Entrevista / Felipe Tadeu

Nesta entrevista, conheça um pouco da história do jornalista, compositor, DJ e poeta Felipe Tadeu, o cara que mantém há três anos um programa de rádio de música brasileira, na pequena cidade de Darmstadt, na Alemanha.

por Luciana Rabelo


 
MANGUENIUS - Quais as suas 'raízes'?

Felipe Tadeu - Nasci na cidade do Rio de Janeiro no ano de 1962. Sou cria da Tijuca, um bairro bastante típico da cidade. Lá, como filho da classe média local, pude crescer tendo contato bastante próximo com as crianças que moravam nas favelas do Morro da Formiga e do Borel. A Tijuca é uma espécie de vale, cercada de morros onde se produz música da melhor qualidade: o samba da Acadêmicos do Salgueiro, da Império da Tijuca, e da Unidos da Tijuca. Um bairro politicamente conservador, mas muito rico culturalmente falando. Deu ao mundo dois gênios musicais, Tom Jobim e Milton Nascimento, só para citar os mais nobres.
 

MANGUENIUS - O que fazia quando morava no Rio?

Felipe Tadeu - Sempre soube que a "minha" era a música. O jornalismo chegou na adolescência, quando passei a devorar os cadernos de cultura dos periódicos cariocas, recortando tudo que lia sobre som e começando a agitar um arquivo interessante que possuo até hoje. Meu primeiro emprego foi na loja de discos de um tio meu, depois meu pai também abriu uma. Escutava de Pink Floyd a João Nogueira. Martinho da Vila. Frenéticas. Com o dinheiro que ganhava lá, torrava tudo no que havia de mais precioso. Assistia vários shows de música na semana, comprava discos de rock, de música brasileira, etc. Comecei a escrever poesia, a compor letras de música para os grupos Avesso, Mariposa da Lua e, mais tarde, para Nabby Clifford e para a banda Armitage. Até o dia em que fui me meter em produção de eventos, tendo sido o mentor e principal organizador do Ciclo Brasil de Música Reggae, que aconteceu no Rio em 90. Sediado no Centro Cultural Cândido Mendes, o evento era um levantamento das influências benéficas do reggae sobre a música nacional. Dele participaram Gilberto Gil, Edson Gomes, Bernardo Rangel (ex-cantor e líder do Cidade Negra, grupo que estrearia no cenário brasileiro logo depois), Marcelo Yuca e Lauro Farias (ex- KMD5, hoje integrantes de O Rappa), o cantor ganense Nabby Clifford, dentre jornalistas especializados em reggae.
 

MANGUENIUS - O que te levou a ir pra Alemanha?

FT - Quatro anos depois de ter me formado em Jornalismo, resolvi vir para cá atrás de melhores condições para exercer minha profissão. Cheguei na Alemanha em maio de 1991. Tinha 29 anos quando deixei o Rio e sabia que era uma manobra arriscada em minha vida, afinal, deixava uma terra onde já possuía o domínio da língua, para ir morar noutro canto, e ser rebaixado à condição de analfabeto. Pelo menos nos primeiros três anos seria assim.

 
MANGUENIUS - Quando surgiu a idéia de fazer o Programa Radar Brasil?

FT - Quando cheguei aqui, percebi logo logo que eu poderia desempenhar um papel interessante de divulgador da nossa música no terreiro da Nina Hagen. Comecei colaborando como jornalista para diversas publicações locais como o "Info-Brasil" - do qual fui um dos editores junto à Gisela Pimentel -, das revistas "Humboldt", "Tópicos" e "Matices", e, mais tarde, como free-lancer da Rádio Deutsche Welle, sempre escrevendo sobre música brasileira. Quando a Rádio Darmstadt foi fundada, em 1997, fui convidado por Renate Heß para ler na emissora poemas do meu livro "Certos Insetos", lançado pela Karin Fischer Verlag na Feira do Livro de Frankfurt em 1994, ano em que o Brasil foi o país-tema do evento. Na ocasião, acabei conhecendo outros produtores da Rádio e o Programa tá aí.

 
MANGUENIUS - Qual o recado que você manda pra galera do Brasil?

FT - Tenho certeza que a música brasileira ainda vai ser alçada ao patamar que só os norte-americanos usufruem. Mesmo sem cantar em inglês. Somos uma nação desgovernada, um povo que tem muita identidade e riqueza cultural, mas que pensa que alegria e responsabilidade política são coisas antagônicas. Não. O mal do Brasil é a saúva da inconseqüência. A corrupção advém da inconseqüência. Somos nós que nos inviabilizamos. Temos que ter, por nós mesmos, pelo nosso lugar e pelo planeta, pela luta dos sem-terra, o mesmo carinho que nutrimos quando a bola rola no campo. A arte, muito mais do que os partidos políticos, é nossa arma mais eficiente. Afinal, não é preciso ter dinheiro para sermos criativos.