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'Política fiscal de Haddad tem mais atrapalhado o Banco Central do que ajudado', diz Sergio Vale

Veja a avaliação de economistas sobre a entrevista do ministro da Fazenda concedida ao Estadão/Broadcast

14 nov 2025 - 16h22

BRASÍLIA - A política fiscal tem mais atrapalhado o Banco Central (BC) do que ajudado, avalia o economista-chefe da MB associados, Sergio Vale. "Não dá para dizer que estamos em um cenário fiscal confortável", afirma, após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mencionar, em entrevista ao Estadão/Broadcast, que "está louco" para a ata do BC dizer que ele faz esforço fiscal relevante.

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Para Vale, o comentário de Haddad ajuda a posicionar o BC do lado correto da discussão. "A visão do BC quanto à política fiscal é correta. Não houve melhora da política fiscal nos últimos anos, pelo contrário. Vão ser quatro anos seguidos de déficit com uma PEC da Transição muito ruim de partida e um arcabouço fiscal que terá de ser bastante aperfeiçoado", afirma.

O economista aponta que o presidente do BC, Gabriel Galípolo, ao manter a condução da política monetária de juros como está (dura), afasta a visão de qualquer interferência política na autarquia. "O BC terá margem para queda mínima de Selic ano que vem, mas tudo dentro da razoabilidade que hoje não existe na política fiscal. Na verdade, ela está mais atrapalhando o BC do que ajudando", diz.

‘Estou louco para ata do BC dizer que faço esforço fiscal relevante, mas vai chegar meu dia’, disse Haddad em entrevista ao Estadão/Broadcast
‘Estou louco para ata do BC dizer que faço esforço fiscal relevante, mas vai chegar meu dia’, disse Haddad em entrevista ao Estadão/Broadcast
Foto: Wilton Junior/Estadão / Estadão

Rafael Passos, sócio da Ajax Asset, concorda com a avaliação de que não há aplausos a serem dados em relação ao quadro fiscal. "O tom duro do Copom (Comitê de Política Monetária) em sua comunicação é o que ainda dá segurança ao mercado, e se ignorasse o impacto fiscal sobre a inflação seria pior."

"O BC foi sóbrio, já incorporou o impacto do IR (aumento da isenção do Imposto de Renda) e segue duro, não deve afrouxar a sua comunicação em relação ao balanço de risco, em cenário de déficit nas contas públicas. A Fazenda está mirando a banda inferior da meta do arcabouço, e vem entregando no sufoco", critica

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O gestor de renda variável da Nero Capital, Daniel Utsch, rejeita a ideia de que Haddad tenha tentado confrontar ou interferir nas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) ao dizer que "está louco" para ver a ata do comitê dizer que ele faz esforço fiscal relevante.

"Eu poderia pensar que o comentário de Haddad é inadequado, porque ele está falando do Banco Central. Mas Haddad costuma ser visto como alguém de muita ponderação pelo mercado. Também acho que ele é considerado ponderado. Não vejo o comentário como um ataque ou tentativa de interferência", afirma.

Segundo Utsch, a tese de que o governo Luiz Inácio Lula da Silva tentaria intervir e mudar a política monetária do BC perdeu muita tração uma vez que Galípolo tem entregado o mesmo tom da gestão de Roberto Campos Neto.

"Se você pegar atas do Copom da gestão de Galípolo e misturar com as de Campos Neto, ninguém saberia a diferença. Galípolo segue a mesma visão, tanto na política quanto na comunicação, nas atas e nas entrevistas", avalia o gestor da Nero Capital.

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O estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, também não viu a fala de Haddad como forma de pressionar o Banco Central. "Senti muito mais que foi um comentário positivo, no sentido de querer trabalhar e entregar", avalia.

De todo modo, Cruz ressalta que, assim como especialistas do mercado avaliam que há espaço para retomada das ofertas públicas iniciais (IPOs), as condições econômicas do Brasil também sugerem que o afrouxamento monetário poderia começar. "Assim como o mercado fala em janela de IPOs, também temos janelas para início de corte de juros. Acho que o Copom deveria aproveitar o ambiente e iniciar em janeiro", sugere.

O analista de investimentos Pedro Galdi, da AGF, avalia que a declaração de Haddad sobre o BC como "mais do mesmo, fogo amigo". Segundo ele, contudo, "o BC segue firme em não baixar a guarda, para não criar mais problemas no médio prazo".

Por outro lado, "logicamente o governo sempre vai buscar um culpado pela dinâmica da economia não explodir", acrescenta. O analista considera que tal dinâmica é presente desde o início do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

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Tom de cautela

Passos, da Ajax Asset, avalia que Haddad adotou um tom de cautela ao afirmar que não acelerará o estudo sobre a gratuidade do transporte público. O ministro afirmou que projeto só irá adiante se for neutro do ponto de vista fiscal, ou seja, que tenha alguma fonte de compensação.

Ao dizer que já entregou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva tudo o que foi solicitado e evitar vincular medidas a 2026, o ministro sinaliza desconforto com novas pressões de gasto, avalia Passos.

Quanto à permanência na Fazenda em eventual novo mandato de Lula, Haddad deixou em aberto essa possibilidade. Trata-se de um ponto de atenção para o mercado pela importância que o ministro ganhou como âncora de responsabilidade fiscal dentro do governo, diz o sócio da Ajax Asset.

Cruz, da RB Investimentos, diz que considerou boas as falas de Haddad sobre os Correios e a Eletronuclear. "Foram bem razoáveis as (falas em) que fez referência a não ter pacote de elevar gastos ou de fazer a isenção de transporte público em 2026. Seria algo para mostrar na campanha", diz.

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