Se você procurar em uma loja de discos trabalhos de Lô Borges não vai encontrar. Em sebos, só com sorte. Pensando nisso e analisando a repercussão de um show seu com Samuel Rosa, vocalista do Skank, o compositor percebeu que seria uma boa lançar suas músicas novamente no CD Feira Moderna. "No show o público do Skank começou a cantar minhas músicas e foi uma surpresa", explica o compositor de 49 anos. Apesar da lembrança dos fãs do Skank, alguns podem não se lembrar: Lô fez parte do Clube da Esquina, que apesar de não ser, em tese, um movimento, foi um grupo de amigos mineiros (incluindo Milton Nascimento) que marcou musicalmente um período da MPB. Alguns podem até achar que foram apenas jovens que "fizeram um som", mas foi mais importante do que isso e é um pensamento que aos poucos vem mudando.Lô está em seu nono disco e suas músicas estão na memória dos que beiram os 30 ou mais - as rádios do país na época (final dos anos 70, começo dos 80) tocavam à beça suas músicas. O tom era de uma certa "melancolia alegre", apesar da aparente contradição de idéias. Foram os Beatles mineiros, de certa forma. Prova disso é o caso de Pat Metheny, prestigiadíssimo compositor de jazz experimental americano, ganhador de inúmeros Grammy, que veio até o interior de Minas Gerais para saber que história era aquela que os meninos Milton Nascimento, Lô, Márcio Borges, Beto Guedes, Fernando Brant, Flávio Venturini e gang contavam e cantavam. Três Pontas, cidade de Minas, estava sendo observada lá de cima. Lô, fã desde criança de bossa nova, cita Samba Raro, de Max de Castro, e Coquinho, de Afonsinho, como músicas que lhe chamaram atenção recentemente. Por telefone, falou com a reportagem do Terra:
Terra: A pergunta é inevitável: Por que no nono disco regravar antigas canções? E as novas?
Lô Borges: Foi uma cobrança pública, uma maneira de colocar em catálogo meu repertório. Foi um projeto que interrompeu outro que eu estava mais a fim de fazer, de um disco com novas músicas. Esse furou a fila. O show do Skank sinalizou que o público jovem conhecia minhas músicas, que estão fora dos catálogos normais. Existem essas coletâneas, que bem ou mal te colocam nas prateleiras.
Terra: Você acha que uma nova roupagem nas músicas pode te colocar nas paradas novamente?
Lô: Esse mecanismo eu não entendo. Quando estávamos gravando não tínhamos essa intenção em mente, apesar do produtor Marcelo Sussekind apontar algumas músicas como radiofônicas. Mas não quis fazer releituras, do ponto de vista da sonoridade dos anos 90, computadores. Quis preservar a atmosfera da época, por isso convidei para as bases das músicas o mesmo pessoal com quem gravei elas originalmente nos anos 70. Esse foi meu norte. Nunca sai exatamente igual e nem foi essa a idéia. alguns convidados, como o Samuel Rosa, Edgard Scandurra e até a guitarra do Sussekind trouxeram uma sonoridade difeernte, mas foi um encontro que não descaracterizou as músicas.
Terra: Com a ideologia toda em volta do Clube da Esquina, uma coisa fica aparente, meio inconclusa: amizades, aquela coisa de irmão, não deveria durar para sempre?
Lô: A amizade continua forte como tem de ser, mas não é uma coisa corporativista, siamesa. Mesmo com esposa a coisa não é assim. Até ultimamente temos nos encontrado muito, eu, Beto Guedes, o Flávio, me apresentei com o Milton no Rock in Rio. Nos encontramos na medida do possível, mas com uma freqüência menor. Tenho gravado com eles, mas ultimamente tenho me encontrado mais com as pessoas que estou me ralacionando mesmo. Tem de haver uma reciprocidade, como com o Samuel e o Edgard, para quem telefono mesmo e nos encontramos.
Terra: E a participação no Rock in Rio, com o Milton. De cima do palco, como foi?
Lô: Foi surpreendente. Mas nos últimos anos tenho frequentado tantos palcos, com diferentes estilos, aceitado convites de bandas como Tia Anastácia, Ira, Skank. Adquiri uma experiência que não me deixa sentir um estranho no ninho. Entrei no palco Mundo sem tremer, nem nada, como se estivesse na sala da casa de minha mãe. Muitos palcos te dá essa irresponsabilidade (risos).
Terra: Você sente a mesma necessidade de compor, de tocar, de quando era adolescente, em que tudo é mais visceral, extremo?
Lô: A coisa muda. Quando se é mais jovem, aquela famosa frase do 90% transpiração e 10% inspiração é verdade. Quando jovem eu era um pentelho que não larga o violão, ia dormir abraçado com ele. A relação de amor, no entanto, não muda muito. Experientes, não ficamos o tempo todo em cima do instrumento, é algo mais obejetivo, de trabalhar em cima das idéias de uma maneira mais acertiva. Na juventude é algo visceral mesmo visceral. Eu era um desequilibrado (risos).
Ping Pong
Sua palavra favorita.
Amor
A palavra que menos gosta.
Bode
A sua droga favorita, não precisa ser química.
Música
Um som ou ruído que você adora.
Crianças
Um som ou ruído que você detesta.
Britadeira
Seu palavrão favorito.
Puta que o pariu
Qual profissão que não a sua gostaria de ter?
(Se demora para decidir e responde "piloto de avião" e depois volta atrás)
Qual profissão que não gostaria de ter de jeito nenhum?
(Indeciso, chega a citar "bancário", mas fica com "motorista de ônibus"
Se o paraíso exitir, o que gostaria de ouvir de Deus ao chegar lá?
Que saudades de você... (risos)
Ricardo Ivanov / Redação Terra
volta