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Château - Paris: "Essa história poderia facilmente se passar nos bairros brasileiros", defende o diretor Cédric Ido (Exclusivo)

Conversamos com o cineasta sobre a comédia que estreia dia 22 de março nos cinemas.

22 mar 2018 - 09h02
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Quando você ouve falar em Paris, pensa na torre Eiffel, na avenida Champs-Elysées, no Arco do Triunfo? A comédia Chateau - Paris pretende mostrar que existe uma vida muito diferente nos bairros populares da cidade.

Foto: Antoine Monod / Divulgação / AdoroCinema

Em Chateau d'Eau, especificamente, vivem milhares de franceses de origem africana ou asiática, muitos deles trabalhando para salões de cabeleireiros. Esta é a atividade de Charles (Jacky Ido), um "rabatteur", ou seja, responsável por pescar clientes nas ruas e convencê-los a entrarem no salão para um corte ou uma manicure.

O AdoroCinema conversou com o cineasta Cédric Ido, que dirigiu o filme ao lado de Modi Barry. Ele explicou a decisão de fazer um filme especificamente sobre este bairro, captando a rotina de vários personagens, e justificou a ausência de conflitos religiosos ou políticos na trama.

Chateau-Paris está em cartaz nos cinemas.

O filme mostra Paris muito distante dos pontos turísticos.

Cédric Ido: O desejo de fazer um filme sobre Paris é algo que nós alimentávamos há muito tempo. Faltava escolher qual parte da cidade. Muitos filmes contam as mesmas histórias, falam dos mesmos pontos, mas para nós era importante abordar a Paris que conhecemos. Pela energia e pelos códigos específicos da região, escolhemos mostrar o bairro de Chateau-d'Eau. Ele é como uma cidade à parte - mesmo sendo apenas um bairro, ele parece grande, com grande concentração de pessoas. Nosso desejo era mergulhar o espectador neste espaço único. Não queríamos ter que explicar porque Charles vivia neste lugar, bastava filmar a sua rotina para criar uma empatia imediata com o público.

Você acompanha os personagens sem parar, transitando pelas ruas. Como escolheu este ritmo dinâmico? 

Cédric Ido: Este era o nosso maior desafio. Para chegar neste resultado, usamos muitas referências, principalmente os filmes japoneses dos anos 1970 que mostravam as gangues de rua. Esses filmes têm uma energia impressionante, uma bela maneira de filmar os bairros populares. São estes, aliás, que inspiraram Quentin Tarantino e Jim Jarmusch para os filmes deles. No nosso caso, tínhamos pouquíssimo tempo de filmagem, então tentamos seguir os personagens, fazer algo mais ágil com que as pessoas pudessem se identificar. 

O desafio era filmar no bairro real. Queríamos ter uma visão quase documental das pessoas, dos homens responsáveis por encontrar clientes para os cabeleireiros, seus códigos específicos para falar e agir. Não queríamos enganar o público com atores que nem conhecem o bairro, interpretando esses profissionais. Seria algo datado, que preferimos evitar. Então trabalhamos com pessoas do bairro, criamos confiança com eles. Passamos muito tempo escrevendo o roteiro junto deles.

Por que escolheu misturar atores profissionais e não profissionais? 

Cédric Ido: O filme tem um roteiro muito escrito. Partimos da temática de um mundo profissional, e decidimos que era indispensável que o roteiro fosse muito bem pensado e ensaiado do começo ao fim, como um teatro a céu aberto, ou um teatro popular. Queríamos criar piadas, gags, trabalhar com gírias, e isso não poderia ser falsificado ou improvisado. Por isso, alguns atores precisavam ser profissionais, misturados aos habitantes de Chateau d'Eau. Além disso, existem muitos teatros populares no bairro, o que transforma o filme numa espécie de homenagem. No final, mantivemos uma unidade, com pessoas nos mesmos espaços, usando praticamente as mesmas roupas. Fizemos muitos ensaios para deixar tudo no nível que queríamos, e ficamos muito surpresos com a habilidade dos atores não profissionais.

Ao mesmo tempo, não vemos instituições como a família, o governo, a religião... 

Cédric Ido: Exato. O nosso foco era outro, tínhamos outros interesses. Aquele local é um microcosmo da França inteira. A ideia de coabitação entre as diferenças não se reduz às instituições, ela se encontra também nos relacionamentos entre pessoas do mundo inteiro, reunidas em torno dos salões de cabeleireiro. As relações religiosas, por exemplo, não transmitem por si só toda a interação entre as pessoas. Esta também foi um posicionamento nosso: acreditamos que não seja preciso afirmar, determinar todos estes aspectos, justificar nossa relação com os outros e nosso pertencimento ao local. É muito redutor ter que justificar o pertencimento dos personagens a uma cidade.

A música dita o ritmo do filme e das transformações do personagem Charles.

Cédric Ido: Nós trabalhamos com Nicola Tescari, que já tinha contribuído com nossos filmes, especialmente os curtas-metragens. Ele mora de fato em Chateau d'Eau há mais de dez anos, por isso conhece os ritmos, os sons. Acima de tudo, buscamos a música que poderia representar aquele bairro. Privilegiamos o uso da música nos momentos em que Charles se desloca pela rua, usando a trilha em cenas nos quais o espectador por não esperar. 

Mesmo falando de um bairro muito específico, acredita que o filme será compreendido no resto do mundo? No Brasil, por exemplo? 

Cédric Ido: Pensamos muito na maneira como o filme seria recebido fora da França. Aliás, eu estive no Brasil duas semanas atrás, para prestigiar um festival de cinema africano. Eu pensei que a repercussão de Chateau-Paris poderia ser enorme no Brasil pelo desejo que percebi nas pessoas de resgatar a cultura africana e trazer à tona os conflitos culturais. E isso vem não apenas das pessoas negras. Encontrei no Brasil um verdadeiro resgate da herança africana. Por ser um país com muita mistura de raças, tenho a impressão de que esta história poderia facilmente se passar nos bairros brasileiros.

AdoroCinema
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