Valores baixos também levam brasileiros a Buenos Aires

Aline Duvoisin
Direto de Buenos Aires

  Rússia, Cuba, Bolívia ou Argentina. Pode mudar o cenário, mas o enredo geralmente é parecido. A história de Fernanda Andrade Barbosa, 26 anos, é também a de muitos brasileiros que saem de suas cidades para buscar um diploma de médico fora do País.

  A escolha da baiana de Ipiaú foi por Buenos Aires. Fernanda estudava enfermagem em uma universidade privada, mas a família ficou sem recursos e ela teve de trancar o curso em benefício do irmão, também aluno de uma instituição particular, para que este pudesse concluir a graduação.

Fernanda não cogita ficar morando na Argentina depois de formada
Crédito: Arquivo Pessoal

  O irmão se formou, começou a trabalhar como fisioterapeuta em Salvador, mas não ficou satisfeito com o mercado. Conversou com amigos e resolveu tentar a sorte em Buenos Aires, estudando medicina. Com preços mais razoáveis, o pai de Fernanda se dispôs a pagar o curso para ela também, desde que ela bancasse a vida na Argentina. A jovem, que havia achado a aventura do irmão "uma maluquice", resolveu encarar. Ficou em dúvida sobre continuar enfermagem ou tentar medicina, mas escolheu a segunda opção - e ainda tentou passar por duas vezes em universidades públicas do Brasil.

   Influenciada pelo irmão, escolheu a Fundación H. A. Barceló, especialmente pelo fato dessa ter um convênio com uma instituição espanhola - mas também porque universidades como a UBA, por exemplo, cobram conhecimento de todas as matérias curriculares dos ensinos fundamental e médio no Ciclo Básico Comum (CBC), enquanto na escolhida só contam as matérias da área da saúde. Apesar da universidade não exigir comprovação do domínio de espanhol, ela fez um curso rápido ainda no Brasil -

- o qual, confessa, não foi suficiente. "Quando cheguei a realidade era outra. O espanhol daqui não é o mesmo que aprendemos no Brasil", diz a brasileira, que depois fez aulas na UBA para se aprimorar. "Alguns termos eu não entendia nos textos. Procurava no dicionário, não encontrava e surtava", afirma.

  Algumas características da universidade a ajudaram. Os professores sabem que os brasileiros têm dificuldade com determinados termos e são compreensivos. "Quando é uma palavra muito complicada, eles param para explicá-la de uma forma bem clara", diz. Além disso, os alunos podem gravar a aula em áudio e os docentes costumam entregar os slides com o material trabalhado.

  Como muitos brasileiros, Fernanda não cogita ficar morando na Argentina depois de formada. "Aqui é muito bom, mas não é minha casa. Pensei em me formar e trabalhar um período lá (Argentina) e depois voltar para o Brasil", conta.

  O diploma argentino, contudo, não garante a Fernanda o direito de exercer a profissão no Brasil. Para isso, ela precisará ter o documento validado no País. A baiana defende que seria interessante um médico "estrangeiro" trabalhar durante dois anos em regiões em situação de calamidade pública ou com déficit de médicos, se isso significasse ter o registro automaticamente. Mesmo assim, ela não se assusta com a necessidade de fazer uma prova, e até já projeta fazer cursos para acrescentar horas ao currículo médico. "Antigamente passavam seis em 100 pessoas, mas hoje a gente já escuta que o número se aproxima da metade", fala, confiante no futuro.

Na Barceló, cobra-se apenas conhecimentos da área da saúde
Crédito: Aline Duvoisin, Especial para o Terra