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Necessidade aguda estimula criatividade

Terça, 18 de julho de 2000, 23h21min
Fernão Lara Mesquita
A solução para as emergências de Cuba, no entanto, pedia muito mais que simples autorizações para fazer o que antes era proibido.

Nascida de um ato voluntarista de um punhado de amigos, a revolução cubana parece ter mantido esse espírito depois da tomada do poder. Sendo o Estado gerido, por assim dizer, por um grupo de amigos que nunca chegaram a pensar na hipótese de seu próprio desaparecimento ou, muito menos, em alternância no poder, e a substituição nos cargos uma conseqüência da cooptação, criar mecanismos de controle do dinheiro e empresas públicas, ou mesmo qualquer forma de mecanismo institucional, nunca foi uma preocupação de Fidel e seu grupo. Agia-se - e age-se ainda - na base da confiança de uns nos outros do grupo no poder.

A "droga soviética" supria todas as necessidades da economia. E, quando parou de pingar nas veias de Cuba, o país não tinha, sequer, um sistema de coleta de impostos (nem para empresas, nem para pessoas). Não tinha, nem mesmo, empresas estatais, como as que conhecemos no Brasil. Havia, aqui e ali, centros de produção - quando muito, uma empresa em cada um dos poucos setores em que Cuba produzia alguma coisa - ligados a cada ministério ou a cada pessoa na estrutura de governo, correndo atrás (pero no mucho...) dos planos de metas tramados entre eles mesmos.

As necessidades agudas que entraram em cena a partir do momento da queda abrupta na realidade foram o fertilizante das muitas "soluções criativas" que foram surgindo - planejadamente ou não - a partir dos primeiros atos de desengessamento constitucional, que liberaram o início da reforma do próprio Estado cubano.

O resultado prático a que se chegou nesta virada de milênio é uma curiosa - e bastante caótica - convivência de quatro economias paralelas: a do aparelho do Estado, a das empresas estatais e mistas, a dos cuentapropistas e a do "jeitinho" e da pequena corrupção.

O primeiro efeito da relativização dos monopólios absolutos foi a multiplicação das empresas estatais. A "descentralização" consistiu, na verdade, na autorização para que várias estatais fossem criadas e competissem entre si, dentro dos mesmos setores. Mais de 3.500 delas surgiram, num sistema tão confuso e fora de controles formais visíveis que nem mesmo os ministros cubanos são capazes de explicá-lo de forma clara.

O Estado, propriamente dito, reservou para si apenas as funções clássicas de Estado: educação, saúde, saneamento, Forças Armadas. Esta é uma das economias de Cuba, que já se verá como é sustentada.

Como não havia dinheiro para nada, deu-se liberdade para que empresas do Estado (ou melhor, ligadas a pessoas do aparelho de Estado) fossem criadas nas mais diversas áreas, para atender às necessidades que se manifestassem mais agudas. Elas próprias tinham de prover o seu sustento e financiar sua expansão, seja com a multiplicação de suas atividades principais, seja se envolvendo em atividades novas. Hoje, o Exército cubano, por exemplo, tem mais de 200 empresas, nos mais diversos ramos de atividade. Antigos aviões militares foram reciclados para a constituição de empresas aéreas, como a Gaviota, que serve os turistas em vôos internos na ilha.

Eusebio Leal, historiador, homem de vasta cultura, amigo do Brasil e especializado na colonização das Américas, sua arquitetura, suas artes, os povos que as formaram, comanda um amplo programa de restauração de Habana Vieja, com os recursos que consegue levantar em negócios paralelos que criou e gerencia (tão bem que, hoje, é considerado um dos maiores e mais bem-sucedidos "empresários" de Cuba). Tem mais de uma companhia de táxis, esquemas de fornecimento de produtos e serviços aos hotéis e diversos outros negócios que lhe rendem o dinheiro necessário para as obras de restauração (no ano passado teria conseguido "lucros" superiores a US$ 40 milhões que, junto com contribuições internacionais, sustentam o programa de restauração dos antigos quarteirões de Habana Vieja, feito dentro de critérios que deveriam ser copiados no Brasil e em outros países do mundo).

Um dos ramos do antigo Ministério de Comércio Exterior criou a maior rede de supermercados de Cuba, com lojas espalhadas por todo o país, onde tudo é vendido em dólar (exceção feita aos produtos oriundos dessa agricultura privada mencionada acima, que podem ser comprados em pesos). As zonas francas também são geridas e proporcionam vários negócios paralelos a diversas empresas estatais que encontrem, ali, novas oportunidades de conseguir os recursos para tocar suas atividades principais ou paralelas.

Tudo, enfim, que chega a se estabelecer em moldes empresariais no país segue esse padrão.

Todos os negócios dessa "segunda economia" de Cuba são geridos dentro de um alto grau de informalidade. Ninguém no país sabe dizer exatamente qual é a contabilidade de cada um deles. Cada empresa, em princípio, está afeta ao ministério a que sua atividade corresponde. "Um comitê" (que ninguém sabe definir com precisão como funciona) examina, periodicamente, sabe-se lá por quais critérios, já que contabilidade tambem é coisa quase desconhecida no país (uma das preocupações do sistema educacional, hoje, é formar gente nessas habilidades), o que é lucro e para quem vai o dinheiro. Não existe uma norma para a distribuição desse lucro, e cada caso é tratado em particular.

O certo é que, até onde se possa ver pelos inexistentes sinais exteriores de riqueza, ninguém, pessoalmente, embolsa qualquer parte do que essas empresas geram. Tudo vai para desenvolver ou sustentar suas outras atividades, ou para o caixa do Estado (há dois anos essas empresas passaram a pagar alguns impostos). Esse setor engendrou uma nova categoria na arquitetura sociológica do país, que é o "empresário de Estado".

Há os de maior e os de menor sucesso e talento empresarial. Mas isso não se traduz em nenhuma diferença no seu nível de conforto material. Segundo todos os testemunhos, não há nenhum sinal visível de enriquecimento de ninguém, nessa altura da estrutura. Não se formou em Cuba uma nomenklatura, como a que havia na União Soviética, com suas dachas e privilégios. Todos vivem e moram modestamente e andam sem seguranças em seus velhos Lada. A confiança mútua, nesse nível de que estamos falando, exclusivo dos homens da intimidade da cúpula do partido e do poder, continua sendo a única garantia que se exige.

É dentro desse nível, também, que se formam as joint ventures com capitais estrangeiros. Quando uma dessas empresas manifesta a intenção de fazer uma, o vice-presidente da república, Carlos Lage, tido como o grande mentor das reformas, decide pessoalmente até onde e dentro de quais parâmetros ela pode ir, respeitadas as normas legais básicas.

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Agência Estado

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