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Final Cut Pro 3 e a revolução do vídeo digital

Lançado ao apagar das luzes de 2001, o Final Cut Pro 3.0 é um divisor de águas. Além de ser a primeira versão do programa compatível com o Mac OS X e trazer novos recursos importantíssimos, esse upgrade projeta as soluções de edição de vídeo com qualidade broadcast para uma nova era, na qual não há mais a obrigatoriedade do uso de placas de milhares de dólares para a visualização de composição e efeitos em tempo real.

Trata-se da quinta grande revisão em dois anos e meio de existência do programa, e apenas nove meses a separam do último grande upgrade. Os enormes avanços da nova versão 3.0 do FCP confirmam a determinação da Apple em competir para valer no mercado de soluções profissionais para vídeo digital.




Vídeo profissional ao alcance de todos

A ele junte-se o CinemaTools, o sucessor do FilmLogic lançado na NAB de 2002, e temos um sistema completo para edição não-linear de vídeo digital standard definition, cinema e high definition 24p (offline; para edição online em high definition há a necessidade de instalar hardware adicional). A recente aquisição pela Apple da empresa Nothing Real, criadora dos programas high-end de composição e efeitos Shake e Tremor, promete trazer-nos mais ferramentas de vídeo profissional. Especula-se que a tecnologia da Nothing Real irá gerar novos produtos e também ser aproveitada nos produtos Apple já existentes (leia-se FCP). O estande da Apple na NAB 2002 já tinha máquinas G4 rodando uma versão do Shake.

A Apple está demonstrando que não quer depender de ninguém para firmar a plataforma Mac nesse nicho. E o preço dessa busca pela auto-suficiência pode ser o de afugentar desenvolvedores de produtos concorrentes. Ou não. Também pode ocorrer o movimento inverso, como fica demonstrado pelo comportamento da Avid, que já anunciou o Avid Xpress DV para meados do ano.

Quanto aos desenvolvedores de hardware de processamento de vídeo em tempo real, nunca houve tanta oferta para a plataforma. Além dos produtos das grandes Pinnacle e Matrox, há uma boa quantidade de opções da Digital Voodoo, da Igniter, e mais recentemente da até então desconhecida Aja.

A Media 100 continua a saga do Media 100i, e deve lançar a qualquer momento uma versão para o Mac OS X do software de seu lendário sistema de edição.

Renascimento da plataforma

Tudo indica que a estratégia da Apple de lançar produtos significativos para vídeo profissional aumenta o prestígio e a base instalada do Mac nesse mercado, o que é um atrativo a mais para os outros fabricantes. Por outro lado, até agora a Adobe não deu nenhum sinal de que haverá uma versão do Premiere para o OS X.

Também correu um boato, no início do ano, dando conta da desativação pela Discreet do centro de desenvolvimento do combustion para Mac na Califórnia, o que significaria o fim da versão do programa para a nossa plataforma. A empresa desmentiu os rumores, afirmando que estava transferindo essas unidades de desenvolvimento para junto de sua sede em Montreal, no Canadá.

Bem, só o tempo vai dizer no que vai dar tudo isso. Mas até os grandes da indústria eletrônica demonstram interesse pelo Macintosh. A Apple e a Panasonic anunciaram na NAB 2002 uma cooperação que resultará no suporte do Mac e dos produtos Apple para os formatos DVCPRO 50 (formato digital 4:2:2) e DVPRO 100 (para HDTV), e para a nova opção de vídeo digital SD 24p gravado em Mini-DV.

A Panasonic anunciou que disponibilizará toda uma nova linha de equipamentos DV com a alternativa Mini-DV 24p, a começar pela câmera AG-DVX100. Pelo interesse que o anúncio da câmera causou entre os profissionais da área, parece que logo veremos outros fabricantes seguindo os passos da Panasonic. A solução pode significar mais uma revolução no mercado e uma nova onda de realização de filmes para cinema a partir de equipamentos DV.

Tempo real no G4

Apesar de o Final Cut Pro rodar em modelos Power Mac G3 com clocks superiores a 300 MHz, depois da versão 3.0 ganhamos um motivo a mais para desejar instalá-lo em um possante G4, o mais rápido que houver; um modelo Dual, de preferência. O upgrade implementou um preview de transições e efeitos em tempo real por software que depende essencialmente da velocidade do processador. Ele requer G4s com velocidades de 500 MHz em diante e 384 MB de memória RAM.

O recurso, que a Apple chama de G4 RT, funciona apenas com material capturado no formato DV ou com o novo formato Offline RT (leia mais sobre ele adiante). O G4 RT é considerado um novo tipo de preview em tempo real para o FCP porque, assim como com a placa RT-Mac, não vale para a saída FireWire; as transições e efeitos G4 RT são visualizados exclusivamente pela interface do programa no monitor RGB do computador. Infelizmente, mesmo os G4 mais rápidos não acumulam poder de processamento suficiente para criar o preview dos efeitos e fazer a codificação do vídeo no formato DV. A única saída é o atalho de teclado [Shift][F12], que exibe pela porta FireWire o frame sob o qual a cabeça de reprodução do Viewer ou do Canvas estiver estacionada.

Sendo assim, para sair com o projeto para a fita DV, não há como evitar o render prévio de tudo que for criado com a ajuda do G4 RT. Mas o importante é que, a partir de agora, as decisões de edição mais comuns envolvendo efeitos, como a duração de uma transição, podem efetivamente ser tomadas em tempo real.

Numa resolução de preview, os still frames de quadros frisados ou de gráficos importados também se beneficiam do G4 RT. A quantidade de still frames suportados numa mesma sequência depende somente da quantidade de memória RAM alocada para um cache especial, o RT Still Cache, pelo painel General Preferences. O conteúdo do cache fica amarrado a cada sequência; quando saímos de uma sequência para a outra, o cache se renova e acompanha a mudança, carregando os stills daquela que abrimos.

O volume de operações simultâneas permitidas em tempo real é escalável, variando de acordo com a complexidade dos efeitos envolvidos e com a velocidade e o número de processadores do computador. Quando o limite da máquina é atingido, não há outra coisa a fazer senão proceder ao render.

Sabemos o que está sendo processado em tempo real ou não por meio do mesmo sistema das barrinhas em cima das trilhas da timeline usado para a placa Matrox RT-Mac. Barras verdes indicam onde ocorrem operações em tempo real; barras amarelas indicam que nesses trechos o recurso em tempo real exibe um resultado aproximado (proxy) da operação realizada; barras vermelhas indicam a necessidade do render.

A propósito, para os que já a possuem, a placa da Matrox continua tendo alguma serventia. Seus maiores diferenciais residem no fato de ela possuir interface de entrada e saída para vídeo analógico, inclusive permitindo exibir seus recursos em tempo real no monitor NTSC, e oferecer saída para um segundo monitor RGB. Mas não pense que dá para contar com os recursos do G4 RT e da RT-Mac. Nos computadores onde ela está instalada, tão logo o FCP 3 enxerga a placa, os recursos em tempo real são chaveados para os da RT-Mac.

Offline RT

O Final Cut Pro 3.0 trouxe a edição offline para o formato DV. Agora temos a opção de capturar vídeo DV pela porta FireWire num novo formato, que a Apple chama de Offline RT. Ele utiliza um codec PhotoJPEG otimizado para o Velocity Engine do G4, que produz imagens de 320x240 pixels com taxa de compressão ajustável. Graças ao esforço de desenvolvimento investido no codec, o computador faz a codificação do material DV para o novo padrão de compressão em tempo real durante a captura.

O formato registra a informação de timecode da fita DV, o que garante a recaptura e a reconstrução automática do projeto em alta resolução numa fase online posterior, utilizando apenas os recursos de gerenciamento de mídia normais do FCP, inclusive os contidos na janela Media Manager do FCP. Novos Easy Setups foram adicionados exclusivamente para o Offline RT. Talvez o maior problema no uso do recurso esteja na impossibilidade total de avaliar o andamento da edição em Offline RT em um monitor NTSC; só podemos contar com a resposta das janelas Viewer e Canvas do monitor RGB.

Praticamente nada precisa ser corrigido na transposição do Offline RT para o online DV. Nos projetos Offline RT, os gráficos criados no tamanho padrão para DV (720x543) são automaticamente escalados para o tamanho 320x240, e depois, na fase online, redimensionados para o tamanho certo sem que precisemos mexer em nada. Um procedimento correspondente também corrige o tamanho dos gráficos, caracteres e outros tipos de generators do Final Cut Pro criados para um projeto iniciado na resolução Offline RT. São duas as principais vantagens de se adotar a estratégia do Offline RT. A primeira tem a ver com a óbvia economia de espaço no disco rígido. A compressão máxima do codec permite chegar à razão de 1 hora de vídeo para 500 megabytes de disco, enquanto que com o codec do stream de vídeo DV precisamos de 13 gigabytes para o mesmo tempo de material.

Alguns poderiam argumentar que esse aspecto não representa grandes ganhos se considerarmos a alta capacidade de armazenamento e o baixo preço dos discos atuais, aliada à relativamente pequena largura de banda do formato DV. Mas em certas situações, como na fase inicial da edição de documentários longos com muito material original, ou para projetos grandes realizados num computador portátil usando apenas o disco interno, essa economia vem mesmo a calhar.

A outra vantagem, de fato inquestionável, está na quantidade de operações simultâneas com preview em tempo real usando o G4 RT, muito maior em projetos Offline RT. Através do novo codec, o editor ganha uma solução eficaz para economizar tempo e garantir mais agilidade na criação de sequências de edição com uma quantidade grande de efeitos complexos simultâneos.

Mancada!

A Apple resolveu fazer uma proteção de cópia do CD instalador do FCP 3.0 para se defender da pirataria. Até entendo a posição da empresa. Nas primeiras versões, deixou-o sem nenhuma proteção, sabendo que a pirataria correria solta, de modo a ajudar na popularização do software. Agora que ele virou objeto do desejo de todo mundo, cria esse detestável recurso, totalmente fora de moda e na contramão da História. Até a Adobe já acabou com o dongle da versão Pro-Bundle do After Effects. Quando os fabricantes de software vão entender que proteções desse tipo expõem o usuário legalizado? Veja: e se o CD dá algum problema? Como resolver a questão numa emergência sem penalizar o usuário? Muita gente gosta de manter uma imagem dos discos instaladores de seus softwares principais como backup para se safar dessas situações, e esse tipo de proteção tolhe seu direito de guardar o software que adquiriram como bem lhes aprouver.

Falta comentar ainda a questão do manual. A qualidade e a quantidade da documentação do Final Cut Pro aumentaram muito na versão 2.0. Mas o manual tornou-se tão grande que ficou difícil consultá-lo. Agora, o que fez a Apple? Dividiu-o em cinco volumes por assuntos diferentes - um pouco demais, na minha opinião.

Como cada volume tem um índice próprio, muitas vezes temos uma trabalheira danada para descobrir em que volume encontramos uma determinada informação. Tudo poderia ser resolvido se houvesse menos volumes, o suficiente para não precisarmos manipular verdadeiros tijolaços, e todos com um índice geral comum.

O que ficou faltando?

Em relação a uma maior integração com o OS X, gostaríamos de ver logo, por exemplo, o render no background, coisa que até o iMovie já faz.

A introdução de elementos de interface com o visual Aqua do OS X foi um tanto tímida até aqui - o que para muitos pode significar uma bênção. Mas talvez caia bem aproveitar uma maior intervenção "aquosa" e rever botões e outros detalhes, tentando encontrar soluções para torná-los um pouco mais visíveis e volumosos, de modo a facilitar a operação do software.

Mais recursos em tempo real é o que todos desejam. E sem proxies, de preferência, tal como ocorre no Xpress DV. Torcemos para que o G5 RT venha logo e novas formas de integração com o hardware aumentem as possibilidades de criação sem a chatice do render.

Outro problema do G4 RT está ligado à forma como lida com o limite de efeitos em tempo real. Quando acrescentamos algo que excede a capacidade do sistema, a exibição de todos os outros efeitos que estavam sendo beneficiados com o tempo real são desabilitados e substituídos pela famigerada cartela "unrendered effect". Bem que a Apple poderia, por exemplo, dar um jeito de manter o que já existia, talvez com um overlay indicando que nem tudo o que foi aplicado ali está sendo mostrado, ou então diminuir a frequência de quadros da reprodução de acordo com a necessidade real de processamento dos efeitos. Isso vale também para o modo de funcionamento da RT-Mac.

E tanto a Avid quanto a Apple nos ficam devendo uma solução que consiga estender o tempo real para o vídeo codificado em stream DV com a saída pela porta fireWire, coisa que até agora nenhum dos dois fabricantes foi capaz de oferecer. Isso sim, colocaria a edição de vídeo no formato DV num outro patamar.

Também continuamos aguardando uma janela de mixer de trilhas de áudio, como as do Media 100i e do Premiere, e ficaríamos felizes com a implementação de recursos de multicâmera.

Seria bom também ver mais produtos relacionados ao FCP compatíveis e rodando no Mac OS X. Claro que isso está praticamente fora do alcance da Apple, mas de qualquer jeito não custa lembrar que ainda falta o suporte a algumas placas e uma enorme quantidade de plug-ins de terceiros (quase todos criados para o After Effects) embarcarem na canoa do OS X.

João Velho
É um dos autores do livro "Vídeo e Áudio Digital no Macintosh", que está sendo publicado este mês pela Editora Bookmakers.