Mágoas com o Itamaraty

Ao longo do governo Lula, o Brasil repetidamente se absteve ou foi contra medidas que condenassem o Irã ou seu controverso programa nuclear. Argumentava-se que as medidas eram pouco eficazes, e preferia-se a via do diálogo direto ao invés da utilização de fóruns internacionais.

Mas, em março deste ano, o Brasil votou a favor de uma resolução do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU, proposta pelos EUA, criando uma relatoria de especial para a averiguação de violações de direitos humanos no Irã. A Presidente Dilma Rousseff havia acabado de assumir o cargo, e muitos analistas saudaram o voto brasileiro como uma mudança na posição do país em relação ao Irã.

Dilma havia sinalizado antes mesmo de assumir a presidência que não seguiria o mesmo caminho do antecessor. Em uma entrevista ao The Washington Post, a então presidente-eleita condenou o que chamou de “práticas medievais” contra as mulheres no Irã.

Pouco antes da votação no CDH, a representação brasileira em Genebra ofereceu um jantar para Shirin Ebadi, famosa opositora do regime iraniano a quem acusa de constantes violações de direitos humanos.

Os sinais pareciam cada vez mais claros de que a lua-de-mel entre Brasília e Teerã estava chegando ao final.

Nos bastidores diplomáticos, no entanto, o efeito prático das posições brasileiras foi suavizado e menos dramático do que os contornos dados a estes eventos em órgãos de imprensa e círculos acadêmicos.

Diplomatas brasileiros e o Ministério das Relações Exteriores (MRE) apressaram-se em explicar que os votos dados durante a gestão Lula não eram votos “a favor” do Irã e que tampouco o voto brasileiro no CDH era contra o país persa. Segundo fontes do governo brasileiro, o CDH foi considerado um fórum apropriado para a discussão de direitos humanos que envolve o Irã e que o voto era pró-direitos humanos, e não necessariamente uma acusação contra qualquer país.

Em Teerã e em Brasília, a mensagem foi dada aos representantes do governo iraniano. Segundo diplomatas ocidentais a par das conversações de bastidores, o Brasil deixou sua posição muito clara para os iranianos de que nada mudava com o voto no CDH.

“O Brasil fez questão de esclarecer que, independentemente de quem ocupa a presidência do país, seus interesses nacionais são o que motivam sua política externa, e o Irã é um país com os quais o Brasil tem interesses em comum. O recado foi entendido em Teerã, que não pode se dar ao luxo de perder um dos poucos grandes países dispostos a manter este nível de relacionamento com o Irã”, disse o diplomata que não quis se identificar.

Segundo a fonte, os interlocutores iranianos continuam mostrando-se extremamente elegantes e receptivos em relação ao Brasil, mas ocasionalmente ainda expressam uma ligeira mágoa em relação ao voto público brasileiro. “Poucas vezes, quando o Brasil é mencionado, algum interlocutor iraniano ainda faz comentários quase de forma melancólica sobre o voto brasileiro no CDH, o fato de Dilma Rousseff não ter recebido Shirin Ebadi, quando esta visitou o Brasil, aparentemente fez com que ambos os países superassem o pequeno “soluço” nas relações bilaterais”.

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