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Auxílio aumentaria R$ 8,51 sem solução para precatórios

Com previsão atual de gastos para 2022, famílias receberiam em média R$ 194,45, valor inferior aos R$ 300 prometidos por Jair Bolsonaro

23 set 2021 - 05h11
(atualizado às 07h14)
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Sem aprovar acordo para precatórios, Orçamento de 2022 não tem espaço para um Bolsa Família maior.
Sem aprovar acordo para precatórios, Orçamento de 2022 não tem espaço para um Bolsa Família maior.
Foto: Agência Brasil / Estadão

O novo programa social do governo, chamado de Auxílio Brasil, terá um aumento de só R$ 8,51 no valor médio em relação ao Bolsa Família, caso governo e Congresso não consigam aprovar a tempo uma solução para os precatórios, dívidas judiciais que tiveram forte aumento em 2022 e ocupam o espaço no Orçamento que seria destinado à ampliação da política social.

O Ministério da Cidadania calcula que o valor médio do Auxílio Brasil seria de R$ 194,45 em 2022, pago a 14,695 milhões de famílias, considerando a dotação disponível hoje no Orçamento. Os dados constam em parecer técnico da pasta obtido pelo Estadão/Broadcast via Lei de Acesso à Informação (LAI).

O valor é R$ 105,55 menor do que vem sendo prometido pelo presidente Jair Bolsonaro, que almeja um benefício médio de pelo menos R$ 300 para as famílias do novo Auxílio Brasil.

Também é apenas R$ 8,51 maior que o valor médio de R$ 185,94 calculado para vigorar até outubro deste ano, último mês do Bolsa Família, já que a intenção do governo é implementar o Auxílio Brasil a partir de novembro de 2021.

Além do reajuste tímido, o parecer mostra que a ampliação no número de famílias alcançadas pelo programa também é pequena. Hoje, 14,655 milhões de famílias recebem o Bolsa Família, e mais de 1 milhão aguarda na fila do benefício. Pelos cálculos do Ministério, a previsão é de um aumento líquido de apenas 39.761 beneficiários, caso a dotação orçamentária para 2022 permaneça como enviado pelo governo ao Congresso Nacional.

O pedido de acesso ao parecer foi protocolado pela reportagem em 10 de agosto e deveria ter sido enviado pelo Ministério da Cidadania até 9 de setembro, mas a pasta descumpriu o prazo estipulado em lei. O envio dos pareceres ocorreu apenas depois de o Estadão/Broadcast mostrar a violação da LAI e recorrer à Controladoria-Geral da União (CGU), que determinou a divulgação dos documentos em até cinco dias.

Por telefone, a assessoria de imprensa do Ministério da Cidadania informou que o atraso se devia ao "alto volume de pedidos", mas não encaminhou resposta oficial por e-mail como solicitado pela reportagem. Em vez disso, foram enviados os documentos requeridos há mais de um mês.

Em sua decisão, a própria CGU alertou que a lei prevê a responsabilização dos agentes públicos "quando da prática de condutas ilícitas no tocante a recusa/retardamento no fornecimento das informações requeridas".

O documento do Ministério da Cidadania foi assinado por técnicos no dia 2 de agosto - uma semana antes do envio da Medida Provisória ao Congresso Nacional -, mas estava sob sigilo até agora, embora a lei determine a transparência como regra.

Mesmo que o governo pretenda reajustar os valores, as normais legais determinam que os cálculos de impacto financeiro e orçamentário sejam feitos de acordo com o espaço disponível no Orçamento.

Para 2022, o governo prevê um gasto de R$ 34,2 bilhões com os benefícios de composição familiar, primeira infância e superação da extrema pobreza. Outros R$ 85,95 milhões serão destinados às bolsas de iniciação científica, auxílio esporte escolar, auxílio criança cidadã (para pagamento de creches) e inclusão produtiva urbano. Já o auxílio inclusão produtiva rural custaria R$ 187,45 milhões. Outro R$ 1,157 bilhão seria reservado ao custo de operação do programa. O gasto total seria de R$ 35,8 bilhões. Os mesmos valores são projetados para 2023.

O parecer também detalha os valores até agora estimados para os benefícios do Auxílio Brasil, bem como para as linhas de pobreza e extrema pobreza que delimitam quem tem direito ou não ao programa. A linha de extrema pobreza, hoje em até R$ 89 por pessoa, seria reajustada para R$ 93. Já a linha de pobreza, hoje até R$ 178 por pessoa, seria ampliada a R$ 186.

O valor do benefício de composição familiar, pago por cada integrante familiar entre 3 e 21 anos, seria de R$ 45. Já o benefício primeira infância (0 a 36 meses) ficaria em R$ 90. Já o benefício de superação da extrema pobreza, pago a quem mesmo com os outros benefícios não atinge a linha inferior de extrema pobreza, será calculado caso a caso, com o mínimo de R$ 10 por pessoa.

Aumento

O próprio governo estima ter cerca de 30 dias para destravar a solução para os precatórios (dívidas judiciais) e conseguir espaço no Orçamento para ampliar o Auxílio Brasil aos valores prometidos pelo presidente Jair Bolsonaro: benefício médio de R$ 300 a 17 milhões de famílias.

Nos últimos dias, governo e Congresso chegaram a um acordo para limitar o gasto com essas dívidas judiciais a R$ 40 bilhões em 2022, deixando outros R$ 50 bilhões para o ano seguinte ou para serem negociados e pagos fora do teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação.

A implementação desse acordo, porém, depende da aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que requer apoio de 308 deputados e 49 senadores em dois turnos de votação em cada Casa. Depois, o Ministério da Economia precisa enviar o Congresso uma mensagem modificativa do Orçamento para remanejar os recursos e abrir caminho ao Auxílio Brasil.

Transparência

O economista Gil Castello Branco, fundador da Associação Contas Abertas, critica o fato de o Ministério da Cidadania ter descumprido o prazo para divulgar essas informações. "Os pareceres técnicos sobre o novo benefício são peças essenciais para a análise do programa, seja por parte do Congresso ou pela sociedade. Quando o governo não fornece esses pareceres, a impressão que se tem é que há algo a esconder. Por qual outro motivo o governo não libera o acesso a esses pareceres técnicos?", questionou.

Antes de o Ministério repassar as informações, o diretor-executivo da Transparência Brasil, Manoel Galdino, afirmou que é bastante incomum um órgão ignorar pedidos de acesso à informação. "Mais de 90% dos pedidos são respondidos dentro do prazo, ainda que negativamente (quando o acesso não é concedido)", diz. "É muito incomum e é gravíssimo."

Estadão
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