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É preciso seguir o Código Florestal e combater desmatamentos

Precisamos tornar efetivo o cumprimento do Código Florestal, e não contestar a legislação e gerar mais inseguranças jurídicas

12 mai 2021 - 04h10
(atualizado às 07h38)
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) está prestes a decidir, com repercussão geral, isto é, para todos os processos em que a questão está em julgamento, e são centenas de processos, sobre a possibilidade de se reconhecer a retroatividade de normas no Código Florestal (CF) alcançando situações consolidadas praticadas sob legislação anterior. Em São Paulo, o Ministério Público Estadual entrou com Ação Civil Pública contra o decreto do governador que regulamenta o Programa de Regularização Ambiental (PRA) no Estado, em especial a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Floresta Amazônica incendiada perto de Porto Velho
 10/9/2019   REUTERS/Bruno Kelly
Floresta Amazônica incendiada perto de Porto Velho 10/9/2019 REUTERS/Bruno Kelly
Foto: Reuters

Após participativo debate no Congresso Nacional, o Código Florestal foi aprovado em maio de 2012 por ampla maioria de votos. A primeira versão do atual Código Florestal foi aprovada na Câmara Federal por 410 votos contra 63; e no Senado, por 59 a 7. O acordo político obtido precisa ser visto como a consolidação do que existia de positivo e o desenvolvimento de regras atualizadas para preservação florestal. O foco hoje precisa ser tornar efetivo seu cumprimento, eliminando ilegalidades ainda persistentes, e não contestar a legislação ampliando a insegurança jurídica.

Logo após a aprovação do CF no Congresso, o Ministério Público Federal entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com diversas Ações Direta de Inconstitucionalidade (Adins) contestando artigos do Código Florestal. Foram anos de insegurança jurídica. Em agosto de 2019, foi publicado Acórdão considerando constitucional o novo Código Florestal na quase totalidade.

Evoluímos no que agora pretendem retroceder. O Código Florestal foi desenhado, votado, julgado, atingindo situações consolidadas no passado olhando para o futuro.

O conceito de área consolidada, tratado no artigo 68, garante o direito de produzir em área desmatada, desde que esse processo de desmatamento tenha ocorrido dentro da legislação da época. Significa não precisar possuir uma Reserva Legal do porcentual da área da propriedade especificada no Código Florestal atual, desde que o desmatamento tenha ocorrido dentro da lei da época. Não se trata de alegar que existiriam anistias a crimes ambientais. Crimes tributários, eleitorais ou mesmo penais prescrevem. Não se trata de prescrição de crimes de qualquer espécie. A ocupação foi legal. No caso de o desmatamento ter ocorrido em desrespeito à legislação da época o crime permanece. A evolução do conhecimento e a compreensão da sociedade nos temas ambientais avançaram. A legislação se adequou.

Decreto de 1934 introduziu o conceito de Reserva Legal sem a conotação ambiental, pois visava a estabelecer reserva de madeira. Possibilitava a derrubada de 75% da área coberta por mata sem qualquer menção a outro tipo de vegetação.

Foi substituído 30 anos depois, em 1965, no que se chamou o novo Código Florestal. Este inovou estabelecendo porcentuais de proteção das matas conforme a região do País em que se encontrasse a propriedade rural. Obrigava conservar 20% das matas existentes situadas no Sul do País, no leste meridional e na parte sul do Centro-Oeste. Para a Bacia Amazônica proibiu a exploração sob forma empírica das florestas primitivas, exigindo planos técnicos de condução e manejo a serem estabelecidos pelo Poder Público.

Foi sendo gradativamente modernizado por diversas novas legislações, em especial a Lei 7.803 de 1989, que introduziu de maneira definitiva o conceito de Reserva Legal tratando como porcentual de área mínima a ser preservado no interior da propriedade rural. Não somente as áreas de mata deveriam ser preservadas, mas qualquer que fosse a forma de vegetação existente na área, inclusive as áreas de Cerrado.

Retroagir, retroceder, além de representar insegurança jurídica, pois coloca enorme número de propriedades no limbo, tem implicações socioeconômicas certamente não avaliadas. A ocupação de extensas áreas do território no século passado foi realizada dentro da legislação existente. Não é correto pretender enquadrar esse extenso território dentro de um conceito florestal que foi alterado no Congresso Nacional pensando no futuro, e não para condenar o passado.

Será triste ver ignorarem a realidade. Serão anos de insegurança jurídica aguardando a intervenção do STF, ou mesmo do Congresso Nacional, pois certamente é impossível essa pretendida volta para o passado. Reitero, o imprescindível hoje é cumprir o Código Florestal, enfrentar os desmatamentos ilegais, e não ampliar a insegurança jurídica, que já não é boa.

*PRODUTOR RURAL, EX-SECRETÁRIO DE PRODUÇÃO DO MAPA, EX-PRESIDENTE DE ENTIDADES DE CLASSE

Estadão
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