Raidou Remastered traz de volta o detetive dos demônios

The Mystery of the Soulless Army revive a magia noir demoníaca da Atlus com estilo, carisma e combate old-school.

18 jun 2025 - 10h59
Raidou Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Raidou Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Reprodução / Sega

Se você é fã de JRPGs e nunca ouviu falar de Shin Megami Tensei, tá na hora de preencher essa lacuna no "currículo gamer". Criada pela Atlus, essa franquia é a irmã gótica e filosófica de outros RPGs japoneses mais “coloridinhos”. Esqueça espadas mágicas e cristais da amizade. Em SMT, o buraco é mais embaixo: dilemas morais, apocalipses metafísicos e pactos com demônios. Ah, e os demônios são seus aliados. Isso mesmo. Nada de matar o capiroto — aqui você negocia com ele.

Com raízes nos anos 80, a série deu origem a dezenas de spin-offs, como Persona, Devil Survivor e o protagonista de hoje, Raidou Kuzunoha vs. The Soulless Army, lançado originalmente para PlayStation 2 e agora ressuscitado em uma remasterização caprichada para os fãs — e curiosos — da nova geração.

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O detetive do sobrenatural

A grande diferença de Raidou em relação ao restante da franquia é sua ambientação e tom. Enquanto os jogos principais de Shin Megami Tensei costumam se passar em Tóquio contemporânea ou pós-apocalíptica, Raidou nos leva direto para a Era Taishō — um período fascinante do Japão que mistura o tradicional e o moderno, entre quimonos e bondes elétricos. A pegada noir é clara: um jovem detetive da agência Narumi tem uma identidade secreta como o Raidou Kuzunoha da 14ª geração, um invocador de demônios incumbido de manter o equilíbrio entre o mundo humano e o espiritual.

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Sammy Anderson / Reprodução

Ah, e como todo bom protagonista enigmático, Raidou tem um parceiro à altura: Gouto, um gato preto possuído pelo espírito de um antigo Raidou. Gouto é o que acontece quando você junta Morgana do Persona 5 com sarcasmo de mentor veterano e sabedoria sobrenatural. Ele não só serve como guia para o jogador como também dá uma alma ao jogo — e com certeza merece seu próprio spin-off.

O sistema de combate: demônios na linha de frente

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Aqui a coisa muda bastante em relação aos RPGs por turno tradicionais da série. Em vez de comandos estáticos, Raidou é um action RPG com combates em tempo real. Isso pode assustar os puristas, mas é implementado de forma surpreendentemente estratégica.

Você pode atacar com sua espada, usar habilidades mágicas e, o mais importante, convocar até dois demônios para lutar ao seu lado. Cada demônio tem suas próprias habilidades, fraquezas e personalidade. Alguns são excelentes no suporte, outros são tanques ou magos poderosos. O truque é explorar as fraquezas dos inimigos e saber o momento certo de trocar de aliados. Além disso, usar o ataque certo na hora certa permite prender um demônio, abrindo caminho para capturá-lo.

O sistema de fusão também está presente e é um dos grandes atrativos da série: misturar dois demônios para criar um novo, mais poderoso, com habilidades herdadas dos “pais”. É Pokémon para adultos — com rituais, invocações e monstros que vêm direto da mitologia mundial.

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Divulgação

Um detetive em um mundo vivo

Assumir o papel de Raidou Kuzunoha XIV em The Mystery of the Soulless Army é como mergulhar de cabeça num dos casos mais esquisitos da sua carreira de detetive — e isso vindo de alguém que lida com demônios no dia a dia. A história começa com um pedido inusitado: uma jovem herdeira aparece no Narumi Detective Agency pedindo para ser morta. Antes que dê tempo de entender qualquer coisa, ela é sequestrada, e o mistério começa a se desenrolar pelas ruas da Capital, numa versão sobrenatural do Japão da era Taishō. O clima de conspiração, somado aos elementos ocultistas, dá um tom noir mágico à narrativa, que vai crescendo de forma tensa e cativante. Você sente que está no meio de um thriller sobrenatural digno de mangás clássicos como Black Jack ou Hellboy versão Japão.

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Durante sua jornada, Raidou não só enfrenta demônios: ele investiga casos, entrevista NPCs e explora bairros com forte influência da cultura japonesa da década de 1920. A atmosfera é um dos pontos mais fortes do jogo. As músicas têm um jazz melancólico com pitadas de tradicionalismo oriental. A direção de arte é estilosa sem ser gritante, e o clima investigativo é algo que poucos RPGs orientais se atrevem a tentar.

Outro diferencial interessante é que os demônios que você recruta não são apenas peças de batalha. Eles servem a funções de exploração e investigação. Um demônio pode ser útil para encontrar pistas escondidas, outro para traduzir línguas estranhas ou acalmar espíritos. Isso traz uma profundidade extra à jogabilidade e reforça o elo entre o jogador e seus aliados infernais.

Os combates em tempo real de Raidou são um verdadeiro exercício de sangue-frio e estratégia. Imagine uma arena limitada onde você precisa controlar seu personagem com ataques corpo a corpo, magias e comandos de invocação, tudo isso em tempo real enquanto dois demônios aliados agem ao seu lado com IA própria. Você pode mandar eles atacarem, usarem magias específicas, ou recuarem pra não virarem churrasquinho de chefe. A mecânica central gira em torno de explorar fraquezas inimigas, prender demônios durante o combate e depois tentar capturá-los. A cada luta você vai ganhando não só XP, mas também aquele conhecimento prático de quem tomou muita porrada no começo — e agora tá mandando bem como um verdadeiro invocador de respeito.

Mas não pense que o jogo é só cenário bonito e combate estiloso. Raidou Remastered também é uma baita aventura de detetive com elementos sobrenaturais, onde você precisa usar tanto a inteligência quanto os seus demônios aliados pra investigar, conversar, lutar e, claro, interrogar os esquisitos que cruzam seu caminho. Tem momentos em que a narrativa toma rumos imprevisíveis, e o elenco secundário — incluindo o malandro Narumi e o carismático Gouto (o gato falante) — ajuda a criar uma ambientação memorável. Se você curte investigação, mistério e aquele charme das histórias cheias de reviravoltas, vai se sentir em casa aqui.

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Como é típico dos JRPGs da velha guarda, a estrutura aqui segue a máxima do "aprende apanhando". Você anda por áreas infestadas de monstrinhos relativamente fracos — que servem pra testar táticas, capturar aliados e pegar XP — até encontrar o chefão da fase. Aí o clima muda. O jogo não pega leve: o chefe vai te quebrar na primeira tentativa se você chegar lá achando que é só apertar botão e vencer com estilo. Não é. Tem que ir com calma, entender o padrão de ataque, montar um time de demônios com resistências certas, usar os itens na hora exata e grindar quando for necessário. Aqui, a pressa é inimiga do progresso, e a arrogância é punida com game over. O filho chora, a mãe não vê, e você aprende a jogar direito na marra — como nos bons tempos.

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Sammy Anderson

A "era de ouro" dos RPGs japoneses

O lançamento original de Raidou Kuzunoha aconteceu em um momento mágico da história dos videogames: a era de ouro dos JRPGs no PlayStation 2. Jogos como Final Fantasy X, Persona 3, Shadow Hearts, Digital Devil Saga e Suikoden III dominavam o console com propostas variadas e narrativas envolventes. Raidou fazia parte desse caldo cultural — era ousado, estiloso e tinha uma proposta própria.

E mesmo entre tantos gigantes, o jogo conseguiu marcar seu espaço com originalidade. O fato de estar sendo remasterizado hoje é prova disso. Mas também levanta um ponto importante: esse jogo não é para qualquer um.

Recomendo com ressalvas: se você cresceu jogando RPGs japoneses nos anos 2000, essa remasterização é um presente. Vai te pegar direto na memória afetiva e te lembrar porque você se apaixonou por esse gênero. A história é intrigante, o clima noir é único, o combate é dinâmico, e o sistema de fusão de demônios continua viciante.

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Agora... se você chegou aos JRPGs mais recentemente, talvez vindo de Persona 5 ou de outros jogos mais modernos, pode estranhar a estrutura um pouco datada, a dificuldade acentuada em alguns trechos e o ritmo mais lento da narrativa. Isso não torna o jogo ruim, mas mostra que ele foi feito para um tipo específico de público — ou ao menos para quem tem mente aberta o suficiente para curtir uma proposta diferente do habitual.

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Divulgação

É uma pena — e uma baita oportunidade perdida — o fato de Raidou Remastered não ter vindo com tradução para o português do Brasil. Em 2025, com o tanto de fãs brasileiros que a franquia Shin Megami Tensei e Persona conquistaram, era a chance perfeita de apresentar essa pérola do PS2 pra uma nova geração de jogadores que talvez nunca tenham tido contato com o universo de Raidou. O texto é denso, cheio de nuances históricas da era Taishō, com muito diálogo e contexto. Traduzir esse conteúdo não só facilitaria o acesso, como também ajudaria a popularizar uma das ramificações mais únicas da série no mercado brasileiro.

E sim, agora que esse remaster saiu, a expectativa natural é que a Atlus também traga a sequência: Raidou Kuzunoha vs. King Abaddon. Seria simplesmente incrível, porque o segundo jogo melhora muita coisa: o combate é mais fluido, tem mais variedade de demônios, e a história mergulha ainda mais fundo no clima noir sobrenatural que faz essa sub-série brilhar. É como pegar tudo que já era bom no primeiro e polir com carinho. Trazer a sequência não só daria continuidade pra quem conheceu agora, como também faria justiça a um dos spin-offs mais estilosos e subestimados da saga. Tá na hora, Atlus. A gente tá pronto!

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army
Foto: Divulgação

Essa nova versão remasterizada traz várias melhorias importantes. A interface foi completamente refeita, agora mais limpa e intuitiva, e há dublagem completa em inglês que dá uma nova vida aos personagens — algo que ajuda bastante, já que o jogo tem muito diálogo. Os cenários 3D também foram retrabalhados com mais riqueza de detalhes, o que valoriza tanto os ambientes urbanos quanto as passagens pro Dark Realm, aquele plano alternativo recheado de criaturas demoníacas. A sensação geral é de que estamos jogando uma versão respeitosa ao original, mas que sabe onde modernizar pra cativar tanto veteranos quanto novatos. O resultado é uma remasterização fiel, mas muito mais acessível pra quem está chegando agora na franquia.

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Por fim, explorar essa versão alternativa da década de 1930 no Japão, recheada de elementos mitológicos, demônios, corrupção e conspirações que colocam a própria nação em risco, é uma experiência única. São mais de 120 demônios pra recrutar e usar nas batalhas, e cada decisão tática importa. O sistema de fusão continua lá, bem característico da série Shin Megami Tensei, e ajuda a construir um exército digno do melhor invocador. E mesmo com o peso da idade, Raidou Remastered não perde a força — pelo contrário, esse retorno só mostra o quanto ele estava à frente do seu tempo. Que venha King Abaddon, porque a Capital ainda tem muitos mistérios a serem desvendados.

Considerações

RAIDOU Remastered - Nota 8,5
Foto: Game On

RAIDOU Remastered: The Mystery of the Soulless Army é uma cápsula do tempo. Um lembrete de que criatividade, ousadia e carisma são ingredientes que não envelhecem. Mesmo com suas arestas, é um jogo que vale a pena ser (re)descoberto. Ele não é apenas um spin-off: é uma aula de como fazer um RPG diferente funcionar com identidade própria. Se você é fã da Atlus, da saga SMT ou apenas quer algo fora do padrão, não pense duas vezes. O detetive e seu gato te esperam para mais um caso.

Esta análise foi feita no PlayStation 5, com uma cópia gentilmente cedida pela Atlus.

Fonte: Game On
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