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Ciclo traz a arte zen e humanista do japonês Iasujiro Ozu

Mostra reúne programa com oito longas do cineasta

8 jan 2019 - 03h11
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Com Filho Único, o Sesc Pinheiros dá início hoje ao ciclo dedicado ao cineasta japonês Iasujiro Ozu (1903-1963). Os filmes, oito longas no total, serão exibidos sempre às terças-feiras, às 20h, com exceção do dia 5/2, quando a sessão será iniciada às 19h. Paralelamente ao ciclo, será oferecido o curso O Cinema de Ozu, quatro aulas ministradas pelo crítico Sérgio Alpendre.

Ozu, costuma-se dizer, ficou um tanto à sombra de seus conterrâneos Keiji Mizoguchi e Akira Kurosawa, em especial, que tiveram mais rápida difusão no Ocidente. Este último, em particular, após o sucesso de Rashomon (vencedor do Festival de Veneza) e épicos como Derzu Uzala de Kagemusha. Porém, quando o cinema de Ozu começou a ser descoberto, sua importância foi de imediato reconhecida. É admirado por Jean-Luc Godard, Claire Denis e Wim Wenders; e seus traços podem ser detectados na obra de um cineasta tão moderno e intimista quanto Jim Jarmusch.

A Rotina Tem seu Encanto. A câmera na altura do tatame, traço estilístico de Ozu
A Rotina Tem seu Encanto. A câmera na altura do tatame, traço estilístico de Ozu
Foto: REPRODUÇÃO / Estadão

Bem, há razão para definir Ozu como "o mais oriental dos cineastas japoneses". Seu estilo é intimista, sereno e meditativo. A câmera não faz movimentos inúteis e situa-se na posição de um ser humano que enxerga a cena - a chamada "posição do tatame", costuma-se dizer, como se a objetiva (e portanto o olho do espectador) estivesse em posição de lótus, sobre um confortável tatame, a contemplar o drama humano que se desenrola diante dele.

Nesse sentido, Ozu é um fino observador do interior do lar japonês, de um habitat cultural em que a tradição pesa muito, mas tem de se adaptar a mudanças inevitáveis. Em especial com a ocidentalização acelerada do país, forçada pela derrota na 2ª Guerra Mundial. Segundo o crítico norte-americano Donald Richie, "Ozu tratava apenas de um grande assunto, a família japonesa, e apenas de um grande tema, a sua dissolução".

Por exemplo, naquele que é considerado a sua obra-prima, Era uma Vez em Tóquio (Tokyo Monogatari). Um filme comovente em sua modéstia narrativa, seu silêncio, sua profundidade. Um casal de idosos vai visitar seus filhos, que moram em Tóquio. Mas estes, aflitos com suas obrigações profissionais e seus próprios problemas pessoais, não têm tempo para os velhos. Simples assim. E, no entanto, nessa simplicidade, mora todo um universo complexo, que é o da emoção humana.

O cinema de Ozu é simples mas não simplório. Ilustra aquela ideia que coloca a simplicidade como o ápice da arte. Dessa forma, Era uma Vez em Tóquio pode ser enxergado não apenas como um relato sobre filhos que não têm paciência com os pais, mas como uma reflexão sobre a bondade e seu lugar no mundo contemporâneo. Os filhos de fato não têm tempo para os pais - isso é certo. Não porque sejam maus, mas porque, premidos pela sociedade competitiva, canalizam toda energia para seus interesses.

Há, no entanto, uma exceção nesse comportamento egoísta, Noriko, nora do casal de idosos. Viúva, foi casada com um dos seus filhos, morto durante a guerra. Ela trata os velhos com toda a consideração e respeito. É a bondade em estado puro, parece nos dizer o filme. E, no entanto, a próprio Noriko não se supervaloriza. Diz que tem defeitos como qualquer pessoa. Pode ser, mas, como exceção entre os outros, destaca-se por essa capacidade de empatia. De simpatizar com os outros, ouvi-los, tratá-los bem, acolhê-los. No mundo contemporâneo, aquele que está surgindo no Japão após a guerra, e é o nosso de cada dia, a bondade passa a ser uma qualidade quase subversiva. Ozu percebeu isso como ninguém.

Desses pequenos/imensos conflitos é feito o tecido de suas histórias. A mãe solteira que trabalha para que o filho estude medicina em Filho Único. O pai viúvo que tenta arranjar um marido para a filha solteira em A Rotina Tem seu Encanto. A moça que recusa um casamento arranjado em Também Fomos Felizes. Dramas familiares que, sob a câmera de Ozu, alcançam uma iluminação zen.

YASUJIRO OZU. Sesc Pinheiros. R. Paes Leme, 195, tel. 3095-9400. Abre hoje (8). 3ª, 20h (no dia 5/2, sessão será às 19h). Até 26/2

Estadão
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