Governo promove inflação de ideias exóticas para conter a inflação; leia análise de Sergio Vale

'De repente, começamos a ouvir sobre desonerações de impostos federais de um lado, corte de ICMS de outro, e a insatisfação com a Petrobras, então, tem sido uma constante', escreve Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados

24 mai 2022 - 14h55

A escalada recente da inflação tem trazido fantasmas para além da perda de compra da população. De repente, começamos a ouvir sobre desonerações de impostos federais de um lado, corte de ICMS de outro, e a insatisfação com a Petrobras, então, tem sido uma constante. A ex-presidente Dilma deve estar orgulhosa da condução da política econômica atual. Mas, da mesma forma que no governo dela nada disso adiantou, aqui não será diferente.

Antes, vale lembrar que a inflação surgiu de forte pressão de políticas monetária e fiscal e choques de oferta pela pandemia e guerra da Ucrânia, alimentada por uma crise fiscal crescente ano passado, que acelerou a depreciação da taxa de câmbio nos últimos dois anos. Serão dois anos seguidos de inflação próxima a 10%, algo inédito depois do Plano Real. Mas para conter esse aumento qual a melhor estratégia?

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Mudar impostos, algo permanente, para tratar de algo temporário como o aumento dos preços dos combustíveis, não parece natural. A elevação de seus preços, afinal, tem sido por uma conjunção de câmbio e preços de commodities que, aliás, afeta todo o resto da economia, a começar de alimentos. Por ser um setor muito mais difuso e com interesses profundos no governo, é mais fácil tentar afetar os preços onde pode ser politicamente mais fácil, como energia e combustíveis, sem esquecer o próprio interesse do governo por conta dos caminhoneiros. Mais distorções de impostos a caminho sem se discutir o cerne da questão, que é a reforma tributária. Reforma essa que o governo reiteradamente perdeu o rumo com imposto único num momento e mudança apenas nos impostos federais de um lado. Sem força política para fazer uma reforma digna de nome, chegamos aonde estamos.

Dada a assimetria de interesses que afeta um setor mais do que o outro, o melhor seria uma política que afetasse todos de forma indistinta, que é a alta de juros. Não importa se a origem foi oferta ou demanda, o ponto é que nesse momento o Banco Central (BC) tem a chave da resposta para a queda de preços, em que pese infelizmente estar quase isolado.

Mas dado que o calor eleitoral demandará uma resposta fiscal para a inflação, o ideal seria minimizar os danos. Ao invés de mexer agora no ICMS, deixar isso para a reforma tributária mais geral. Em contraposição, o uso de parte dos dividendos da Petrobras e parte do resultado primário dos estados formando um pool de recursos para diminuição das tarifas poderia agradar a gregos e troianos. Evita-se mudar a política de preços da Petrobras e deixa a discussão do ICMS para o momento certo.

* Sergio Vale é economista-chefe da MB Associados

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