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Governo intervém em conselho e diz que vai iniciar 'nova era' na Petrobrás

Segundo o novo presidente da estatal, Roberto Castello Branco, a União determinou uma mudança no perfil do colegiado da empresa, para adequá-lo às novas diretrizes; os substitutos já foram selecionados e serão anunciados nos próximos dias

12 jan 2019 - 04h11
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RIO E SÃO PAULO - O governo Jair Bolsonaro decidiu intervir no conselho de administração da Petrobrás, substituindo alguns dos atuais conselheiros por executivos com visão alinhada à nova equipe econômica. Os novos nomes já foram selecionados e serão anunciados nos próximos dias, apurou o Estado. Com as trocas, o governo pretende adequar o colegiado às novas diretrizes delineadas para a petroleira.

Os nomes que serão apresentados pela União substituirão conselheiros com mandato vigente até 2020, mas que decidiram renunciar agora de seus cargos após serem avisados de que o governo gostaria de substituí-los.

O novo presidente da estatal, Roberto Castello Branco, confirmou em entrevista ao Estado a determinação da União de alterar a composição do colegiado. "O acionista controlador deseja mudar. A intenção é mudar o perfil do conselho para que tenhamos mais representantes com visão estratégica do que a Petrobrás precisa", afirmou. "Um novo ciclo se encerrou e iniciamos uma nova era", disse.

Castello Branco refutou a ideia de que o governo vá promover uma tentativa de aparelhamento da estatal. Segundo ele, os novos integrantes terão perfil técnico. "São gestores experientes e acima de qualquer suspeita, cujos nomes serão anunciados ao mercado e submetidos à apreciação dos órgãos de governança da companhia", afirmou.

No momento, há dois assentos vagos, mas há expectativa de que mais um conselheiro apresente sua renúncia em breve. Eles tomaram a decisão de se afastar após pedido feito pelo próprio Castello Branco, que se colocou como "mensageiro" do controlador, de acordo com três fontes do colegiado ouvidas pelo Estado.

A União tem direito de indicar oito dos onze assentos no conselho de administração da Petrobrás - outros três postos são destinados a representantes dos acionistas minoritários e dos empregados da estatal. Ao assumir a presidência, Castello Branco passou a ocupar um dos oito postos. Segundo o estatuto da Petrobrás, 40% dos assentos têm de ser preenchidos por conselheiros independentes, escolhidos por meio de agência de recrutamento e lista tríplice.

Ao assumir o comando da companhia, Castello Branco afirmou que, durante o governo Michel Temer, Pedro Parente e Ivan Monteiro atuaram para resgatar as finanças da empresa e que ele, agora, deseja transformá-la numa "campeã". Isso incluirá focar na exploração do pré-sal e intensificar a venda de ativos, reduzindo drasticamente a participação em algumas áreas, como a de refino. Para essa tarefa, precisará de votos favoráveis no conselho.

Castello Branco não quis antecipar o nome dos executivos escolhidos para integrar o conselho. Segundo apurou o Estado, a ideia do governo é anunciar já no início da semana que vem o nome de três novos integrantes, incluindo o novo presidente do conselho.

Conselheiros ligados ao PT

O movimento para alterar a composição do conselho de administração da Petrobrás foi iniciado nos primeiros dias do ano com o objetivo de colocar no colegiado nomes com visão alinhada ao governo de Jair Bolsonaro. As mudanças logo miraram conselheiros que nutriam ligação com a gestão petista.

Antes mesmo da posse oficial de Roberto Castello Branco na presidência, foram apresentados os pedidos de renúncia de Luiz Nelson Guedes de Carvalho, que ocupava o cargo de presidente do conselho, e de Francisco Petros Papathanasiadis. Ambos o fizeram atendendo a um pedido do governo.

A pressão para a renúncia passou a recair então sobre outros nomes, como Segen Estefen e Durval Soledade. A informação foi revelada pelo jornal Valor Econômico e confirmada pelo Estado. Há expectativa de que ao menos um deles apresente seu pedido de afastamento nos próximos dias.

O comando da estatal não descarta convocar uma assembleia para afastá-los, mas a decisão não está tomada.

Carvalho e Petros compuseram o colegiado na gestão do ex-presidente Ademir Bendine, quando Castello Branco também fazia parte do conselho. Bendine acabou preso pela Lava Jato. Carvalho ascendeu à presidência do conselho da estatal ainda no governo Dilma.

Stefen é professor da Coppe/UFRJ e ligado a Luiz Pinguelli Rosa, ex-presidente da Eletrobrás no primeiro governo Lula. Ele foi eleito conselheiro da Petrobrás durante o governo de Dilma Rousseff, em 2015.

Já Soledade ocupou cargos de confiança no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de 1973 a 2008. O executivo também foi diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) durante o governo Lula, mas entrou para o conselho da petroleira já no governo Michel Temer.

De acordo com uma fonte ligada ao colegiado, as conselheiras Ana Zembelli e Clarissa Lins, contratadas recentemente por meio de agência de recrutamento na Petrobrás, devem permanecer em seus cargos.

Mercado

Investidores e especialistas em governança corporativa receberam com naturalidade as mudanças no conselho de administração da Petrobrás. Após a notícia, a cotação da petroleira na Bolsa quase não se alterou nesta sexta-feira. A queda ao fim do pregão foi de 1,07% das preferenciais e de 0,63% das ordinárias, refletindo o movimento do barril de petróleo no mercado internacional.

A visão de especialistas de governança é que há uma cultura na empresa de mudar os cargos de liderança quando muda o governo. "É natural também que o conselho de administração seja modificado. Um rodízio é sempre importante", avaliou o presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Rio de Janeiro (Apimec-Rio), Helio Darwich. Ele argumenta que a mesma lógica é utilizada em multinacionais.

Para Erasmo Valladão Azevedo e Novaes e França, especialista em direito societário pela USP, a participação do presidente da companhia na substituição de parte do conselho pode sinalizar ingerência política na cúpula da petroleira. "O fato de o presidente pedir para um membro do conselho sair e para que nomes sejam indicados sinaliza uma interferência em um assunto que é da assembleia de acionistas", afirmou.

A escolha do conselho é atribuição da assembleia. Em última análise, acaba sendo da União, que é o acionista controlador da estatal. "Sociedades de economia mista, como a Petrobrás, são conflituosas. Elas convivem com o embate entre o atendimento dos interesses sociais e dos acionistas, que estão prioritariamente preocupados com o lucro e a distribuição de dividendos", diz França.

Na tentativa de não privilegiar um ou outro lado, a Petrobrás incluiu no seu estatuto a figura do conselheiro independente, definido no regulamento da B3, que teria um perfil de mercado. Para ser caracterizado como independente, porém, basta não ter ligação evidente com os acionistas, o que, no dia a dia, não garante necessariamente autonomia de decisão.

Estadão
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