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Entenda o caso
Terça, 12 de novembro de 2002 
Roubo, desinformação, mortes e caos
 
Foto: JB Online
Pessoas foram examinadas no Estádio Olímpico de Goiânia
 
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Marcela Mourão/Redação Terra

A Santa Casa de Misericórdia de Goiânia funcionava em um terreno, na avenida Paranaíba, centro, e emprestava um prédio ao lado para o Instituto Goiano de Radiologia. Em 1985, a instituição de saúde deixou o local e o terreno passou para o Instituto de Previdência do Estado. O prédio, onde funcionava a Radiologia, ficou abandonado e, dentro dele, restaram algumas coisas, entre elas um aparelho usado no tratamento do câncer que continha uma bomba com 100 gramas de Césio 137 para radioterapia.

A Polícia Federal concluiu, na época, que a bomba foi retirada em partes nos dias 10 e 13 de setembro por Kardec Sebastião dos Santos, Wagner Mota Pereira e Roberto Santos Alves. Eles pretendiam vender o material como ferro-velho. Wagner contou que a máquina estava dividida em dois pedaços, o suporte em uma sala e o cabeçote em outra.

A máquina, que era composta por um revestimento de chumbo de 304 quilos, uma blindagem de 120 quilos, uma parte de platina e a pequena fonte de césio, passou pelas casas de Roberto e Wagner, na rua 57 (as duas residências foram interditadas com grau máximo de radioatividade). Os dois começaram a desmanchar a carcaça do aparelho e, depois de semi-aberto, foi levado para o ferro-velho de Devair Alves Ferreira, onde foi desmontado de vez a golpes de marreta.

Enquanto isso ocorria, Wagner e Roberto já começavam a apresentar sintomas de contaminação radioativa (tonteiras, náuseas e vômitos), mas acreditavam que era fruto da ingestão de algum alimento estragado. Após a piora no quadro clínico, Wagner foi ao Hospital São Lucas e teve o mal-estar diagnosticado como reação alérgica a alimentos.

Na noite do dia 18, Devair passava pelo pátio do ferro-velho, quando percebeu um intenso brilho azul vindo da cápsula de aço. Embevecido pela beleza e pela possibilidade de possuir algo valioso, levou a cápsula para o interior de sua casa. Durante os dias seguintes, parentes, vizinhos e amigos o visitaram para ver o material. Devair e sua mulher, Maria Gabriela, estavam até então ignorando o fato de apresentarem cefáleias e vômitos, sintomas iniciais da contaminação.

Em seguida, Devair conseguiu remover, com o auxílio de uma chave de fenda, um pouco do pó da cápsula e distribui a parentes, entre eles seu irmão Ivo Alves Ferreira, que levou o conteúdo para a casa, dentro do bolso da calça. Na hora do almoço, colocou fragmentos sobre a mesa, permitindo que todos tocassem. A filha dele, Leide das Neves Ferraira, 6 anos, ingeriu algumas partículas do Césio no pão.

Devair, no dia 25, vendeu o chumbo retirado da fonte radioativa para um conhecido, também dono de um ferro-velho. Antes disso, sem que o marido soubesse, Maria Gabriela, já desconfiada, colocou em meio aos pedaços do chumbo, a cápsula de aço que guardava o pó. As suspeitas dela aumentaram a medida em que mais pessoas ficavam doentes.

No dia 28, ela decidiu ir até o ferro-velho, pegar uma amostra do material e levar até a Vigilância Sanitária de Goiânia. Ao chegar lá, colocou o pó, que estava em um saco plástico, na mesa de um funcionário e disse que aquilo "estava matando sua gente". Assustado, o funcionário, que era veterinário, levou o conteúdo para o pátio do órgão.

Ao mesmo tempo, médicos do Hospital de Doenças Tropicais, onde muitos doentes estavam sendo internados, começaram a suspeitar que as lesões poderiam ter sido originadas de contaminação radioativa. Um físico, alertado, foi investigar o caso. Munido com um monitor usado em medições geológicas de resposta rápida a estímulos, se dirigiu ao prédio da Vigilância. No caminho, ele ligou o aparelho que, em segundos, acusou um elevado grau de contaminação radioativa. Mesmo assim, ele ainda adquiriu um outro medidor, achando que o que usava estava estragado. O mesmo aconteceu, e ele se certificou do fato.

Chegando à Vigilância, ele conseguiu impedir que bombeiros, chamados pelo veterinário, jogassem o material em um rio próximo à cidade. Imediatamente, a secretaria de Saúde do Estado foi avisada e, no dia 29 de setembro, técnicos da Comissão Nacional de Energia Nuclear chegaram na cidade, dando o alerta. A Rua 57 foi interditada.

Pessoas foram examinadas e internadas. O Estádio Olímpico foi utilizado como base para examinar as centenas de pessoas que chegavam. Uma das primeiras iniciativas foi providenciar a descontaminação inicial: banho com água, sabão e vinagre. De um grupo de 249 pessoas, 22 tinham sido altamente expostas e, portanto, isoladas. Cerca de 120 foram descontaminadas e liberadas. O restante, 129, passaram a ser monitoradas. Deste grupo, 79 tinham contaminação externa e 14 já estavam com o quadro clínico muito agravado, sendo removidas para o Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio de Janeiro. Neste grupo, estavam as quatro vítimas fatais do acidente:

Leide das Neves Ferreira, 6 anos - filha de Ivo Alves Ferreira
Maria Gabriela Ferreira, 29 anos - mulher de Devair Alves Ferreira
Israel Batista dos Santos, 22 anos - funcionário do ferro-velho de Devair
Admilson Alves Souza, 17 anos - funcionário do ferro-velho de Devair

"Eu não me sinto culpado, porque realmente não sabia de nada. Só me sinto triste porque, de uma forma ou de outra, eu prejudiquei toda a minha família", lamentou Devair, na época, após retornar à Goiânia.

Além dos mais de 800 contaminados, também foram vítimas da tragédia um número incalculável de pessoas irradiadas, ou seja, todas aquelas que se aproximaram dos 19 gramas de Césio que saíram da bomba de radioterapia e se espalharam.

Ao todo, 6 mil toneladas de material contaminado foram retiradas do local, colocadas em barris e contêineres de metal e levadas para um terreno na cidade de Abadia de Goiás, uma área provisória que acabou virando definitiva. Anos depois foram construídos dois depósitos, dentro de padrões internacionais de bloqueio de radiação. O local fica no Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste, da Comissão Nacional de Energia Nuclear. São feitas, constantemente, monitorações e medições, principalmente dos lençóis de água sob os depósitos.
 



 
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