
Marcus
Castro Ferreira
“Silicone
no bumbum só existe no Brasil”
Professor de cirurgia plástica acusa médicos brasileiros de adotarem
técnicas com pouco respaldo científico e de iludir pacientes com
promessas milagrosas
Carlos
Henrique Ramos
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“No
Exterior, costuma-se dizer que o Brasil é o país do futebol,
do samba e da cirurgia estética”, diz Marcus Castro Ferreira
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Marcus
Castro Ferreira decidiu partir para o ataque. Aos 56 anos, o professor
titular da disciplina de Cirurgia Plástica da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e chefe de divisão
da área do Hospital das Clínicas rompeu o silêncio
para criticar os vendedores de ilusão. É dessa maneira
que ele enquadra alguns cirurgiões que invadiram a mídia
para divulgar seus métodos inovadores, antes
mesmo de ter respaldo científico.
Com
mais de 30 anos de experiência no assunto e membro da Sociedade
Americana de Cirurgia Plástica, uma das instituições
mais fechadas e conceituadas do mundo, Marcus Castro tem como alvo
os profissionais que propagandeiam as maravilhas do implante de
próteses de silicone nas nádegas e panturrilha. Segundos
dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, da qual
é membro titular, os implantes de silicone no bumbum cresceram
cerca de 50% nos últimos dois anos. Esses pacientes
deveriam ser informados de que farão um tratamento sem comprovação
necessária, diz. Nesta entrevista a Gente,
concedida em seu consultório particular, o autor do livro
Beleza e Bisturi, da MG Editores Associados, pede mais ação
dos órgãos de controle. Esses médicos
da moda são grandes marketeiros.
Joana
Prado, a Feiticeira, Carla Perez e Xuxa, entre muitas outras, costumam
alardear publicamente as maravilhas das próteses de silicone.
O senhor concorda com esse tipo de comportamento?
O problema é mais profundo e preocupante do que se imagina.
A chamada cirurgia estética, que é uma parte da cirurgia
plástica, transformou-se em um grande negócio, uma
atividade muito mais comercial do que propriamente médica.
Por trás dessa atitude dos artistas, que não condeno,
está a figura de um médico. Não consigo entender
como um profissional utiliza-se da mídia para obter vantagem.
Não é habitual para um médico. Ele até
poderia ir à televisão para divulgar aspectos benéficos
da medicina, mas não na condição de superstar.
Esse tipo de médico pode ser até um excelente cirurgião,
mas sua conduta é considerada antiética.
Eles
podem até se promover, mas o cirurgião plástico
brasileiro goza de prestígio internacional. Tem muita gente
do exterior que vem operar aqui, não?
Essa fama também faz parte dessa engrenagem de marketing.
Temos técnicos hábeis, mas a qualidade dos cirurgiões
não é necessariamente melhor que a de outros países.
Na minha opinião, esse conceito está diretamente relacionado
com a facilidade que o cirurgião encontra para operar sem
muito controle. No Exterior, costuma-se dizer, em tom de brincadeira,
que o Brasil é o país do futebol, do samba e da cirurgia
estética. Não sei se isso é encarado como positivo
para a imagem do nosso país.
Como
esses médicos agem diante dessa falta de controle?
Esses médicos atuam com muita liberdade. A mídia atropelou
o processo. A novidade na área médica ganha notoriedade
e atinge o público antes mesmo de se ter o respaldo científico
adequado. Eles alimentam esse noticiário para divulgar suas
técnicas únicas e inovadoras. Diante do
alvoroço que se cria em torno do tema, as estruturas de controle,
como as universidades e os conselhos de medicina, não têm
condições de tomar posições sobre o
assunto. A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica deveria
se manifestar mais claramente a respeito.
O
senhor poderia dar exemplos?
O implante de próteses de silicone nas nádegas, que
se popularizou na mídia, assim como o de panturrilha, praticamente
só existem no Brasil. Existem poucos estudos sobre esses
procedimentos no mundo. Não se fala sobre essas cirurgias
nos seminários internacionais. E aqui, em nosso País,
alguns cirurgiões garantem que esses procedimentos são
habituais. Pelo que eu conheço, não são.
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