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Mais de 160 milhões de pessoas são empurradas para a pobreza durante a pandemia

A crise sanitária da Covid-19 produz novos bilionários a cada 26 segundos, enquanto a desigualdade chega a patamares próximos ao auge do imperialismo ocidental no início do século 20, aponta relatório da Oxfam

27 jan 2022 - 16h14
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O cenário mostra pessoas em meio a uma favela com casas incendiadas para ilustrar texto sobre desigualdade.
O cenário mostra pessoas em meio a uma favela com casas incendiadas para ilustrar texto sobre desigualdade.
Foto: Imagem: Rovena Rosa/Agência Brasil / Alma Preta

Durante a pandemia, um novo bilionário surge a cada 26 horas enquanto mais de 160 milhões de pessoas são empurradas para a pobreza. É o que aponta o relatório inédito Desigualdade Mata, publicado neste mês pela Oxfam, organização brasileira parte de uma rede global que atua em mais de 90 países para combater as desigualdades e a pobreza.

De acordo com os resultados disponibilizados no documento, a pandemia de Covid-19 acentuou ainda mais as desigualdades, o que tornou a crise sanitária efetivamente mais mortal, prolongada e prejudicial aos meios de subsistência. Os dados estimam que as desigualdades são responsáveis pela morte de uma pessoa a cada quatro segundos no mundo. São, pelo menos, 21.300 vidas perdidas diariamente pela fome, falta de acesso à saúde pública, violência de gênero e crise climática.

"A sociedade estava cheia de rachaduras quando a pandemia teve início, rachaduras que aumentaram e se transformaram em abismos. Esses abismos ameaçam a coesão social e a democracia e, talvez de forma ainda mais importante, apresentam uma barreira quase intransponível para qualquer abordagem relevante ou eficaz para lidar com a crise climática", destaca a documentarista e ativista Abigail Disney em trecho do documento.

'Violência econômica'

De acordo com a Oxfam, desde o início da pandemia, a riqueza dos dez homens mais ricos dobrou, enquanto a renda de 99% da humanidade decaiu. Os 2.755 bilionários do mundo cresceram sua fortuna mais durante a crise sanitária da Covid-19 do que nos últimos 14 anos.

Segundo Dirlene Silva, economista, mentora, coach e consultora de Inteligência Financeira, no Brasil, a desigualdade econômica e social é histórica e a pandemia fez com que esse problema se tornasse ainda mais cruel.

"O Brasil é o segundo país que mais concentra renda no mundo. Aqui, 1% mais rico da população concentra 28,3% da renda. Durante a pandemia, a alta da inflação reduziu o poder de compra dos mais pobres, os salários ficaram defasados, o desemprego cresceu e muitas empresas faliram, principalmente as micros e pequenas empresas", explica.

De acordo com a Oxfam, a desigualdade nos dias de hoje é tão abissal quanto era no auge do imperialismo ocidental no início do século 20. Só a fome mata mais de 2,1 milhões de pessoas ao ano.

A economista Dirlene Silva ressalta que um dos fatores para a concentração de renda expressiva é porque os ricos conseguem aumentar sua riqueza por meio de investimentos, já os mais pobres precisam usar todo o recurso, já mínimo, em sua subsistência, inclusive consumindo nas empresas produtoras/prestadoras de serviços em que os proprietários ou acionistas são os mais ricos.

"Atualmente, temos em nosso país um sistema tributário regressivo em que o pobre paga mais imposto que o rico, no sentido que o valor do imposto pesa mais no bolso do pobre. Ao tributar prioritariamente o consumo e não renda, estamos indiretamente privilegiando quem tem mais dinheiro", afirma a economista Dirlene.

Segundo a Oxfam, um imposto único de 99% sobre o aumento nos lucros decorrentes da Covid-19 obtidos pelas 10 pessoas mais ricas já poderia pagar vacinas suficientes para todos, além de financiar medidas climáticas, de saúde, de violência de gênero e de proteção social em mais de 80 países. Ainda assim, essas pessoas mais ricas ainda teriam 8 bilhões de dólares americanos a mais do que tinham antes.

"A 'violência econômica' é cometida quando as escolhas de políticas estruturais são feitas para as pessoas mais ricas e poderosas. Isso causa danos diretos a todos nós e, principalmente, às pessoas em situação de pobreza, a mulheres e meninas e a grupos racializados", pontua a Oxfam.

Apartheid vacinal, fome e violência de gênero

O relatório também destaca o problema do 'apartheid vacinal' durante a pandemia, quando países e grupos específicios e mais pobres não tem imunizações suficientes. "A desigualdade de renda é um indicador mais assertivo para saber se você morrerá de Covid-19 do que a idade", ressalta o documento.

De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a população negra brasileira tem 1,5 vez mais chance de morrer de Covid do que as pessoas brancas. Além disso, a violência doméstica e de gênero cresceu a números alarmantes durante a crise sanitária da Covid-19. Segundo a Oxfam, "estima-se que a violência de gênero aumentaria, em média, cerca de 20% durante os períodos de lockdown, o que significa que, para cada três meses de lockdown, haveria mais 15 milhões de casos de violência doméstica".

O assassinato de mulheres também alcançou taxas recordes. Só no Reino Unido, quase três vezes mais mulheres foram assassinadas no mesmo mês do que a média da última década. Considerando gênero no mercado de trabalho, 740 milhões de mulheres trabalham na economia informal no mundo e, durante o primeiro mês da pandemia, sua renda caiu 60%.

De acordo com a Oxfam, estima-se que custaria 42 bilhões de dólares americanos para acabar com a violência de gênero em cerca de 132 países até 2030 por meio da implementação de programas de prevenção e resposta e do apoio a movimentos e ativistas de mulheres e feministas, incluindo organizações de direitos das mulheres.

"Não acredito em ações que ataquem as 'causas' e, sim, as que busquem corrigir a origem dos problemas como políticas sociais, ações afirmativas, incentivo à educação, além das reformas tributárias e administrativas. Logo, para a redução das desigualdades é necessário vontade, interesse político e social", finaliza a economista Dirlene Silva.

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Alma Preta
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