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Crescer é preciso

Emprego formal não virá sem crescimento econômico, que, por seu lado, não brotará espontaneamente

20 out 2019 - 05h11
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Estes tempos de incertezas e de excesso de informações virtuais, criando um senso de urgência e um estado de ansiedade, estão levando as pessoas à busca de soluções mágicas. Espera-se, por exemplo, que uma bala de prata faça a economia voltar a crescer rapidamente, restabelecendo o nível pré-crise de emprego formal. No entanto, crescimento econômico não é um processo natural, espontâneo; resulta de decisões corretas e coerentes dos agentes públicos e privados ao longo dos anos.

A história recente - nada animadora - do crescimento brasileiro expõe, sem retoques, o pífio desempenho da economia nas últimas quatro décadas. Depois de crescer 7% ao ano entre 1950 e 1979, a economia perdeu fôlego. A média anual de crescimento de 1980 a 2019 ficará em 2,2%, e da renda per capita, em 1,5%. A produtividade média da economia permanece estagnada. Mas não é só. Outro fator perturbador do crescimento brasileiro é sua alta volatilidade. Nas últimas quatro décadas, a economia cresceu acima de 5% em sete anos e ficou abaixo de zero em oito anos. Nos demais 25 anos, a expansão variou no intervalo entre zero e 5%. Além de pífio, o crescimento é espasmódico.

Consequências desse padrão errático de crescimento, entre outras, são a queda da produção industrial e o aumento do emprego informal. Conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), os impactos da recessão recente no mercado de trabalho formal não foram proporcionais à distribuição dos empregos pelos setores da economia. Dos 2,330 milhões líquidos de vagas fechadas, 955 mil foram na indústria de transformação e 866 mil, na construção civil, responsáveis juntas por 78% dos empregos perdidos, embora representem 24% do emprego formal. Ao contrário, os setores de comércio e serviços, que representam 68% do emprego formal, perderam 20% de todas as vagas fechadas.

O emprego no setor público ficou quase estável. Sua participação no total da queda dos empregos formais foi de 1,2%. O emprego público, protegido pela estabilidade, não sofre o impacto da retração econômica. A pequena redução deveu-se às aposentadorias cujas vagas não foram ainda preenchidas.

No período de 2014 a 2018, apenas a agropecuária apresentou aumento no emprego formal, com acréscimo de 2,2%. Historicamente, esse setor tem sido o único a somar ganhos de produtividade e crescer nas crises. Aumentos de produtividade têm garantido expansão expressiva na produção e na competitividade da agropecuária.

No setor privado, no qual a produtividade cresce, o volume de emprego aumenta. No caso da indústria de transformação e da construção civil, em que há estagnação da produtividade e baixa competitividade, há também maior queda da produção e do emprego.

Um novo ciclo de expansão econômica somente virá se houver profundas mudanças no Estado e nos processos produtivos, principalmente na indústria de transformação, com incorporação das novas tecnologias digitais. Os impactos dessas possíveis mudanças sobre o emprego são ainda imprevisíveis. Supõe-se que a demanda será seletiva, exigindo trabalhadores com maior qualificação técnica, emocional e adaptativa. Estes novos empregos não serão para todos.

Enfim, a expansão do emprego formal decorre do crescimento que depende da produtividade, que, por sua vez, depende de decisões coordenadas entre governo e setor privado. Não há alternativa. Emprego formal não virá sem crescimento, que, por seu lado, não brotará espontaneamente.

Governo e sociedade devem fazer as escolhas certas para colocar o País no rumo. Políticas públicas de emprego e flexibilização da legislação trabalhista não gerarão empregos por si sós. Não há soluções mágicas.

Primeiro, crescer é preciso. Contudo, temo que falte um timoneiro neste barco.

*PROFESSOR-ASSOCIADO DA FUNDAÇÃO DOM CABRAL, FOI MINISTRO DO TRABALHO E DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO NO GOVERNO FHC

Estadão
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