previsões de despesas estavam superestimadas.

A IFI prevê uma folga de R$ 38,9 bilhões no teto em 2022. É quanto o governo poderá gastar a mais. Esse espaço seria dado pela diferença entre o índice de inflação a corrigir o teto e aquele que indexa as despesas obrigatórias.

A IFI, porém, faz um alerta: o contexto fiscal complexo requer que se evite o uso da folga do teto. O diagnóstico é que o cenário fiscal será ainda bastante desafiador, com dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) crescente e déficit primário elevado. "A dívida acima de 90% do PIB, não avaliza uso automático da folga do teto em 2022", diz o relatório.

"O fenômeno contábil e fiscal derivado da provável folga no teto não deveria ser encarado, necessariamente, como espaço fiscal efetivo para promover aumento de despesas", recomendou a instituição.

Se houver necessidade de gastos no âmbito das respostas à covid-19, por outro lado, a IFI defende a necessidade de um planejamento transparente. "O risco é a pulverização desse espaço fiscal em despesas pouco relacionadas à recuperação da economia", afirma.

Para Salto, a estratégia de buscar aumento de discricionárias (despesas que não são obrigatórias e incluem investimentos e o custeio da máquina pública) poderá se repetir em 2022, mas com a diferença de que haverá folga no teto. Há espécie de antídoto preventivo na LDO, que passou a limitar a estratégia de subestimar despesas obrigatórias. " Mas isso não vai bastar, lembrando também que o texto ainda poderá modificado pelo Congresso", disse

No relatório, a IFI destaca também que o prêmio pelo risco cobrado pelos investidores para comprar os títulos públicos aumentou, refletindo incerteza quanto à política econômica doméstica e também a alta da taxa Selic iniciada pelo Banco Central. Os leilões de títulos públicos mostraram novos aumentos nas taxas de juros em março e abril.

Para 2021, a IFI vê risco de que novas despesas sejam necessárias além do planejado, como novas rodadas do auxílio emergencial e de outros tipos de despesas relacionadas à manutenção de empregos e suporte a empresas.

Estadão
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