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O livro que deu novo significado para ‘Mulheres Poderosas’

Mas, afinal, o que querem as mulheres?

24 jan 2022 - 06h00
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Mary Beard
Mary Beard
Foto: Instagram / Reprodução

“O que querem as mulheres?”, perguntou Freud. Como toda pergunta complexa, esta tem uma resposta simples - e errada. Era a minha.

Fui corrigido por Mary Beard. É professora de História em Cambridge e autora do inestimável "SPQR", sobre a ascensão e queda do império romano. Presença constante no cenário cultural anglófono, escrevendo no London e no New York Review of Books, apresentando programas de TV, se metendo em umas discussões boas.

E quebrando regras sem dó nem piedade.

Minha ídala Mary, especializada no mundo clássico de Grécia & Roma, escreveu um livrinho chamado "Women & Power", usando esse viés da antiguidade para falar das mulheres no mundo moderno. Saiu aqui e se chama "Mulheres e Poder - Um Manifesto".

A minha resposta errada para o Freud sempre foi a resposta automática do Mundo Ocidental Civilizado: "as mulheres querem ter os mesmos direitos dos homens". Mary força repensar isso, virando minha resposta de cabeça pra baixo.

Importante lembrar que Mary vive na Inglaterra de hoje, e também no mundo dos Clássicos. Talvez nem lhe passe pela cabeça que em 2022 muitas mulheres não querem poder. Aliás, muitas não querem ter os mesmos direitos dos homens. Afinal, não é isso que suas sociedades aceitam e suas religiões lhes ensinam.

A maior parte do planeta vive sob a influência de religiões milenares, crenças da época que as mulheres eram coisas para serem possuídas. De quando os homens tinham várias esposas, como tinham leitoas e cabritos. Religiões da Era do Bronze que ainda estão por aí, faturando e sem pagar impostos, e a maioria das pessoas nem estranha.

O livro reúne duas palestras de Mary. Desliza às vezes para o politicamente correto, mas é entremeado de insights tão afiados que não dá pra não ler de uma sentada. Só a página sobre a identidade sexual híbrida de Atena (sim, a deusa grega) já vale seu tempo e dinheiro.

Mas o coração do argumento de Mary é que não basta a mulher alcançar posições de poder na sociedade criada pelos homens. Mal-traduzo um trechinho:

"Você não pode encaixar facilmente as mulheres em uma estrutura que foi codificada como masculina; você precisa mudar a estrutura. Isso significa pensar em Poder de uma maneira diferente. Significa separar o Poder do prestígio público. Significa pensar colaborativamente, sobre o poder dos seguidores, e não só o dos líderes...

O que tenho em mente é a habilidade de ser efetivo, de fazer uma diferença no mundo, e o direito de ser levado a sério, coletiva e individualmente. É Poder no sentido que muitas mulheres sentem que não têm - e que desejam."

Pois é: inclusão não é botar mulher na estrutura de poder atual, e manter a estrutura fazendo a mesma coisa que sempre fez. É transformar a estrutura…

Mas Mary vai muito além. Leia que vale a pena. E mesmo que não tenhas o menor interesse pela história de Roma, comece a ler "SPQR" e te garanto que não conseguirás largar. Tem em português.

Melhor ainda seria você encarar "Classics - A Very Short Introduction", que ela escreveu com John Henderson, e que te apresenta a Cultura Clássica a partir de… um único templo. E nem é dos templos mais famosos. Uma tour de force, coisa de louco. Mary é demais.

Esse livro faz parte de uma coleção preciosa chamada "A Very Short Introduction". Que é isso: introduções curtinhas a todo tipo de tema sob a face da Terra. Sempre formato pocket, escritos com elegância e autoridade por especialistas nos assuntos, na melhor tradição coloquial da academia britânica, e com listinhas de outras leituras recomendadas no final.

A coleção é da editora da Universidade de Oxford. Coisa finíssima. Tem uns vinte aqui em casa, e seguimos pai e filho comprando.

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