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Avanços e retrocessos

A série "Estudantes na Alma Preta" traz as histórias de jovens da rede estadual de ensino da Bahia narradas a partir da perspectiva deles

20 dez 2021 - 16h33
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Foto: Imagem: Alma Preta Jornalismo / Alma Preta

Nada verdadeiramente grandioso vem a nós de maneira rápida e fácil, tudo tem um preço a ser pago para ser conquistado. Aquilo que é realmente importante, que tornamos um objetivo momentâneo ou para a vida pode nos machucar profundamente durante a caminhada para alcançar tais metas.

E eu te pergunto: vale a pena todo esse esforço e sacrifício para atingir este propósito?

Bem, é uma pergunta sem resposta certa e para tentar respondê-la irei contar minha trajetória.

Meu nome é Jay Victor, tenho 18 anos, moro com meus pais e minha irmã em uma casa na cidade de Ipirá, no interior da Bahia. Constantemente, nos finais de semana, viajo para o Distrito do Bonfim de Ipirá, onde mora grande parte dos meus familiares e é também a localidade do sítio dos meus avós paternos, um lugar para encontrar alguns momentos de paz em meio a uma vida turbulenta.

Minhas ambições e objetivos cresceram comigo desde o ensino fundamental, na Escola Municipal Doutor Góes Calmon, quando fui o monitor da sala nos últimos anos. Sempre fui considerado o melhor ou um dos melhores alunos da sala pelos professores e demais alunos. Essa fama, assim como tudo, tem seus lados positivos e negativos. As consequências sofridas foram, respectivamente, o reconhecimento por todo o esforço empregado, feito por uma pequena parcela de pessoas, e a pressão imposta por quase todos.

Ainda no primário, conheci muitas pessoas que fizeram e ainda fazem parte da minha vida. Foi lá que conheci meu melhor amigo que esteve presente em todos os acontecimentos citados neste texto.

E agora estamos no ginásio, em outra escola, na Escola Municipal Professor José Saint Clair, novos professores, novos colegas, alguns novos amigos e com a dedicação para suprir a pressão se multiplicando a cada ano. Foram quatro anos muito intensos, com muitas conquistas, entre elas, as principais foram: ganhar um concurso de redação proposto pela Secretaria Municipal de Educação, duas menções honrosas e medalha de bronze nas Olimpíadas Brasileiras de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) e quatro vezes vencedor do Aluno Nota 10, o melhor aluno da escola com base na soma das notas.

Olha que maravilha, só conquistas, só coisas boas, correto? Errado, erradíssimo... Tudo isso conquistado cria uma espécie de barreira gerada pelo "preconceito com a inteligência" e, adivinhem… Aumentou toda aquela pressão e expectativa que as pessoas exerciam sobre mim. Elas veem uma pessoa que não pode errar. E para não me sentir mal pela chacota que ocorre quando não cumpro o que eles imaginam, a perfeição, eu simplesmente me esforçava mais e mais para ficar mais próximo dela. Sabendo também que só me traria benefícios. Tolo engano…

Estamos no Ensino Médio, no Colégio Estadual Maria Evangelina Lima Santos. Ano de 2019, considerado o melhor ano da minha vida por muitos motivos, como: a minha participação em peças teatrais, na gincana, na viagem para a FLICA, no projeto interdisciplinar "Água nossa de cada dia", na virada cultural, na monitoria presencial, nas festas de datas comemorativas e também como líder de classe, além de novas amizades que foram desenvolvidas. Mas creio que é considerado um ano tão incrível, principalmente, pelo ano que o sucedeu, com a pandemia que veio para, além de trazer muitas mortes, tristeza e insegurança, me colocar no fundo do poço, me fazer parar e refletir sobre toda minha trajetória e, consequentemente, me abriu os olhos quanto aos meus objetivos e como eu estou correndo atrás deles.

O ano atual, 2021, começa como o anterior termina sem muitas novidades agradáveis. Porém, no meio dele surge uma surpresa que colocou minha vida de ponta cabeça e me fez adiar os objetivos, como o foco nos estudos para o ENEM, que já estava prejudicado pelo início das aulas, para me jogar de cabeça na liderança de sala, colégio, cidade e Núcleo Territorial de Educação (conjunto de cidades próximas, na Bahia existem 27 núcleos). Com esta atitude, muitas oportunidades surgiram, como a participação na Comissão de Comunicação, a CCOM, que é organizada por estudantes, para estudantes, na live do dia dos estudantes e na 1ª BaMUN (Simulação da ONU), ambos eventos realizados em Salvador, sem falar das belas amizades que foram formadas.

Muita coisa legal aconteceu e ainda está acontecendo desde que decidi me empenhar na liderança. Mas o que eu abdiquei?

Minhas noites de sono?

Sem dúvidas. Mas esquece isso, já me acostumei. Não tenho tempo para isso, tenho que acabar este texto.

Parte da minha sanidade mental?

Receio que sim. Mas deixa isso para o ano que vem, será um ano mais tranquilo. Não tenho tempo para pensar nisso.

Minha liberdade?

Sim. Muitas vezes não posso mais ir ao sítio.

— Vamos na roça, seus avós estão com saudade.

Não tenho tempo para isso, pai. Tenho coisas para fazer.

E meu tempo?

Ó senhor tempo, o bem mais valioso, nada o compra, ninguém o para… Tudo isso foi uma perda de tempo, assim como os anteriores esforços pela perfeição e qualquer outra coisa na vida, ou um grandioso investimento?

Eu começo o texto propondo uma resposta e termino de escrevê-lo com mais e mais dúvidas. Mas gosto de pensar que tudo que fiz, mesmo os erros grotescos, fazem parte do que eu realmente sou, logo, não há espaço para lamentação em minha vida. E com essa metalinguagem escancarada eu finalizo o texto e os incentivo a viver. Faça, erre, acerte, aprenda, relaxe, melhore, descanse, se esforce, não se importe, se importe, viva, apenas viva sem arrependimentos.

Sobre o autor: Jay Victor Cintra da Silva é um jovem de 18 anos, morador da cidade de Ipirá, na Bahia, e estudante do Ensino Médio na Escola Estadual Maria Evangelina Lima Santos.

Alma Preta
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