Mulheres fundadoras de startups ajudam a trazer mais mulheres para o C-level

CEOs defendem que mulheres líderes trazem mais inovação à empresa e que gestação e filhos pequenos não são barreira para contratação; startups como Vittude e Gupy inspiram

14 mai 2022 - 05h11
(atualizado em 16/5/2022 às 11h25)

Basta olhar para as startups e constatar: as mulheres são minoria, especialmente em cargos C-level e de liderança. Se a análise leiga não é suficiente, os números comprovam. De acordo com pesquisa da Associação Brasileira de Startups, em 2021 apenas 16,9% dos fundadores de startups eram mulheres. Os índices que analisam as equipes também não são muito animadores em relação à equidade de gênero. Apenas 20,8% das startups têm um número de mulheres mais expressivo no time, de 26% a 49% do total das equipes.

Os dados estatísticos representam a realidade com certa frieza. Em contraponto, CEOs mulheres usam a empatia - um sentimento muito mais quente e acolhedor - como principal combustível para um importante movimento: o de nomear mais mulheres para cargos executivos e de liderança.

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Tatiana Pimenta, CEO da Vittude, startup de telemedicina, sabe disso e sua empatia com outras mulheres veio, em grande parte, de um passado profissional em que ela só conviveu com homens. Formada em engenharia civil, trabalhou em quatro multinacionais - só respondia a diretores homens. "Perdi as contas das vezes em que comecei a falar e fui interrompida por um homem. Eu não tinha lugar de fala", conta.

Ao fundar a Vittude em 2016, ao lado do sócio Everton Höpner, Tatiana decidiu que teria uma equipe heterogênea. "Quando você tem mais diversidade na empresa, você tem olhares diversos. E homens e mulheres têm visões diferentes de mundo - isso é fato. Ao equilibrar o time, você traz riqueza de pensamento."

A fundadora da Vittude, Tatiana Pimenta (centro), ao lado de duas diretoras que ela promoveu na emrpesa, Maíra Gracini (esq.) e Izabela Yumi
A fundadora da Vittude, Tatiana Pimenta (centro), ao lado de duas diretoras que ela promoveu na emrpesa, Maíra Gracini (esq.) e Izabela Yumi
Foto: Felipe Rau/Estadão

A Vittude é uma plataforma que se dedica a sessões de terapia online, tanto para pacientes quanto para empresas. Em 2020, com a chegada da pandemia, houve um enorme aumento de pacientes, e a empresa recebeu investimentos e captou recursos. No ano seguinte, tiveram um crescimento de 12 vezes na receita e começaram a contratar mais pessoas.

Com isso, vieram mais mulheres ao C-level. Hoje, ao lado de Tatiana e Everton, estão Maíra Gracini, diretora de Receita (Chief Revenue Officer), e Izabela Yumi, diretora financeira (Chief Financial Officer), entre as seis vagas de C-level na Vittude. Há outras mulheres em cargos de liderança, numa empresa que hoje tem em torno de 40 funcionários - trazendo, assim, a pluralidade de visões que Tatiana tanto buscou.

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Além da Vittude, outras startups fazem o mesmo movimento, com lideranças femininas. É o caso de Nilo Saúde, Chiligum, Be Beleza Tech, Woof, AutoForce e da Gupy - esta última atingiu 50% de mulheres no time, em todos os níveis de liderança.

Mariana Dias, cofundadora e CEO da Gupy, também acredita que a equidade de gênero traz mais inovação. Por meio de seu serviço de recrutamento, a startup incentiva a diversidade nos times de outras empresas - e ela própria já foi fundada com um time C-level diverso: ao lado de Mariana, estão Bruna Guimarães, diretora de Operações, Guilherme Dias, diretor de Marketing e Produto, e Robson Ventura, diretor de Tecnologia.

Mariana também sentiu na pele a desigualdade de gênero desde o início de sua trajetória profissional. "Comecei a me perguntar se nós, mulheres, conseguimos ter uma carreira corporativa com a mesma competitividade que a dos homens. Foi aí que nasceu a ideia da Gupy." Além do C-level, composto por duas mulheres entre quatro pessoas, a Gupy tem 50% de mulheres em seu quadro e em cargos de liderança, como nos setores de vendas, diversidade, jurídico, sucesso de cliente e marketing.

Bruna Guimarães (esq.) e Mariana Dias são parte do time C-level da Gupy
Foto: Manuela Meyer

Isaiane Mendonça, cofundadora da startup AutoForce, também sentiu essa desigualdade, talvez com maior intensidade por atuar em duas áreas muito dominadas por homens: tecnologia e setor automotivo. Fundada ao lado de Tiago Fernandes e Clênio Cunha, a empresa oferece tecnologias para impulsionar a venda de veículos. A plataforma foi desenvolvida por Isaiane, formada em ciência da computação e com trajetória em tecnologia, mas não foi fácil.

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"No começo do projeto, os meus sócios queriam que eu continuasse sendo só webdesigner", conta ela. "Pela frente, concordei com eles. Por trás, desenvolvi uma plataforma e a entreguei pronta. Acho que as mulheres são sempre subestimadas, é até uma questão cultural."

Isaiane concluiu que mulheres na liderança só trazem benefícios para a empresa. Tanto é assim que, hoje, a Head de Pessoas da AutoForce (e braço-direito dos fundadores) é Thaiani Godoy. Além dela, outras duas mulheres compõem a liderança da startup, representando 40% dos cargos de chefia.

Mariana Dias concorda que mulheres em cargos de liderança trazem mais inovação. "Muitas empresas chegam até a Gupy com a meta de ter 30% de mulheres em seu quadro de funcionários. Mas a questão é mais profunda do que isso: é preciso ter mulheres em todos os níveis, em todos os times", diz.

Mães e profissionais, ao mesmo tempo

"Por que é tão difícil ter equidade de gênero?", indaga Tatiana Pimenta. "Tem empresa que fala 'não quero mulher porque engravida'. É um absurdo."

A rejeição de candidatas mulheres que estejam gestantes ou que tenham filhos pequenos é comum. Mas as startups estão mudando isso. Na Vittude, Tatiana contratou a CFO Izabela Yumi quando ela já era mãe da pequena Gabrielle. O fato de estar retornando de licença-maternidade nunca foi uma questão para a Vittude, mas Izabela sentiu dificuldade em muitas outras entrevistas.

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"Ela contou para a gente que, quando falava que tinha filha pequena e que ela era sua prioridade, ouvia dos entrevistadores 'Então, vai lá cuidar da sua filha, depois você pensa na sua carreira'. O processo era interrompido", diz Tatiana.

Na Gupy, Mariana já contratou mulheres gestantes e acredita que é só uma questão da empresa se organizar quanto à licença-maternidade. Com uma visão de mercado mais ampla, ela defende que a questão ainda vai além. "É preciso dar licença-paternidade aos homens com o mesmo tempo que damos às mulheres", opina. "Se uma mulher fica seis meses fora, e o homem apenas duas semanas, a mulher sempre vai ser menos competitiva."

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