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Produção de combustível nuclear para Angra está ameaçada

Estatal que faz pastilhas de urânio teve orçamento cortado e pediu socorro ao Ministério da Economia

19 set 2019 - 09h44
(atualizado às 10h20)
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BRASÍLIA - A estatal federal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), responsável pela extração e produção do combustível nuclear usado nas usinas de Angra 1 e 2, não tem mais dinheiro para produzir as pastilhas de urânio que abastecem as unidades da Eletronuclear, no Rio de Janeiro.

A INB é a única fabricante dessas pastilhas no País e a extração do urânio e sua manipulação são monopólios da União. As usinas nucleares de Angra 1 e 2, as duas únicas plantas desse tipo no Brasil, dependem diretamente da produção da INB, que tem uma base de extração em Caetité, na Bahia.

O complexo nuclear de Angra dos Reis
O complexo nuclear de Angra dos Reis
Foto: Sergio Moraes / Reuters

A situação crítica dos cofres da estatal ficou evidente, em uma reunião realizada no dia 20 de agosto, com toda a cúpula do setor elétrico e do governo. O encontro teve presença de representantes do Ministério de Minas e Energia, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), do Ministério da Economia e das autarquias ligadas ao (MME).

No encontro, conforme apurou o Estado, a INB afirmou que "está em sérias dificuldades para honrar os contratos firmados com a Eletronuclear no fornecimento dos elementos combustíveis para atender as Usinas de Angra 1 e 2, por força das restrições orçamentárias".

Ao detalhar os sucessivos cortes financeiros promovidos pelo governo, a INB foi clara e alertou que "sem recursos orçamentários, não poderá atender ao pedido de recarga das usinas nucleares".

A Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração (Spoa) do Ministério da Economia declarou que reconhece o problema e que "tanto a equipe econômica do governo federal, como a Casa Civil da presidência da República estão cientes da gravidade da situação, dada a escassez de recursos orçamentários".

O valor autorizado pelo governo, na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2019 para as despesas que não são obrigatórias da INB foi de R$ 366,8 milhões. Com os dois contingenciamentos ocorridos neste ano, porém, o valor hoje autorizado é de, no máximo, R$ 259,5 milhões. Com esse recurso, a estatal tem de produzir não apenas o combustível nuclear, mas bancar todas as despesas.

No Ministério da Economia, o pedido encaminhado para a ampliação dos limites da INB neste ano é de R$ 350 milhões, "dada a importância e das possíveis consequências que poderão advir do não atendimento desse pleito".

As dificuldades não estão restritas à INB. O próprio ministério, durante a reunião, também pontuou suas restrições. "Mantido esse valor de limite o Ministério de Minas e Energia - MME enfrentará sérias dificuldades no exercício de 2020 para cumprir os seus objetivos e obrigações legais, contratuais e institucionais", declarou.

Questionado sobre o assunto, o MME declarou que "vem envidando esforços junto ao Ministério da Economia para atendimento das necessidades orçamentárias e financeiras da INB". A pasta reconheceu que, com os recursos atuais, não tem condições de atender as demandas da estatal. "O MME não possui capacidade orçamentária para suportar a demanda da INB, cabendo ao Ministério da Economia avaliar o atendimento da nossa solicitação."

Entrega duas vezes ao ano

O processo produtivo do combustível nuclear fabricado pela INB é longo, o que exige planejamento e aquisições de insumos com antecipação. De modo geral, as entregas à Eletronuclear ocorrem, em média, duas vezes ao ano, com duas recargas parciais, uma para a Usina de Angra 1 e outra para a Usina de Angra 2.

Por meio de nota, o diretor técnico e presidente da INB em exercício, Ricardo Soares Ferreira, declarou que a INB "está em tratativas com o Ministério de Minas e Energia, de modo a reestabelecer seu orçamento em níveis compatíveis às necessidades de produção e garantir sua entrega, como sempre foi feita, mantendo assim todos os compromissos contratuais com a Eletronuclear".

A despeito dos contingenciamentos, a estatal informou que já produziu e entregou, em abril deste ano, uma recarga para Angra 2, denominada 15.ª Recarga de Angra 2. Em relação à recarga de Angra 1, a INB informou que está finalizando a produção neste mês e que 97% da recarga já está produzida. Essa é a 25.ª recarga de Angra 1, que, segundo a estatal, será entregue sem atrasos.

"Em se tratando da produção da 16.ª Recarga de Angra 2, que tem previsão de entrega em maio de 2020, a INB já adotou as medidas visando as aquisições de matérias-primas e componentes. A previsão do início da sua produção é em dezembro de 2019", declarou Ricardo Soares Ferreira.

Apesar de não ter recursos para produzir o combustível de Angra 1 e 2, o governo chegou a afirmar, no começo do ano, que pretende retomar o plano de construir entre quatro e oito novas usinas nucleares no País. As duas usinas nucleares em operação respondem por 1,1% da geração nacional de energia. A usina de Angra 3, com obras paralisadas, segue sem uma definição.

O plano de expansão de energia por fonte nuclear passou os últimos anos na gaveta, por causa dos desdobramentos do acidente da usina de Fukushima, no Japão, em 2011. O governo da ex-presidente Dilma Rousseff chegou a cogitar a sua retomada, o que não ocorreu. Em 2015, o MME declarou que já tinha 21 locais no País estudados para receber as plantas e que as análises estavam em andamento.

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