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Consultoria da Câmara vê buraco de R$ 21,3 bi no Orçamento

Novo parecer é mais uma tentativa do Congresso de convencer Bolsonaro a dar aval ao texto com emendas turbinadas

15 abr 2021 - 02h56
(atualizado às 07h36)
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Um novo parecer da consultoria da Câmara dos Deputados está sendo usado como base pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para defender a sanção integral do Orçamento de 2021, sem vetos às emendas indicadas pelos parlamentares. O documento obtido pelo Estadão reconhece que há uma insuficiência de R$ 21,3 bilhões nas despesas obrigatórias, mas reafirma que o ajuste pode ser feito ao longo do ano e é de responsabilidade do Poder Executivo.

Plenário da Câmara dos Deputados
01/02/2021 REUTERS/Adriano Machado
Plenário da Câmara dos Deputados 01/02/2021 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

O texto é mais uma tentativa da cúpula do Congresso Nacional de convencer o presidente Jair Bolsonaro a dar aval ao texto com emendas turbinadas e afastar seu principal temor: o de cometer crime de responsabilidade pela sanção de um Orçamento com despesas maquiadas, dando base a eventual processo de impeachment. Como mostrou o Estadão/Broadcast, a equipe econômica tem argumentado na direção contrária, de que o mais prudente seria vetar emendas para recompor os gastos obrigatórios, sob risco de punição.

A tensão cresceu nos últimos dias, com críticas dos parlamentares à postura do ministro da Economia, Paulo Guedes, que participou das tratativas do acordo para selar a destinação de R$ 16,5 bilhões às emendas para "quitar" a fatura da aprovação da PEC emergencial, mas depois mudou o posicionamento ao ser alertado pelas áreas técnicas dos riscos fiscais envolvidos.

"Quanto à correção das dotações das despesas dentro dos limites do teto de gastos do Executivo, cabe a esse Poder promover os ajustes necessários na lei orçamentária em curso, com base em avaliação que confronta os parâmetros atuais, as estimativas de arrecadação e os dispêndios de todas as despesas obrigatórias com os montantes aprovados inicialmente e aqueles já realizados provisoriamente", diz o documento.

Os cálculos do tamanho do estouro foram apresentados pela consultoria com base em notas técnicas do próprio Ministério da Economia, anexadas à análise. Em documento de 9 de abril, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho apontou que há uma insuficiência orçamentária de R$ 10,4 bilhões nos benefícios previdenciários para 2021. São necessários R$ 708,9 bilhões para garantir todas as aposentadorias e pensões, mas o Congresso só aprovou R$ 698,5 bilhões.

Além do problema na Previdência, ainda há subestimativa de R$ 1,8 bilhão nos gastos com o benefício assistencial para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, o BPC, R$ 3,7 bilhões no seguro-desemprego, R$ 0,5 bilhão no abono salarial e R$ 4,9 bilhões na compensação paga ao INSS devido à desoneração da folha de pagamento, medida que foi prorrogada até o fim deste ano.

A conta não inclui outros problemas, como R$ 2,5 bilhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que também ficaram subestimados e não poderiam sequer ser bloqueados.

Cortes na Previdência

O caso mais grave é o da Previdência. O valor da insuficiência até pode cair a R$ 7,96 bilhões com a adoção de medidas administrativas, como cancelamentos de benefícios por prova de vida (que está suspensa devido à pandemia), que poupariam R$ 1,874 bilhão, e pente-fino em benefícios por incapacidade (como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), com impacto de R$ 591,36 milhões. Mesmo assim, o próprio INSS alerta que a obtenção dessas economias depende da retomada dos trabalhos e de limitações orçamentárias e de pessoal do órgão.

Os números da Previdência já consideram a provável redução de R$ 3,065 bilhões nos gastos, projetada após reestimativas recentes do Ministério da Economia a partir de parâmetros econômicos, como crescimento, inflação, receitas e o novo salário mínimo (R$ 1,1 mil).

Um dos argumentos dos parlamentares para defender o corte feito nos gastos previdenciários é o de que a reforma aprovada em 2019 tem tido uma economia acima do esperado. Segundo técnicos ouvidos pela reportagem, essa defesa é "falaciosa" e vem de uma tentativa do Centrão de "vender a versão" de que os números estão inflados. Até hoje, segundo essas fontes, a ala que defende o corte não apresentou estudos sérios que corroborem esse argumento.

Outro indicativo de que o corte é inviável, segundo os técnicos, é o fato de que, pelo Orçamento aprovado pelos parlamentares, os gastos com o INSS cresceriam apenas 4,3% em 2021 - o que não repõe sequer a inflação de 5,45% que corrige praticamente todos os benefícios. "A conta só fecha se eu acreditar que o estoque de benefícios vai reduzir de 2020 para 2021", ironiza um técnico.

A Previdência ainda tem outro problema ainda mais grave. Além do limite orçamentário, para que o governo dê início aos gastos por meio da fase chamada de "empenho", a Economia também precisa ter limite financeiro, para pagar as despesas que já estão em andamento. Esse limite financeiro, segundo a nota da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, está subestimado em R$ 18,4 bilhões e precisaria ser recomposto. Sem isso, o governo corre o risco de precisar conter pagamentos de despesas discricionárias, como custeio e investimentos, para liberar o limite aos pagamentos do INSS.

No caso do abono salarial, espécie de 14º salário pago a trabalhadores com carteira que ganham até dois salários mínimos, a maquiagem só não é maior porque há uma decisão do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) adiando o calendário de pagamentos que iniciaria em julho deste ano para o início de 2022. Como mostrou o Estadão/Broadcast, essa medida foi negociada pela equipe econômica com os parlamentares para ajudar na alocação das emendas. Mesmo assim, falta cerca de R$ 0,5 bilhão para compensar o reajuste maior do salário mínimo.

Estadão
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